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Após quatro décadas, Bahia volta a ter uma bienal

Evento, que foi interrompido durante a ditadura militar, ganha nova edição e propõe o tema ‘É tudo Nordeste?’

Por Tiago Décimo
Atualização:

Segunda bienal mais antiga do País, mais nova apenas que a de São Paulo, a Bienal da Bahia teve apenas duas edições, em 1966 e 1968. A segunda nem chegou a ser concluída - logo no segundo dia de exposições, o evento foi fechado pelo governo militar, diante da recusa dos artistas de tirar do acervo da mostra algumas obras consideradas "subversivas". Dez delas acabaram confiscadas. E a bienal, que buscava mostrar, pela arte, a realidade sob a perspectiva do Nordeste, nunca mais foi organizada. Quarenta e seis anos depois, a Bahia volta a ter sua bienal, aberta ontem e em cartaz até 7 de setembro.

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"É uma espécie de continuidade histórica das outras duas, por isso optamos pelo título 3ª Bienal da Bahia", diz o curador-chefe da mostra, Marcelo Rezende, também diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA). A preocupação com a ideia de continuidade também pode ser percebida na pesquisa, que envolveu 123 pessoas e consumiu mais de um ano, sobre as duas outras edições do evento. "A documentação era muito reduzida e tudo o que a gente conseguiu foram peças de acervos familiares, que serão mostradas no dia 31, no Mosteiro de São Bento", conta Rezende.

Apesar do sentido de continuidade, a 3ª Bienal da Bahia guarda importantes diferenças com as anteriores, tanto na forma quanto no conteúdo. A mais impactante é a grande descentralização das atividades. Durante os 100 dias do evento, haverá mostras e apresentações em nove cidades do interior e em mais de uma dezena de espaços de Salvador - do MAM à própria casa de alguns artistas participantes do evento, como Hilda Salomão e Reinaldo Eckenberg, na capital.

As atividades programadas envolvem obras de 130 artistas, muitos deles estrangeiros, quebrando o legado de privilegiar artistas locais. Entre os representados na bienal baiana está, por exemplo, o italiano Piero Gilardi, que pela primeira vez participará de uma exposição no Brasil. O esforço reflete a busca por cumprir o tema proposto para o evento: "É tudo Nordeste?". "A temática das duas outras bienais da Bahia era mostrar a realidade pela perspectiva nordestina e, partindo desse ponto, começamos a questionar qual seria essa perspectiva", explica o curador. "Ao analisar o tema, tentando afastar as visões estigmatizadas, chegamos a outra questão: será que o Nordeste não está em todo lugar?"

Para dar luz ao tema, a curadoria foi buscar trabalhos de artistas que Rezende chama de "fora do grande sistema econômico" das artes. Isso não significa que artistas consagrados, como o polonês radicado na Bahia Frans Krajcberg e o fotógrafo francês radicado em Salvador Pierre Verger, tenham sido preteridos. "Mais do que o ‘quem’, a grande questão na bienal é o ‘qual’, ‘qual Krajcberg’ está sendo representado", diz o curador. "Mesmo artistas conhecidos serão apresentados sob nova perspectiva na bienal."

Para Rezende, com o tema proposto e a forma que será realizada, a bienal baiana vai na mão contrária da paulista, que terá como tema "Como falar de coisas que não existem". "Para a gente, a bienal é para falar das coisas que existem, mas para as quais ninguém está olhando", justifica.

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