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Artistas contemporâneos traduzem Guimarães Rosa

Casa das Rosas abre exposição com trabalhos de nove artistas plásticos e nove videomakers inspirados no universo do escritor mineiro de Grande Sertão: Veredas

Por Agencia Estado
Atualização:

Guimarães Rosa na Casa das Rosas. A partir de uma idéia no mínimo provocativa, de subverter a lógica comum e recontextualizar um dos maiores autores brasileiros, o centro cultural da Avenida Paulista conseguiu mais uma vez encontrar uma maneira inovadora de exibir a produção contemporânea nacional. Nada mais brasileiro do que Guimarães Rosa. O autor de Grande Sertão: Veredas descreve o povo, os lugares, os ruídos desses nossos sertões como ninguém. A humanidade de Rosa, no entanto, não é apenas caipira; é universal. Ou, como bem resumem os organizadores da mostra Rosas Rosa - Emblemas e Movimentos, "o sertão ficcional rosiano é regional, mas de um regionalismo que se projeta se tornando universal; é um sertão que expressa, antes de mais nada, a condição humana, que é a mesma no sertão de Minas ou em outro lugar qualquer do mundo". É interessante ver como os nove artistas plásticos e o mesmo número de videomakers convidados para participar dessa mostra - unidos em pares para realizar instalações site specific - sentiram e traduziram o universo de Rosa. Como costuma ocorrer nas exposições com curadoria do diretor da Casa das Rosas, José Roberto Aguilar, a seleção é bastante eclética, combinando artistas de várias gerações e estilos como se, no choque e no contraste, se produzissem as melhores fagulhas. Escolher nomes como Shirley Paes Leme ou Fernando Veloso para prestar essa homenagem a Guimarães é algo quase natural. Ambos pertencem a uma bem-sucedida geração de artistas mineiros que conseguiu conciliar um profundo interesse pela arte popular e pelos ricos materiais de sua região, com uma pesquisa totalmente inserida no contexto mais geral da arte contemporânea. "Eu já tinha essa conversa anterior com Guimarães, por isso me chamaram", explica Shirley, lembrando que a zona rural do Brasil também é sua vivência. A obra feita por ela em parceria com Walter Silveira "reconstrói" a casa de pau-a-pique, que encontramos em qualquer canto do País. Eles pegaram uma sala logo na entrada da casa e bloquearam todas as entradas (portas e janelas) com galhos, formando a estrutura do pau-a-pique antes de ser barreada, permitindo ainda a passagem do olhar. "É como ver Guimarães nas entrelinhas; ele é muito sutil e você tem de ver pelas frestas", explica. Reafirmando essa questão do olhar, no centro da sala será projetado um filme mostrando os olhos de um boi devolvendo um olhar do espectador. "É um namoro, uma troca, que resume muito o que ele fez: olhar o outro." É curioso notar a repetição de alguns elementos nessa releitura estética do universo de Rosas. Uma das imagens mais fortes da mostra é um olho feito de pedras por Amélia Toledo, que mais parece de onça e fala direto à alma, como o autor de Meu Tio, o Iauaretê. Outros elementos de Rosa que surgem aqui e ali nessa exposição são o barro e o rosto do caboclo. Lá estão eles na instalação de Eder Santos e Fernando Velloso (que atualmente também está com uma exposição em cartaz na Galeria Mônica Filgueiras); na obra de Stela Barbieri e Luiz Duva e na sala partilhada por Caetano de Almeida e Tadeu Jungle. Já as duplas formadas por Mauro Piva e Pichi Martirani, de um lado, e Boi e Geraldo Anhaia Mello, de outro, resgatam a natureza ainda mais primitiva, sem a presença do homem. Os dois primeiros chegaram a ir buscar um mandacaru em pleno sertão. Outra tentação para os artistas foi usar os nomes e frases de Guimarães. Títulos sugestivos como "Nonada" e "O Diabo no Meio do Redemoinho" são atribuídos com evidente reverência ao mestre da língua. Nem só de artes plásticas é feita a homenagem a Rosa. Até uma fotomontagem foi feita para "recriar" a história, registrando e tornando verdade uma suposta e desejada visita do escritor mineiro ao centro cultural paulistano. Além disso, durante a festa de abertura da mostra, esta noite, haverá uma cerimônia para homenagear Rosa e sua mulher, Araci, pela ajuda que deram aos judeus-alemães durante a 2.ª Guerra Mundial (leia à esq.). Também será servido um coquetel de comidas típicas mineiras e um grupo de meninos de Cordisburgo, cidade natal do escritor, declamará histórias de sua autoria. Além disso, paralelamente à exposição, que fica em cartaz até o dia 17, serão exibidos, todos os dias, às 14 horas, vídeos de autores como Pedro Bial e Angélica del Nery sobre a vida e a obra de Guimarães. Também estão programadas leituras, mesas-redondas e atividades artísticas especialmente preparadas para o público infantil. Mais informações podem ser obtidas no site www.vianetworks.com.br/casadasrosas.

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