A incrível invenção do alfabeto

Livro do escritor John Man conta que a escrita foi inventada pelo menos quatro vezes, enquanto o alfabeto, uma única. É uma história de 4 mil anos, mas com um movimento maior do que se imagina

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

A mais impressionante invenção da humanidade. Assim o escritor John Man descreve o alfabeto. ?A escrita foi inventada pelo menos quatro vezes; o alfabeto, uma única?, defende ele, quando fala de seu livro A História do Alfabeto (Ediouro, 168 págs., R$ 29,90), que chega às livrarias nos próximos dias. Man mostra, entre outras coisas, que tanto o nascimento do alfabeto quanto suas mudanças não são eventos de conotação apenas técnica, mas também política. É, portanto, uma história de 4 mil anos, mas que continua a se movimentar, mais do que comumente se imagina. Um dos exemplos mais recentes que ele usa é a adoção, nos anos 1990, do mesmo alfabeto utilizado pelos norte-coreanos na Coréia do Sul. John Man conta, em sua História do Alfabeto, inúmeros episódios que revelam a força da idéia de se criar um alfabeto perfeito e de como isso deu origem aos mais diversos ABCs. Um dos casos mais curiosos do livro é o da Coréia. Pioneira no uso do tipo móvel de metal, em um trabalho impresso em 1234, a Coréia usava a escrita chinesa, com algumas adaptações. Em 1418, um rei idealista, de 22 anos, chamado Sejong (dinastia Choson), herdeiro da tradição confucionista, sobe ao trono. Uma das preocupações de Sejong era que os trabalhos editados sob o seu governo não poderiam chegar ao povo. "Seu sentimento de frustração chegou ao fim com a publicação de uma cartilha em chinês falando das virtudes confucianas de piedade, lealdade e fidelidade própria das esposas", escreve Man. "Convencido de que as pessoas fariam o que estava certo se tivessem como sabê-lo, estimulou os professores a dirigirem-se ao campo levando a cartilha para ´explicar e repetir o texto, até mesmo para as mulheres e moças´." O problema é que a escrita chinesa não era conhecida da população, e seu aprendizado acessível apenas aos eruditos e sábios da corte. Começou a trabalhar, então, com um grupo de conhecedores, em busca de uma escrita coreana. Buscando na tradição mongol fontes para esse novo alfabeto, concluiu o trabalho no inverno de 1443-4. Publicou, então, a obra "Os Sons Corretos para a Instrução da População", em que justificava a adoção de um novo sistema de escrita, de um alfabeto: "Os sons de nossa língua diferem dos sons da China e não são fáceis de adaptar à escrita chinesa. Em conseqüência, entre os ignorantes, havia muitos que, tendo algo para colocar em palavras, viam-se, no fim das contas, incapazes de expressar seus sentimentos. Isso me afligia muito e por essa razão criei uma nova escrita de 28 letras, que desejo que todos pratiquem para sua maior comodidade e utilizem com vantagem na vida diária." Resistência - O esforço de Sejong encontrou resistência entre os sábios, que não queriam abandonar a escrita da cultura oficial. O primeiro jornal a utilizar o "hangul", nome do sistema, foi impresso somente em 1896. Durante a ocupação japonesa, entre 1910 e 1945, o sistema foi eliminado à força. Com a divisão da Coréia, o norte comunista adotou o "hangul", mas a do Sul continuou resistindo. "Mas a popularidade do hangul aumentou rapidamente na medida em que o próprio Sejong foi adotado como ícone do nacionalismo, imagem da perfeição humana (...). Na década de 1990, a sua grande invenção finalmente venceu."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.