Andréa Beltrão aborda pedofilia no palco do CCBB

Em Como Aprendi a Dirigir um Carro, atriz vive uma mulher que na adolescência foi alvo de abuso por parte do tio, papel de Paulo Betti

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Por Agencia Estado
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Os instrumentos em cena indicam que uma aula está por ser ministrada, uma aula de auto-escola. Logo surge a professora, Lit´ Bit (corruptela de Little Bit), mas ela trata de assuntos muito mais profundos que simplesmente o momento exato de trocar uma marcha - Lit´ Bit confessa as transformações de sua vida. As histórias compõem a peça Como Aprendi a Dirigir um Carro, que estréia hoje no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro. Andréa Beltrão interpreta Lit´ Bit, mulher de 40 anos que recorda situações vividas na juventude (anos 70) e, em especial, na adolescência (anos 60), quando um tio, o quarentão Peck (Paulo Betti), a ensinou a dirigir. Mais que isso: abusou dela sexualmente. "Não se trata de uma peça sobre pedofilia, mas a respeito do amor, da fragilidade, da dependência, e que contém pedofilia", comenta o diretor do espetáculo, Felipe Hirsch, que desde 1998 ensaia montar o texto que garantiu o prêmio Pulitzer à sua autora, Paula Vogel. O interesse justifica-se pela pesquisa que Hirsch, à frente da Sutil Companhia de Teatro, realiza sobre a fragmentação da memória. Paula Vogel conseguiu tratar de um tema polêmico de forma delicada - como já é adulta, Lit´ Bit mantém o distanciamento necessário para relembrar fatos tão marcantes. "Ela sabe que, apesar do abuso, o tio foi uma figura necessária para sua vida, pois a incentivou a deixar uma família louca e entrar na universidade", conta Andréa. "O amor entre eles era impossível, mas realmente aconteceu." Interpretar o tio Peck exigiu um grande trabalho interior de Paulo Betti. "Não se trata de um monstro, apesar de suas atitudes imperdoáveis", comenta. "Trata-se de um homem problemático, fragilizado, mas que respeita os limites impostos pela sobrinha." A relação, de fato, surpreende o público por misturar delicadeza com momentos mais fortes. Lit´ Bit vive em meio a uma família grosseira, que despreza seus atributos sexuais. "Ela tem tudo o que vai precisar nos peitos", comenta o avô. "Assim, sua sensibilidade só é reconhecida e incentivada pelo tio", comenta Andréa. "E, aos poucos, percebe-se o porquê do título: as lições de Peck são mais profundas, são metáforas para a vida."

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