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Tom Cruise volta aos cinemas em 'No Limite do Amanhã'

Ator colhe seu maior êxito em anos com a releitura de mangá

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Foi há 21 anos - Harold Ramis fez um filme que virou cult, The Groundhog Day. Bill Murray e Andie MacDowell ficavam presos num dia sem-fim, que se repetia indefinidamente. Como acabar com o 'feitiço do tempo' - título que recebeu no Brasil - virava uma questão filosófica, mais até que estética. Não dá para não se lembrar de Feitiço do Tempo a propósito de No Limite do Amanhã. A fantasia científica que estreou na semana passada arrebentou em todo o mundo e já está sendo considerada a ressurreição de Tom Cruise. Os últimos anos (e filmes) não têm sido fáceis para o ex-ás indomável. A filiação de Cruise à cientologia colocou a imprensa contra ele (e com bons motivos). O fato de também ter-se colocado por dois anos nas mãos de Stanley Kubrick, para fazer De Olhos Bem Fechados, também teve um impacto na sua carreira. Fora da franquia Missão Impossível - o 3 e o 4 competem pelo título de melhor da série -, ele não tem tido grandes sucessos. Não tinha. No Limite do Amanhã arrebentou em escala planetária. É o mega-hit de Hollywood na atualidade. Embora Feitiço do Tempo seja uma lembrança inevitável, No Limite do Amanhã baseia-se no mangá (japonês, claro) All You Need Is Kill, de Hiroshi Sakurazaka. Na Terra do futuro, Cruise faz um especialista de propaganda que é forçado a participar, como recruta, do combate decisivo contra alienígenas que estão ganhando controle do planeta. Chamados de mimetics, esses ETs são controlados por um cérebro (Ômega) que interfere no tempo. Como Bill Murray na comédia de Ramis, Cruise vê o seu dia se repetir, e justamente ao desembarcar na praia em que ocorre o primeiro grande confronto com os mimetics. Ele faz uma rápida passagem, pela caserna, é lançado no calor do combate, morre e ressuscita. Ao morrer e ressuscitar, descobre que a grande heroína dessa guerra - Emily Blunt - viveu o mesmo processo. E, agora, os dois mais o cientista que descobriu a interferência de Ômega sobre o tempo tentam descobrir onde está o cérebro alienígena. Cada vez que chegam perto, Ômega cria novas formas de interferência e despistamento. E Cruise segue morrendo, e ressuscitando.

Como se conta uma história de ação baseada na repetição? Assim como se pode dizer de John McTiernan que formatou o cinema de ação de Hollywood nos anos 1980 - com O Predador e Duro de Matar -, Doug Liman fez o mesmo com o cinema de ação dos anos 2000. É o cérebro por trás de A Identidade Bourne e Sr. e Sra. Smith. É muito interessante ver como Liman resolve o problema da repetição. Como ele acelera o processo - caserna, preparação, lançamento na praia, morte, ressurreição - e queima etapas por meio de uma montagem que suprime a repetição sem alterar o entendimento global. No Limite do Amanhã é muito bem montado. O cinéfilo não terá dificuldades para identificar outras fontes de referências - O Resgate do Soldado Ryan (o desembarque sangrento), Matrix (as Sentinels nos sonhos cada vez mais formatados como pesadelos do herói) e muitas outras. Nada disso transforma No Limite do Amanhã numa experiência de segunda mão. A palavra não é acidental. No Limite do Amanhã propõe-se, conceitualmente, como experiência/experimento para o espectador. Tom Cruise, talvez por sua ligação com a Cientologia - o criador da seita está congelado, à espera de que o desenvolvimento tecnológico talvez lhe possa devolver a vida -, tem feito muitas fantasias científicas. Aos 40/50 anos - em MI-3 e 4, Guerra dos Mundos e Oblivion -, sua diversão preferida virou salvar a humanidade. Não é mais o garoto de pele lisa de Ases Indomáveis, que esculpiu seu mito. As rugas estão cada vez mais visíveis e, mesmo que ele não tenha alcançado ainda o rosto esculpido na pedra dos astrosa do passado -, ele desenvolveu uma capacidade de expressar tormento no olhar que o vulnerabiliza como herói. Durante boa parte de No Limite do Amanhã, o público pode se preocupar com um detalhe que não é irrelevante. O filme será uma epopeia guerreira, uma apologia do heroísmo? Pois o herói vai se perfeccionando para o combate decisivo. Cruise, em Guerra dos Mundos, repetiu John Wayne em Rastros de Ódio, mas se podia pensar que o tributo a John Ford era coisa de Steven Spielberg. Em No Limite do Amanhã, o triunfo do herói vira celebração do anonimato - veja para saber como isso ocorre. John Wayne, de novo, em O Homem Que Matou o Facínora. Pode ser coisa de Doug Liman, mas o filme foi escrito por um homem de confiança de Cruise, o roteirista Christopher McQuarrie. É coisa dele, também.

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