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A essência sofredora das mocinhas das novelas

Elas riem pouco. Estão sempre com aquela expressão melancólica, própria de quem carrega nos ombros todos os problemas do mundo.

Por Agencia Estado
Atualização:

Tão certa quanto a vinheta do Jornal Nacional ou a risada de Silvio Santos é a desgraça das mocinhas de novela. Elas riem pouco. Estão sempre com aquela expressão melancólica, própria de quem carrega nos ombros todos os problemas do mundo. Sorrir para quê? O namoro nunca é tranqüilo, a melhor amiga é sempre malvada, os negócios vão falir em algum momento e elas são tão ingênuas que só percebem que tudo vai melhorar no capítulo final. Heroínas trocam de rosto, de idade e de figurino, mas a essência sofredora é imutável. Algumas nem trocam de nome, como é o caso da persistente Helena de Manoel Carlos. A cada nova trama do autor, lá está ela em sua incansável cruzada pela harmonia de todos os personagens. A próxima Helena, vivida pela terceira vez por Regina Duarte, já sabe qual será sua atitude boazinha: em Páginas da Vida, ela vai adotar uma criança com síndrome de Down que foi rejeitada pela família. Para quem já enjoou de ouvir sotaque carioca na TV, o jeito é torcer por outro momento de inspiração de Benedito Ruy Barbosa. Em breve, ´una bella ragazza´ como Ana Paula Arósio ou Priscila Fantin deve aparecer em cena aos prantos. Coitadinha. A família dela vive em guerra com a família do namorado, mas no último capítulo todo mundo termina dançando a tarantela. Se nem a turma da bota for capaz de alegrar o horário nobre, melhor fazer de conta que o ´Nordeste é aqui´ e se entregar às divertidas histórias de Aguinaldo Silva. Não é muito difícil dizer ´oxente´ de um jeito convincente, de forma que a musicalidade genérica dos diálogos não incomoda. Além disso, as moças valorosas do autor são sempre ´arretadas´: choram menos e agem mais. A última delas, Maria do Carmo (Suzana Vieira), chegou a estapear a vilã Nazaré (Renata Sorrah), com direito a cruzado de direita no queixo. Para mudar de ares, nada como uma trama bem paulistana, com a Paulista e o Parque do Ibirapuera como cenários. Neste quesito, Silvio de Abreu é imbatível. Nunca tem praia em cena, mas o elenco é tão bonito que ninguém perderia tempo contemplando a paisagem. A mocinha? Ela sofre muito também. Sem dinheiro, sem marido e sem o amor da filha, vai arquitetando sua engenhosa revanche. Apesar de tantas agruras, o novo amor já apareceu para alegrar sua vida. Conhecer a desgraça alheia, mesmo que ela seja de mentirinha, pode levar qualquer um a admirar a própria vida. Lembre-se da tortuosa sina de Sol (Deborah Secco) e comece a sorrir. Quem poderia ter uma vida mais terrível do que a dela? A heroína de América foi parar no painel do carro, dentro de caixa de papelão, virou estátua de rua ... Não é à toa que o Casseta & Planeta Urgente! a chamava de ´Solfredora´. Triste como ela, somente a carioca-muçulmana Jade (Giovanna Antonelli), de O Clone. Glória Perez sabe que criar uma ponte aérea instantânea entre o Rio de Janeiro e partes exóticas do mundo dá ibope. Para temperar, basta acrescentar qualquer novidade polêmica, de preferência da área médica. Sentiu saudades dos melhores dramas das garotas do horário nobre? Pegue um dado, convide a vizinha mais noveleira do bairro e experimente o jogo acima. Só não esqueça de levar uma caixa de lencinhos.

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