
09 de março de 2013 | 01h20
Good Prose é uma mistura de memória de 40 anos de amizade literária e pessoal, mas também um livro de cabeceira para quem tem curiosidade e angústia sobre os dilemas da escrita. Capítulos que tratam de fidelidade aos fatos - diferente, lembram os autores, de chegar à verdade -, das diversas linguagens contemporâneas, como o jornalês, o propagandês, e o conflito entre arte e comércio fazem de Good Prose um título recomendável para o currículo de qualquer curso de escrita.
Kidder conheceu a fama com A Alma da Nova Máquina (1981), a crônica da corrida para criar uma nova geração de computadores. O livro ganhou o Prêmio Pulitzer, o National Book Award e se tornou um best-seller. Ele diz que está voltando ao tema da tecnologia, mas não pode revelar quem são os personagens que tem acompanhado para escrever um livro-reportagem em que o software, não mais o hardware, dita o futuro.
É irônico que ele tenha se celebrizado com uma obra sobre tecnologia. A certa altura da conversa, Kidder desabafa: "Tenho sido obrigado a frequentar Facebook, Twitter, trocar SMSs com uma poderosa figura do mundo tecnológico. Mas, quando acabar a pesquisa, vou me livrar de toda esta parafernália".
O livro abre com uma referência à primeira frase da primeira reportagem que o jovem Kidder apresentou ao editor Todd, rechaçada por falar em sangue e ser considerada melodramática. Pergunto se ele não tem encontrando sangue com mais frequência na linguagem e ele comenta que está fascinado pela maneira como falam seus novos personagens do mundo digital. "As pessoas bem-sucedidas, espertas, só se expressam por hipérbole. Se uma coisa é totally sick (totalmente doente), parece ser bom sinal."
Diante da nova informalidade da mídia digital, Kidder acha melhor não seguir um conselho às vezes dispensado a jovens jornalistas: escreva como você fala. "Má idéia", comenta ele, rindo.
Os autores de Good Prose alertam para o excesso de preocupação com a técnica da escrita. "Pensar deliberadamente sobre estilo pode ser útil, só quando se começa a escrever". explica Kidder. "O melhor é progredir de maneira orgânica para contar uma história".
Ele raramente publica algo que não foi reescrito, em média, cinco vezes. "O mais difícil é a primeira versão", atesta. "Tenho que mentir para mim mesmo toda vez e me iludir de que algo vai sobrar do texto inicial".
Quando bate o desânimo, a cura prescrita por Tracy Kidder é manter à mão livros companheiros. Lê um trecho de Moby Dick, de Melville, ou de Homenagem à Catalunha, de Orwell. E consegue se lembrar que é possível escrever bem. Como se ele precisasse do lembrete.
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