Autenticidade de obra de Aleijadinho abre polêmica

Antiquário comprou obra de catador no Embu e, apesar do estado precário, já tem um freguês no Exterior. Preço: US$ 1 milhão

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Por Agencia Estado
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É uma espécie de novela barroca. Na semana passada, um colecionador de obras de arte do Embu, na Grande São Paulo, colocou à venda por US$ 1 milhão uma imagem de um soldado romano que pode ser parte do maior conjunto escultórico do País, tombado como Patrimônio da Humanidade: os Passos da Paixão de Congonhas (MG), do Aleijadinho. A existência da peça foi revelada há um ano e a possibilidade de ela pertencer ao conjunto de Congonhas já era aventada. O Estado noticiou sua descoberta em 2005. Mas, este mês, a imagem foi ´desenganada´ pelo Iphan, que se baseou no laudo de uma expert do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico de Minas Gerais (Iepha). ´Presumivelmente, esta escultura foi realizada por escultor familiarizado com a linguagem estética do mestre Antônio Francisco Lisboa, conhecida como Escola do Aleijadinho´, atestou a especialista, Selma Melo Miranda. Ainda foi pedida uma avaliação de um expert em marcenaria do instituto, que também ´condenou´ o soldado romano: o corpo da imagem seria feito de carvalho, enquanto que todas as outras imagens do conjunto do Aleijadinho utilizariam cedro, especialmente o cedro rosa. Com base nesse laudo técnico, divulgado em junho, decidiu-se que o soldado encontrado era uma imagem do século 20, possivelmente de um imitador do Aleijadinho, e que poderia ser livremente comercializada. Aí, entra na novela um abastado colecionador de São Paulo, Renato Whitaker, que duvidou do laudo e resolveu buscar um estudo independente. Recorreu ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) que, na semana passada, entregou o resultado. Os mestres em botânica e tecnologia de madeiras do IPT chegaram à conclusão que a peça é de cedro e canela, materiais típicos das peças do mestre barroco. Não tem nada de carvalho. Curioso que, mesmo ainda não atestado como um legítimo Aleijadinho, e de estar em péssimo estado, está sendo vendida por um preço muito acima dos de mercado. E, segundo informações, pode estar prestes a embarcar para o Exterior, vendida para um colecionador internacional - o que, se ficar constatado ser uma das peças dos Passos da Paixão, vira dano contra o patrimônio nacional. O colecionador Renato Whitaker, é claro, tem seu interesse no caso: ele pescou as incongruências do laudo do Iepha e as trouxe à tona como uma ´vendetta´ pessoal. Em setembro de 2004, o Ministério Público de Minas, com base em laudos do instituto, pediu e uma juíza de Belo Horizonte expediu um mandado de busca e apreensão de uma obra do Aleijadinho, uma Nossa Senhora do Rosário, em sua casa em São Paulo, nos Jardins. A Polícia Civil apreendeu (e posteriormente devolveu) a imagem, que, suspeitava-se, tinha sido furtada de uma igreja de Pedro Leopoldo (MG) em 1981. Já o atual dono do soldado romano, o colecionador Marcelo Aguila Arco, conta que comprou a peça de um ´catador´ (especialistas que procuram antigüidades pelo interior do País) na porta de sua loja, no Embu. ´Eu suspeitei imediatamente que fosse uma obra importante. Antiga ela realmente é, possivelmente do século 19 ou início do século 20, e com algum parentesco com as do Aleijadinho.´ Ato contínuo, pediu o laudo e informou as autoridades do patrimônio. ´Se aparecer um fato que mude a história, está à disposição. Mas, mesmo não sendo do conjunto de Congonhas, para mim já tem muita importância. É por isso que estimo seu valor em US$ 1 milhão´, disse, ressalvando que ´confia nos laudos do Iepha´.

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