"Abajur Lilás" volta ao TBC com impacto redobrado

Montagem de Sérgio Ferrara, para a peça de Plínio Marcos, foi reformulada. Passou por mudança de elenco e reestréia mais perto da "marginalidade do cotidiano"

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Por Agencia Estado
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A força manipuladora que marca os diálogos da peça Abajur Lilás retorna amanhã com mais impacto. O texto de Plínio Marcos (1933-1999), que mostra o espectro social dentro de um regime de força, recebeu uma nova leitura do diretor Sérgio Ferrara e volta a ocupar o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), em São Paulo, mas em outra sala, a Assobradado. "A montagem tem agora um contato mais próximo com a marginalidade do cotidiano", conta Ferrara. A modificação no tom do espetáculo veio com a mudança no elenco - em maio, quando a peça estreou no mesmo TBC, Ferrara comandava um grupo. Terminada a temporada e antes de se iniciar uma turnê por outras cidades, alguns desentendimentos resultaram em uma troca em alguns papéis, permanecendo Ester Góes e Elder Fraga. E, antes da reestréia de amanhã, o diretor teve de promover uma nova alteração. Abajur Lilás narra o clima de tensão entre as prostitutas Dilma (Ester), Célia (Angela Barros) e Leninha (Valéria Pontes), dominadas por Giro (Sérgio Rufino), cafetão homossexual que conta com o auxílio do leão-de-chácara Osvaldo (Fraga) na exploração das mulheres. "A presença de Rufino trouxe mais maldade à montagem, pois o Giro revela mais preocupação com a marginalidade que ronda a boemia e o submundo", explica Ferrara, que escalara antes o ator Paschoal da Conceição para o papel. Ele até participou das apresentações no Festival de Porto Alegre e na Mostra de Campina Grande, mas o comprometimento com a reencenação de As Bacantes, de José Celso Martinez Corrêa, impediu sua permanência. Rufino, que foi indicado para o Prêmio Shell pela interpretação de Geni, no musical Ópera do Malandro, dirigido por Gabriel Villela, elaborou um trabalho especial de maquiagem, que até o deixa parecido com um travesti. "É um traço marcante do Giro pois, antes de assumir o comando do mocó das prostitutas, trabalhou na noite", comenta Ferrara. "Isso reforça a violência com que ele trata as prostitutas porque, para o Giro, as pessoas que estão na noite não perdoam nada." Para ressaltar o confronto entre Giro e Célia, que pontua todo o espetáculo, o diretor fez um trabalho especial com a atriz Angela Barros. Apesar de seus atos audaciosos, como enfrentar o cafetão ao quebrar o abajur lilás, Célia demonstra também sua fragilidade quando, ao ser acuada, responde com o ataque verbal. "É uma reação puramente instintiva, para preservar sua sobrevivência", observa Ferrara, que aproveitou a experiência da atriz em trabalhos com menores abandonados e moradores de rua para decodificar a violência. Já o convite à outra atriz, Valéria Pontes, para o papel de Leninha, marca o fraterno contato de Ferrara com a Escola de Arte Dramática (EAD), que o convidou para dirigir o trabalho de conclusão de uma turma. "A Valéria formou-se na escola e sua presença na peça marca a forte ligação que mantenho com a EAD, uma vez que também a Ester Góes e a Angela Barros passaram por lá." A volta de Abujar Lilás a São Paulo comprova a resistência da montagem, que teve dificuldades em seu estágio inicial - apesar do reconhecido valor de sua dramaturgia, a peça não empolgou os empresários consultados por Ferrara, que buscava patrocínio. "Isso prova que Plínio Marcos continua um autor maldito, mesmo depois de morto", comenta o diretor. A trajetória da peça, aliás, é tortuosa. Escrito em 1969 o texto mofou na gaveta da censura depois de sofrer dois vetos e só foi encenado 11 anos depois, com Walderez de Barros persistindo em interpretar o papel principal, o que lhe valeu o Prêmio Molière de melhor atriz de 1980. Ao retratar os mecanismos e jogos de opressão do submundo, a peça incomodou os censores. "O texto tinha um forte apelo político, por isso gerou tanta polêmica", recorda-se Ferrara. Pesquisa encerrada - Com Abajur Lilás, o diretor encerra sua pesquisa sobre a obra de Plínio Marcos, um trabalho iniciado em 1999, quando montou Barrela. Naquele ano, iniciou, junto do também diretor Marco Antônio Brás (que dirigiu peças de Nélson Rodrigues), a responsabilidade pelas montagens do Teatro Eugênio Kusnet. A encenação de Barrela incentivou outros diretores a se debruçarem sobre a obra de Marcos, promovendo uma série de pesquisas e discussões. "É o caso de Mancha Roxa, Balada de um Palhaço, Quando as Máquinas Param e O Homem do Caminho, que marcou também a última apresentação em teatro de Cláudio Mamberti", afirma. Depois do encerramento da temporada, previsto para 23 de dezembro, Ferrara intensifica o trabalho em seu novo projeto, Mãe Coragem e Seus Filhos, de Brecht, que vai montar com Maria Alice Vergueiro. "Mas continuo falando sobre o mesmo assunto: a miséria humana." Abajur Lilás - Drama. De Plínio Marcos. Direção Sérgio Ferrara. Duração: 1h10. Sexta e sábado, às 21h30; domingo, às 20h30. R$ 15,00 (sexta e domingo). R$ 20,00 (sábado). TBC - Sala Assobradado. Rua Major Diogo, 315, em São Paulo, tel. (11) 3115-4622. Até 23/12.

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