A MORTE DE DAMIANI

Diretor foi um dos artífices dos filmes políticos italianos dos anos 1970

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Há anos ele estava aposentado, mas Damiano Damiani, que morreu na madrugada de ontem em Roma, de insuficiência respiratória, aos 90 anos, foi um diretor importante nos anos 1960 e 70. É verdade que Jean Tulard, no Dicionário de Cinema, faz uma ressalva. Diz que a obra de Damiani é curiosamente desequilibrada e é mesmo. Como diretor, ele fez escolhas que parecem disparatadas. Estreou com um policial (O Batom), fez filmes intimistas (A Ilha dos Amores Proibidos), eróticos (A Feiticeira do Amor), spaghetti westerns (Gringo) e forneceu ao cinema político italiano, por volta de 1970, alguns de seus títulos célebres, Confissões de Um Comissário de Polícia ao Procurador da República e Só Resta Esquecer, ambos com Franco Nero.Hoje em dia, em nome da correção política, um filme como O Batom talvez não fosse mais possível, ou Damiani teria de mudar o final - para mostrar como o personagem de Pierre Brice era imoral (e aproveitador), o relato deixa para a última cena a revelação da identidade da namorada do homem que vive de seduzir mulheres fragilizadas - e ela entra numa sala se arrastando com a ajuda de muletas. A cena seria considerada intolerável e o filme, por sinal, sumiu, como boa parte da produção italiana da época (apesar do esforço do resgaste em DVD pela distribuidora Versátil).A Ilha dos Amores Proibidos aborda os jogos sexuais de adolescentes, A Feiticeira do Amor baseia-se em Carlos Fuentes - e Rossana Schiaffino era um assombro em 1966, embora a liberalidade dos costumes talvez tenha tornado recatadas o que pareciam as ousadias eróticas do cineasta, há mais de 40 anos. Confissões e Só Resta Esquecer, sobre a polícia e o sistema penitenciário, são thrillers políticos e, como os de Costa-Gavras, os críticos, ingenuamente, diziam que Damiani era reformista, não revolucionário. Criticava o abuso do poder, não as estruturas do poder burguês.Mas anos antes, e também em 1966, Damiani fora revolucionário em Gringo (Quien Sabe?), um dos grandes, senão o maior dos spaghetti westerns (e isso apesar dos bangue-bangues operísticos de Sergio Leone). O problema com ele é que fez muitos filmes sem que se possa identificar uma necessidade visceral na realização. Dirigiu uma adaptação de Alberto Moravia que foi um fiasco - La Noia/Vidas Vazias. Fez até um terror, na série Amityville). O desequilíbrio e o disparate vêm daí, mas nos seus melhores momentos Damiani foi grande - não por acaso, Carlos Reichenbach o adorava.

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