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À prova de balas

A ótima autobiografia de Keith Richards mostra que, mais forte do que o próprio mito, o guitarrista é um verdadeiro sobrevivente

Por Roberto Nascimento
Atualização:

A julgar pela quantidade de substâncias ilícitas que passam pelas páginas de Life, a autobiografia de Keith Richards, o fato de o roqueiro estar vivo é, como se sabe, o primeiro milagre. O segundo é que ele escreveu um livro envolvente que retrata sua personalidade com franqueza e dá ao leitor a vertiginosa sensação de estar acompanhando, direto das trincheiras, a trajetória da maior banda de rock do mundo.Life começa em Arkansas, durante a turnê americana de 1974, com uma prisão por porte de armas. Protestos dos fãs e o perdão concedido por um juiz, que aceita soltar a banda em troca de uma faca de caça apreendida num carro recheado de drogas, mostram o tsunami que os Stones causavam por onde iam.Mas, aparentemente, nem isso nem as drogas fizeram com que Richards perdesse a cabeça. Sua reverência por Robert Johnson e Howlin" Wolf e sua consciência de que o maior feito musical dos Stones foi ter despertado a atenção dos americanos para o blues retratam um artista sensível, que não se deixou levar pelo vendaval da fama. Isto fica claro quando descreve uma cena surreal em que os Stones visitam a lendária gravadora Chess Records, templo do Chicago blues, e encontram Muddy Waters trabalhando de pintor para ganhar uns trocados. A avassaladora transição dos Stones de banda de covers para pop stars deixa Richards perplexo, mas o guitarrista conta que logo percebeu que era um jogo necessário. "Não posso desfazer os laços de quanto eu interpretei o personagem que escreveram para mim. O anel com a caveira, o dente quebrado... As pessoas acham que eu ainda sou um viciado. Faz 30 anos que não uso heroína", conta. Seu maior medo era a legião de garotas fanáticas que, de acordo com um dos trabalhadores de uma casa de shows, certa vez deixou "todas as poltronas molhadas". "É difícil explicar o quão assustadoras elas eram. Era melhor estar nas trincheiras, lutando contra o inimigo do que se deparar com esta implacável onda de desejo", conta. No departamento de polêmicas e alfinetadas, Richards afirma que é o grande compositor dos Stones. "Eu sou o mestre dos riffs. O único riff que não fiz, e tiro o chapéu para esse, é o de Brown Sugar, que foi feita inteira pelo Mick". Richards descreve Jagger como um alpinista social e conta sobre seus relacionamentos com Ronnie Spector, mulher de Phil Spector e Anita Pallenberg, mulher de Brian Jones com quem se casaria. O livro, em inglês, pode ser encomendado pelo site da Livraria Cultura.

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