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"A Memória da Água" leva ao palco conflitos femininos

Ana Beatriz, Andréa Beltrão e Eliane Giardini vivem três irmãs que se reúnem em uma cidade inglesa para o funeral da mãe. O texto de Shelagh Stephenson ressalta o papel da lembrança entre elas

Por Agencia Estado
Atualização:

Três irmãs reúnem-se, em uma pequena cidade inglesa, para o funeral da mãe. Há muito não se viam, principalmente por desentendimentos ao longo da vida. O reencontro forçado, portanto, obriga-as a relembrar os momentos passados juntas, o que acontece especialmente quando evocam a recordação da mãe. Em alguns aspectos, esta trama faz lembrar As Três Irmãs, de Chekhov, e até mesmo A Partilha, de Miguel Falabella. O papel da lembrança, que reúne forçosamente as mulheres inglesas, no entanto, é o principal diferencial da peça A Memória da Água, que estréia nesta sexta-feira, no Teatro Alfa, em São Paulo. Escrito pela inglesa Shelagh Stephenson, o tema aponta para um ajuste de contas, quando o relacionamento familiar em que viveram as três irmãs é apresentado como um mundo em frangalhos, marcado por desentendimento das mulheres com a mãe e entre elas mesmas. São vidas passadas a limpo de uma forma muito direta, comenta a atriz Ana Beatriz Nogueira, que interpreta Catarina, a irmã mais moça e mais rebelde ? vulnerável, hipocondríaca e compradora compulsiva, que confessa já ter tido mais de 78 amantes. Ela tem um complexo de abandono, pois se sente rejeitada pelas irmãs e pela mãe. O papel estava previsto originalmente para Andréa Beltrão, mas a atriz, disposta a não enfrentar novamente um personagem cômico, preferiu o de Maria, a irmã do meio, inteligente e fria, que tem total controle da vida profissional como médica, mas nenhum no aspecto pessoal. Ela não esconde que inicialmente temia o papel complexo, mas o sucesso de público e crítica no Rio, onde a peça ficou em cartaz de abril a setembro do ano passado, convenceu-a de ter feito a escolha certa. É Andréa, aliás, quem protagoniza um dos melhores momentos da peça, quando Maria decide vestir as roupas da mãe, no momento em que as irmãs estão arrumando o guarda-roupa. Ao vê-la com aqueles trajes, Catarina exclama: Você é cuspida a nossa mãe. E Ana Beatriz comenta: É aí que está o ponto principal da peça, todos temos um legado familiar que não é possível perder, por mais que rejeitamos; os maneirismos, as manias, tudo é passado de uma geração para outra. Substituta - Eliane Giardini vive a terceira irmã, Teresa, a mais velha, que permaneceu na cidade natal e cuidou da mãe. Adepta dos alimentos naturais, ela produz pílulas completamente orgânicas para os nervos e administra com o marido um pequeno negócio de produtos naturais. Como a atriz está envolvida nas gravações da novela O Clone, ela é a única do elenco a contar com uma substituta, Andréa Dantas, para eventuais ausências. A importância da lembrança é cuidadosamente trabalhada pelo diretor Felipe Hirsch, que vem adotando uma perspectiva memorialística em suas montagens à frente da Sutil Companhia de Teatro, grupo teatral cujo núcleo é formado ainda pelos atores Guilherme Weber e Erica Migon. Foi assim, por exemplo, em Cartas para não Mandar, texto escrito por Hirsch em 1997, em que um homem busca seu passado no estilo do cineasta Ingmar Bergman, reinventando-o. A diferença para os trabalhos anteriores é que A Memória da Água não conta com um personagem que conduz a história, controlando o tempo e o espaço. O texto foi produzido, aliás, durante momentos marcantes da vida da autora ? Shelagh Stephenson começou a escrever a peça em um aniversário familiar, mas, durante o processo, ela enfrentou a morte da mãe, o que aguçou sua sensibilidade e interferiu diretamente na forma de conduzir a trama. O título foi inspirado em uma conversa que ela teve com uma pessoa que trabalhou em um laboratório francês, há alguns anos. O que lhe interessou foi uma experiência que os cientistas de lá faziam com a água, durante uma pesquisa sobre a eficiência da homeopatia. Depois de vários meses de testes rigorosos, eles perceberam que a água, mesmo depois de removidos todos os elementos curativos que a ela foram misturados, ainda mantinha seu efeito benéfico. Segundo Shelagh, eles concluíram que a água funciona como uma fita magnética, ou, mais poeticamente, que tem memória. Pela temporada carioca, A Memória da Água recebeu cinco indicações para os prêmios Shell e Governador do Estado: duas indicações de melhor atriz para Andréa Beltrão, uma de melhor diretor, iluminação (Beto Bruel) e espetáculo. A mãe, que aparece durante um sonho da personagem Maria, é interpretada por Clarice Niskier, enquanto Marcelo Valle vive o marido de Teresa e Isio Ghelman, o amante de Maria. Serviço - A Memória da Água. De Shelagh Stephenson. Direção Felipe Hirsch. Duração: 1h30. Sexta e sábado, às 21 horas; domingo, às 18 horas. De R$ 20,00 a R$ 40,00. Teatro Alfa. Rua Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel.: 5693-4000. Até 3/2

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