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Visconti ganha retrospectiva completa em SP

Mostra em três salas da cidade repassa, com entrada gratuita, a obra do cineasta italiano. Entre os destaques, Rocco e Seus Irmãos, Ludwig e O Estrangeiro

Por Agencia Estado
Atualização:

A mostra Esplendor de Visconti, inaugurada ontem, prossegue até sexta da semana que vem. Trata-se de uma imperdível retrospectiva completa de Luchino Visconti, um dos mais importantes cineastas de todos os tempos. Neste fim de semana, algumas obras fundamentais serão apresentadas nos três locais da mostra, o Centro Cultural São Paulo, O Museu de Arte Moderna (MAM) e o Cinusp. As cópias estão estalando de novas, haverá legendagem eletrônica e os ingressos são gratuitos. Quer dizer, a procura será grande e é bom telefonar antes de sair de casa. Na impossibilidade de citar todos os filmes, destacamos alguns: no Centro Cultural, sexta, às 14 horas, será apresentado Belíssima, uma grande atuação de Ana Magnani. Ela faz a mãe pobre, que deseja transformar a filha em atriz de cinema. Quando percebe o custo humano que a fama implicaria, recua, em uma cena de grande dignidade, como só a primeira-dama do neo-realismo italiano seria capaz de protagonizar. No mesmo local, às 18h30, será a vez de uma das obras-primas incontestáveis de Visconti, Rocco e Seus Irmãos, estudo fundamental sobre a oposição norte-sul na Itália dos anos 50. A família Parondi, originária da Lucânia, tenta a sorte em Milão. Vinda de um povoado de base rural, desagrega-se como um castelo de areia em contato com os valores da grande cidade industrial. A mamma (Katina Paxinou) é mais do que comovente. Entende que os filhos devem ser como os dedos de uma mão. Unidos, fortes. Mas a coesão familiar não resiste à lógica da linha de montagem, ou pelo menos esta é a análise de fundo de um filme que busca afirmar-se tanto pela razão como pela emoção. No sábado, sempre no Centro Cultural, teremos Morte em Veneza (11 h) e O Leopardo (17 h). Morte em Veneza será precedido de Em Busca de Tadzio, que Visconti fez para a televisão, narrando a sua procura de um ator para encarnar o ideal de beleza do compositor Gustav von Aschenbach. Encontrou-o no efeto sueco Björn Andresen. É ele quem vira a cabeça do velho músico, que vai atrás de uma ascese e encontra apenas o fim entre gôndolas e canais da Sereníssima. Uma adaptação solene da novela de Thomas Mann, conduzida pelo Adagietto de Mahler. O Leopardo é outra magnífica versão de uma obra da literatura, desta vez de um siciliano, o nobre Giuseppe Tommasi di Lampedusa. Em transcrição suntuosa, Visconti discute o ocaso de uma classe social, a aristocracia, que começa a perder espaço para a burguesia endinheirada. Burt Lancaster faz o príncipe de Salinas, Alain Delon é seu sobrinho Tancredi, e uma estupenda Claudia Cardinale interpreta a filha do novo-rico que ingressa na casa dos Salinas tendo a carteira do pai e a beleza como salvos-condutos. Domingo, também no Centro Cultural, é dia de não perder Ludwig, que começa cedo, às 10 h, em função dos seus 237 minutos de duração. A obra, do ponto de vista visual talvez ainda mais suntusosa que O Leopardo, conta a história do rei da Baviera, protetor das artes, que termina louco depois de um período de exuberância. O filme representa os ideais de Visconti com relação à beleza e à juventude, ambas fugazes. Lá mesmo, às 14 h, passa O Estrangeiro, tirado da obra homônima de Albert Camus. Marcello Mastroianni interpreta Merseault, que mata um árabe "por causa do sol", a representação literária por excelência do ato gratuito. Merseault é julgado e condenado não apenas por seu crime, mas por ter aparentado indiferença no enterro da mãe. O livro é impressionante pela maneira como aborda pelo avesso o funcionamento social, e o filme segue fielmente sua intenção. Mastroianni é comovente no papel. Sexta-feira, no Cinusp, será exibido A Terra Treme, um dos trabalhos mais diretamente engajados de Visconti. Inspirado pelo romance realista de Giovanni Verga, I Malavoglia, o cineasta descreve o conflito dos pescadores com os comerciantes de peixes. A história de tomada de consciência é acompanhada pela trajetória de ´Ntoni, pescador que decide estabelecer-se por conta própria, fracassa, desagrega o núcleo familiar e volta a trabalhar com os antigos patrões. Essa derrota temporária significa uma etapa para a sua desalienação, bem na linha marxista. Sábado, às 15 h no MAM, é a vez de uma das jóias da coroa dessa retrospectiva. Vagas Estrelas da Ursa tem esse título tirado de uma linha de Leopardi. Seria também o título de um livro de memórias do personagem Gianni (Jean Sorel), contando a história de sua família. Sandra (Claudia Cardinale) retorna a Volterra em companhia do marido. Lá fica o palacete de sua família. O jardim será doado para a prefeitura, que lá vai construir um jardim público em homenagem ao pai de Sandra, intelectual judeu que morreu em Auschwitz. A presença do irmão, o próprio clima conspiratório da cidadezinha, a mãe internada num sanatório, tudo contribui para minar o equilíbrio de Sandra. Os movimentos desse filme solene são mais uma vez marcados pela música. O que era o Adagietto de Mahler para Morte em Veneza é o Prelúdio, Coral e Fuga de César Franck para Vagas Estrelas da Ursa. Centro Cultural São Paulo (3277-3611). Cinusp (3818-3540). MAM (5549-9688, ramal 3).

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