Telescope entra em cena para inovar

Está surgindo uma nova distribuidora de filmes. A Telescope não é só uma sociedade constituída para distribuir filmes no País, mas deverá atuar nas três áreas - produção, distribuição e exibição

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Por Agencia Estado
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Está surgindo uma nova distribuidora de filmes. "Nova Distribuidora", por sinal, é a razão social da empresa que tem o nome de fantasia muito mais sugestivo de Telescope. E não é só uma sociedade constituída para distribuir filmes no País. A Telescope surge como uma promessa de tripé completo, devendo atuar nas três áreas - produção, distribuição e exibição. Seus sócios são três: Jean-Thomas Bernardine, Patrick Siaretta e Roberto D´Ávila. E cada um deles traz para a Telescope a riqueza de sua experiência pessoal. Jean-Thomas é o dono da Imovision, uma distribuidora de filmes de arte que tem colocado títulos importantes no mercado brasileiro. Na quinta mesmo, a Imovision lança no País o novo filme de Robert Guédiguian, o diretor francês que virou arauto da antiglobalização - Marie-Jo e Seus Dois Amores, com Ariane Ascaride, a atriz francesa que esteve em São Paulo no início da semana passada, justamente para divulgar essa estréia tão importante. Siaretta tem por trás a estrutura da Tele-Image, hoje a empresa brasileira mais bem equipada no setor de tecnologia de ponta aplicada ao digital. "Somos uma das cinco maiores empresas do mundo no setor", ele afirma. A Tele-Image prepara as cópias digitais de filmes que são lançados na sala especial do Shopping Jardim Sul. Entre os planos da Telescope está justamente equipar a cidade com novas salas dotadas de tecnologia digital. E não apenas isso: criar espaços onde o consumidor adulto seja tratado como tal, dispondo até de um uisquinho em vez das tradicionais pipocas. Para tanto, os sócios já estão em negociações, tentando adquirir cinemas necessitados de reforma, em pontos atraentes de São Paulo. O capital inicial da Telescope é de US$ 4 milhões, somados à bagagem que cada empresa pode acrescentar ao grupo. A Telescope, por exemplo, vai distribuir títulos da Imovision. "Vamos trabalhar inicialmente os dois selos", explica Jean-Thomas. "O que vai acontecer mais tarde ainda não sabemos, talvez vire um selo só, mas por enquanto vamos trabalhar com ambos." O primeiro título da associação Imovision-Telescope chega aos cinemas em 25 de dezembro, como presente da Natal da nova distribuidora para o público brasileiro. Será a cópia restaurada do clássico O Grande Ditador, de Charles Chaplin, que Jean-Thomas espera poder lançar em 19 salas, incluindo versões em digital, para projeção também digitalizada. O filme de Chaplin integra o pacote de obras do criador de Carlitos que foram restauradas pela empresa francesa MK2, de Marin Karmitz. Convidada a vir ao Brasil para prestigiar a reestréia em cópias novas, Geraldine Chaplin disse inicialmente que sim, mas colocou à disposição datas em novembro. Com a estréia fixada agora em 25 de dezembro, Jean-Thomas e Siaretta tentam conseguir uma brecha na agenda da atriz, que participa de turnês internacionais para promover o filme de Pedro Almodóvar, Fale com Ela, já em cartaz no País. Acordos - Como a Tele-Image desfruta excelente reputação internacional, a Telescope está fechando acordos internacionais de cooperação. Em janeiro, desembarca em São Paulo o diretor de Taiwan, Nelson Yu Lik-wai. Autor de um filme que fez boa carreira em festivais de todo o mundo, Love Will Tear Us Apart, ele vem para finalizar na Tele-Image seu novo trabalho, All Tomorrow´s Party, que já tem uma promessa de integrar a seleção do próximo Festival de Cannes, em maio. Esse filme faz parte de um acordo da Telescope com a empresa Celulloid Dreams, visando ao intercâmbio de tecnologia e também protocolos de distribuição internacional. "Uma de nossas metas", explica Siaretta, "é a colocação de filmes brasileiros no mercado internacional." A Tele-Image já está restaurando, digitalmente, os filmes de Cacá Diegues, um dos mais importantes diretores brasileiros, autor de obras fundamentais como Xica da Silva, Chuvas de Verão e Bye Bye Brasil. A idéia é ir além, fechando também um acordo de distribuição, mas este tem de ser muito bem costurado, porque envolve diferentes produtores. "Nossa prioridade é a recuperação dessas obras, até como contribuição à preservação de um patrimônio da cultura nacional", diz Jean-Thomas. Francês radicado no Brasil, há muito ele se dedica a divulgar no País o cinema francês - ou o cinema francófono, em geral -, ao mesmo tempo em que ensaia para que essa divulgação funcione em mão dupla e também possa colocar o cinema brasileiro no exterior. A Telescope surge com essa promessa - colocar o produto brasileiro no mercado internacional. A Tele-Image é responsável pelos efeitos do novo filme de Xuxa, Duendes 2. Não é exatamente uma recomendação de qualidade estética, mas o compromisso da Telescope não é com esse tipo de produto descartável - que vai animar as férias de verão dos baixinhos de todo o Brasil - e sim, trabalhar no circuito mais perene de arte. A boa notícia é que Jean-Thomas e seus sócios estão dispostos a avaliar projetos de diretores brasileiros que se encaixem no perfil da nova empresa. Será um começo e tanto. O Grande Ditador foi feito por Chaplin no fim dos anos 1930. O ditador do título é inspirado em Adolf Hitler e o filme contrapõe o barbeiro judeu de uma pequena cidade ao todo-poderoso senhor do mundo para denunciar a barbárie do nazismo, no momento em que o mundo se preparava para ingressar na 2.ª Guerra Mundial. A lenda diz que o próprio Hitler se fazia projetar, às escondidas, O Grande Ditador, e ria com o ridículo a que Chaplin o submetia. O grande ator e diretor, que criou seu personagem imortal, Carlitos, no cinema silencioso, resistiu quanto pôde ao advento do som. O cinema já falava e ele seguiu fazendo um filme mudo em Luzes da Cidade. Em Tempos Modernos, o som entra por meio de um diálogo absurdo, que não faz nexo. Finalmente, em O Grande Ditador, Chaplin rendeu-se à força da palavra e o fez para afirmar um compromisso humanista imorredouro. O discurso final do barbeiro, sósia do ditador, é daqueles momentos que, por sua grandeza, justificam o cinema como arte. Nada mal que a Telescope surja sob o signo de Chaplin, com esse compromisso.

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