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Suzana Amaral vence 12.º CineCeará

O longa Uma Vida em Segredo ganhou como melhor filme, melhor atriz (Sabrina Greve), fotografia (Lauro Escorel) e direção de arte (Adrian Cooper)

Por Agencia Estado
Atualização:

Homenagem tocante a Sarita Montiel, cerimônia de premiação caótica e reparação a uma injustiça. Houve de tudo isso no encerramento do 12.º CineCeará, que consagrou como grande vencedor o longa-metragem Uma Vida em Segredo, de Suzana Amaral, praticamente ignorado quando participou do Festival de Brasília no ano passado. Além do troféu de melhor filme, o longa ganhou as estatuetas de atriz (Sabrina Greve), fotografia (Lauro Escorel) e direção de arte (Adrian Cooper). A entrega de prêmios foi precedida por um show da atriz espanhola Sarita Montiel, que cantou o bolero Besame Mucho, o samba-canção A Noite do Meu Bem, de Dolores Duran, e, claro, seu carro-chefe, La Violetera. Para alegria dos fãs, jogou flores para a platéia, num simulacro do que faz em cena do filme homônimo de 1958, exibido em seguida. Vá lá: não sendo possível arrumar violetas no calor de Fortaleza, a cantora contentou-se com cravos, mas a intenção poética foi cumprida e velhos admiradores deliraram. Foi bonita a festa, pá. Pelo menos até o início da premiação. Então, começou a prevalecer o narcisismo do apresentador Perry Salles (ex-senhor Vera Fischer, item de currículo que ele não se cansa de alardear), que precisava aparecer mais que os homenageados, e tudo foi por água abaixo. Gracinhas fora de propósito, grosserias e trapalhadas transformaram o palco do Cine São Luiz em picadeiro. Sarita Montiel foi embora, tudo terminou sob vaias e por pouco o apresentador não sai no braço com um membro da platéia. Lamentável. Dessa premiação fica o desagravo a Suzana Amaral, que ganha quatro prêmios para o seu filme e o reconhecimento de que um trabalho feito na contramão do pop, sério, despojado, bressoniano, ainda tem vez nesta vida. Suzana modula sua adaptação de um livro de Autran Dourado com emoção contida, contando a história da moça meio selvagem que vai viver na cidade com parentes, não se adapta à situação e termina de maneira triste. Talvez o prêmio principal ganhasse mais destaque se tivesse ficado com Jorge Furtado e seu Houve uma Vez Dois Verões, raro filme que respeita a inteligência dos jovens brasileiros. Fala como eles, fala para eles e também aos marmanjos, que se recordam das próprias inquietações de juventude. É ágil nos diálogos e na forma de narrativa. Ganhou os troféus de direção e roteiro (também de Furtado), e montagem, de Giba Assis Brasil. Uma Vida em Segredo e Houve uma Vez Dois Verões concentraram os principais prêmios. As Três Marias ficou com o troféu de ator, para Wagner Moura, e levou o prêmio Samburá, oferecido pelo jornal O Povo. A Festa de Margarette teve reconhecida apenas a trilha sonora, de Hique Gómez. Já os quatro documentários concorrentes entraram e saíram de cena como figurantes em filmes de Glauber Rocha - de mãos abanando e sem entender grande coisa do que tinha acontecido. Mais uma vez se comprova que o gênero não comove muito os júris de festival. Monstros sagrados como Eduardo Coutinho, que recentemente venceu Brasília com Santo Forte, não passam de exceções que confirmam a regra. No segmento de curtas-metragens, o júri foi bem ao reconhecer o talento de Eduardo Valente e seu já premiadíssimo Um Sol Alaranjado, que leva para casa três troféus: melhor filme, direção e atriz (Patrícia Selonk). Mas o mesmo júri foi mal ao praticamente ignorar o inteligente Domingo, do gaúcho Gustavo Spolidoro, que ficou apenas com direção de arte, premiação insuficiente para seu potencial. Deve ir adiante em outros festivais, em especial no próximo, o de Gramado, quando então joga em casa. Mas seja dito que, em Fortaleza, o fator campo não prevaleceu. Pelo contrário, e a prova disso foi a pífia premiação de O Céu de Iracema, que ganhou apenas fotografia e merecia mais. Usa uma linguagem exclusivamente visual e simples - uma briga de pipas nos ares - para falar de uma bela história de amor entre crianças. Festivais servem para muita coisa, entre elas explicitar discussões estéticas latentes. Em Fortaleza, a melhor delas aconteceu no debate, às vezes oculto, às vezes escancarado, que tinha, de um lado, Suzana Amaral e sua concepção de cinema clássico, puro, que não se deixa contaminar por linguagens estranhas, como as da TV ou da publicidade. Do outro, um Jorge Furtado eclético, pondo em prática um cinema onívoro, inquieto, aberto ao mundo moderno e às suas linguagens novas. No veredicto do júri, Suzana venceu. Por pontos, por pouco, e no último round. Outros confrontos virão, mais adiante. (*) O repórter viajou a convite da organização do festival.

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