Thriller subversivo de Tom Cruise chega ao Brasil

O melhor de Colateral não é o fato de Tom Cruise ser o vilão, mas a densidade da história. Confira outras estréias: "Garotas do ABC", de Carlos Reichenbach. "Primavera, Verão, Outono, Inverno ...e Primavera", de Kim Ki-duk

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Por Agencia Estado
Atualização:

Michael Mann, que formatou (com Paul Michael Glaser) a série Miami Vice, e fez filmes como Fogo contra Fogo, O Informante e Ali, confirma que é grande com Colateral, a mais importante estréia de hoje nos cinemas do Brasil. O filme tem uma história densa, forte, poderosa, sobre um assassino profissional que invade o carro de um motorista de táxi e o arrasta para uma noite de violência sem par. Vincent (o assassino) tem até de manhã para eliminar as cinco pessoas de uma lista. São testemunhas que vão depor (ou já depuseram) contra um certo Félix. Mann espalha signos pela narrativa para passar mensagens ao espectador. Para justificar o vidro estilhaçado, o motorista diz ao guarda que atropelou um veado. Inesperadamente, no meio da noite, um veado passa diante do carro, seguido por um lobo de olhos reluzentes. E existe a história do morto no trem. Logo no começo, para mostrar como Los Angeles é desconectada, Vincent conta sobre esse homem que morreu no trem e o corpo ficou o dia inteiro viajando. As pessoas sentavam-se ao lado dele e nem se davam conta de que estava morto. No fim de Colateral, há um morto no trem do metrô. A imprensa, que quase sempre trabalha com simplificações, está fazendo um carnaval com o fato de o astro Tom Cruise interpretar o vilão da história. O vilão? Cruise faz o assassino, mas se houve uma regra que Mann se impôs em Colateral foi a de não aceitar o tradicional maniqueísmo hollywoodiano. O assassino e o motorista de táxi estabelecem uma relação complexa como a do criminoso com o policial que o persegue em Fogo contra Fogo. Em nenhum momento representam o bem e o mal. O assassino é um profissional que exerce seu métier com método. Quando as coisas saem errado, ele improvisa. É a principal lição que transmite para o taxista. Esse homem sonhador é, basicamente, um insatisfeito. É bom no que faz (como o assassino), mas volta e meia sente a necessidade de fugir do seu cotidiano opressivo. O taxista improvisa para salvar a própria vida (e a dos outros). O assassino, sem recuar, toma consciência do horror de sua condição. O olhar de Tom Cruise é revelador quando vê passar o veado, pacífico como um cordeiro, seguido pelo lobo. Michael Mann trabalha com os símbolos, mas há um clima de mistério - de além da imaginação - que os deixa enigmáticos. É um filme de ação, sobre a violência do mundo. O figurino parece tradicional - Colateral tem tiroteios, perseguições. Parece um thriller normal. Mas o importante é a construção dos personagens, é o que muitas vezes fica subentendido sem ser dito, é a cinedramaturgia que faz do assassino e do taxista verdadeiros (e densos, fortes) personagens.

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