Villaronga chega para debate e exibição de "O Mar"

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Agustí Villaronga já está em São Paulo. Chegou hoje, a tempo de participar da cerimônia de abertura da 2.ª Semana Brasil Independentes. Ele participa da programação com seu filme O Mar (El Mar), que será exibido domingo à noite no Espaço Unibanco 1. Na terça-feira, integra a mesa do debate intitulado Digital - Tecnologia do Futuro, sobre as novas técnicas que estão mudando não só o formato de produção, mas a própria linguagem do cinema. Antes de embarcar para o Brasil, Villaronga falou pelo telefone com a reportagem. Explicou a discrepância - ora seu nome aparece grafado como Austí, ora como Agustín. "O correto é o segundo, mas Agustí é como se diz em catalão". Cineasta da Catalunha, Villaronga mora em Barcelona. O Mar é seu quinto filme. Quase foi produzido por Pedro Almodóvar, por meio de sua empresa El Deseo. Almodóvar estava interessado, chegaram a conversar, mas o filme terminou sendo produzido por Luis Ferrando. Começa como a história de um grupo de crianças, na aurora do franquismo. O pai de um desses meninos é morto, ele se une a dois companheiros para vingar-se matando o filho do assassino. A narrativa decola assim. Os sobreviventes dessa história tétrica de infância carregam cicatrizes abertas na idade adulta. Encontram-se num hospital para recuperação de tuberculosos. Dois deles como pacientes, a menina que viu o crime a distância é agora noviça. Outras cinematografias já se voltaram para o tema da infância culpada ou venenosa, mas os grandes filmes - alguns dos maiores, em todo caso - dessa vertente são espanhóis. Basta citar Cria Cuervos, de Carlos Saura, e o genial O Espírito da Colméia, de Victor Erice. O primeiro filme de Villaronga, Tras el Cristal, de 1985, já tratava das obsessões e culpas da infância por meio da trama envolvendo um nazista pedófilo. O segundo, El NiÏo de la Luna, conta a história de um órfão num misterioso instituto para crianças telepáticas. O diretor conta que teve uma infância feliz - "normalíssima" -, mas se interessa muito pelo filicídio. Diz que a profanação da infância é algo muito doloroso. "Acho que a infância deveria ser preservada; quando uma criança se desestrutura, dificilmente o adulto em que ela se transforma consegue ser feliz mais tarde", avalia. Partiu daí para tecer a trama dos protagonistas já adultos. Há um subtexto homossexual. Um dos rapazes apaixona-se pelo outro, que é usado como prostituto por um velho rico. Há uma morte a machadadas, um estupro e um assassinato seguido de suicídio. Tudo muito duro e sombrio. O Mar é um daqueles filmes que fazem a ponte entre homossexualismo e morte. Apesar disso, Villaronga diz que, em momento algum, pretendeu fazer um filme sobre homossexualismo e, menos ainda, sobre a possível pulsão destrutiva dos gays. "Acho que toda pessoa tem direito à sua dignidade, independentemente da opção sexual". E acrescenta que o tema de O Mar é a estrutura religiosa, a repressão que impede as pessoas de viverem suas aspirações de forma natural e desencadeia destruição e morte. "É contra isso que me insurjo", resume. O filme, baseado num livro de Blai Bonet, autor apreciado na Espanha, foi bem recebido pelo público e pelos críticos. "Não foi um estouro de bilheteria, mas foi além dos circuitos de arte", conta o diretor, que acrescenta: "Chega a ser surpreendente, considerando-se o quanto é duro". Já que se trata de uma mostra dedicada à produção independente, Villaronga opina. "Não existe cinema de estúdio na Espanha; toda produção é independente, no sentido de que a grande maioria dos diretores encarrega-se de levantar também os recursos". Não parece muito diferente do cinema brasileiro, mas é. O Estado participa da produção, por meio de diversos mecanismos, mas o que realmente diferencia o cinema espanhol do brasileiro é que lá a televisão é uma parceria decisiva. "Não sei dizer sinceramente se temos leis de proteção e obrigatoriedade, mas a TV financia e veicula o cinema na Espanha", diz Villaronga. Embora o cinemão de Hollywood ocupe a maior fatia do mercado, cada vez mais aumenta a participação da produção espanhola no consumo dos espectadores. "Nosso cinema está numa fase de prestígio e expansão", diz Villaronga, acrescentando que esse crescimento se dá em detrimento do produto estrangeiro. Ele se prepara para uma experiência que antecipa muito rica - vai fazer, no México, um filme a seis mãos. "Não serão três histórias, mas seremos três diretores; ainda não decidimos muito bem quem vai fazer o quê; o importante é que queremos experimentar fórmulas e formatos".

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.