Autores são destaque das estréias nos teatros

Os palcos de São Paulo recebem neste fim de semana Acrobatas, de Tankred Dorst, o solo Mensageiro da Agonia, inspirado em Hamlet, e Sobre o Amor e a Amizade, que reúne contos de Caio Fernando Abreu

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Por Agencia Estado
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Mais um fim de semana repleto de estréias teatrais em São Paulo. Três delas chamam atenção pelos autores envolvidos. A montagem de Acrobatas, de Tankred Dorst, integra um projeto do Instituto Goethe de divulgação da dramaturgia contemporânea alemã e estréia amanhã no teatro do Goethe de Pinheiros. Hamlet, de Shakespeare, inspira o solo Mensageiro da Agonia, do ator Altair Lima, que volta ao palco do Teatro Sérgio Cardoso depois de 15 anos afastado da atividade teatral. Sobre o Amor e a Amizade reúne contos de Caio Fernando Abreu, um autor cuja obra literária já deu provas de migrar com sucesso para o palco e entra em temporada, para o público, sábado no CCBB. Entre as montagens inspiradas na obra de Caio que mais recentemente foram levadas à cena, há dois exemplos de boa transposição de linguagem - o espetáculo 3x4/18x24, baseado no conto Fotografias, dirigido por Ana Roxo, e o solo A Dama da Noite, baseado no conto homônimo, traduzido em três idiomas pelo ator Gilberto Gawronski. Pela qualidade dos artistas envolvidos, Sobre o Amor e a Amizade, dirigido por William Pereira com Grace Gianoukas e Jairo Mattos no elenco, pode alcançar a mesma qualidade dos espetáculos citados. Amiga pessoal de Caio, Grace vem acalentando o projeto há muitos anos e contou com a colaboração do autor na escolha e adaptação dos contos. A crônica Trinta Graus de Libra, uma espécie de oração dedicada à cidade de São Paulo, publicada originalmente no jornal O Estado de S. Paulo, para o qual o autor colaborou durante anos, abre a peça. Em cena, diante de uma máquina de escrever, Mattos é o autor e narra sua crônica dando o tom da montagem, que mescla cenas com narrativas. "O espaço cênico é a imaginação do autor." A partir daí ele começa a "criar" o conto Creme com Alface, cuja personagem é uma mulher que está a caminho do banco para pagar crediários. Angustiada, começa a fazer uma espécie de balanço de seu dia a dia. "É uma dessas pessoas que absorve todos os problemas da família." Mas o cartaz de um filme acaba mudando o rumo do seu dia e de sua vida. Há sempre algum toque mágico interferindo na rotina dos personagens de Caio que consegue abordar a condição humana - o desejo de ser amado, o medo da morte, a solidão - a partir de situações aparentemente prosaicas. É assim nos contos seguintes, Réquiem por um Fugitivo - sobre a estranha relação entre um garoto e uma criatura que vive no seu armário -, os Dragões não Conhecem o Paraíso e Sapatinhos Vermelhos, inspirado no conto homônimo de Andersen. A relação entre o autor e seus personagens, que vai ficando mais intensa ao longo da peça, dá um tempero especial ao espetáculo. Contemporâneo de Heiner Müller, morto em 1995, Tankred Dorst é um autor menos conhecido no Brasil do que o primeiro, mas como uma obra igualmente importante. "As peças de Dorst giram em torno das relações humanas e sociais na Alemanha antes e depois da queda do muro", diz Ipojucan, diretor de Acrobatas, a segunda montagem do grupo Isla Madrasta. A anterior foi O Novo Inquilino, de Ionesco. Em Acrobatas, Dorst centra a ação no Estados Unidos dos anos 20. "Mas fica claro que ele apenas cria uma situação hipotética para falar de temas atuais." Toda a trama se passa num circo, no EUA, onde trabalham juntas duas gerações de imigrantes russos. Os primeiros são antigos camponeses obrigados a migrar pela miséria logo após a libertação dos servos, na metade do século 19. A segunda chega na década de 20, fugindo da revolução bolchevique. "A peça é a última de uma trilogia em torno da figura do escritor russo Leon Tolstói. Dorst tem predileção por personagens de grandes vultos da história para revelar, em suas peças, suas contradições, até de forma sarcástica", diz Ipojucan. "Tolstói era um aristocrata, um conde. Distribuiu terras, ajudou os camponeses, mas metade de seus filhos era contra a perda de sua herança e seus privilégios." Em Acrobatas, um desses filhos migra para o EUA e vai trabalhar no circo. "Ali aprende com os ex-camponeses, já contaminados pelo pensamento capitalista, que terá de fazer de si próprio um produto, num mundo onde o dinheiro é o valor máximo. "A peça aborda o tema do entretenimento e a diluição dos valores em troca do sucesso ou da sobrevivência." Um conflito vivido hoje no encontro de cidadãos de duas Alemanhas. Conflito é a palavra-chave na adaptação de Altair Lima para o Hamlet, de Shakespeare, no espetáculo Mensageiro da Agonia. Raros são os atores que não guardam alguma frustração por não terem vivido Hamlet na idade certa. Lima resolveu o problema, uma vez que faz o personagem aos 66 anos. A solução: Ele é Horácio, o amigo a quem Hamlet pede que conte sua história. "Em alguns anos, um pouco mais velho, Romeu me aguarda", brinca. No solo, ele narra a trama, revezando-se pelos diversos personagens da peça. "Acho que fui muito feliz na adaptação", diz. "Apresentei a peça em alguns cidades do interior e a reação da platéia foi extremamente gratificante", comenta. "Um pai veio me dizer que sua filha de 13 anos não parou de falar no espetáculo e pediu que ele comprasse o livro para ela." O desejo de Lima é apresentar o solo em teatros de todo o Brasil. "A simplicidade da encenação me permite apresentá-lo até numa sala de aula. E ir a lugares onde o público jamais teria a oportunidade de ver essa peça." Acrobatas. De Tankred Dorst. Direção Ipojucan. Duração: 75 minutos. Sexta e sábado, às 21 horas; domingo, às 19 horas. R$ 10,00 e R$ 5,00. Instituto Goethe. Rua Lisboa, 974, tel. 3088-4288. Até 20/10. Mensageiro da Agonia - Hamlet. De Shakespeare. Adaptação direção e interpretação Altair Lima. Duração: 1h30. Sexta e sábado, à meia-noite.R$ 20,00. Teatro Sérgio Cardoso - Sala Paschoal Carlos Magno. Rua Rui Barbosa, 153, tel. 288-0136. Até 16/11. Sobre o Amor e a Amizade. Roteiro de Grace Gianoukas a partir de textos de Caio Fernando Abreu. Direção William Pereira. Duração: 1h15. De quinta a domingo, às 19 horas. R$ 15 00. CCBB. Rua Álvares Penteado, 112, tel. 3113-3651. Até 20/10. Estréia sábado.

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