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Secretário destaca afirmação nacional via cinema

Por Agencia Estado
Atualização:

No fim de semana passado o secretário do Audiovisual, José Álvaro Moisés, estava em Londres, mas não fazendo turismo. Ele foi à Inglaterra com uma agenda bem específica: mostrar para exibidores e distribuidores ingleses o catálogo com a produção brasileira desde 1995. Simultaneamente, foi realizada uma retrospectiva com títulos expressivos da cinematografia nacional desde os tempos do Cinema Novo. O objetivo é óbvio: Moisés acha que o cinema brasileiro precisa ultrapassar as fronteiras do País. Para chegar a ser uma indústria, precisa criar mercados. Mas não foi só isso: na sexta-feira e no sábado, realizou-se na Universidade de Oxford um seminário para discutir os rumos estéticos do cinema do Brasil. Participaram acadêmicos brasileiros, como os pesquisadores Ismail Xavier e Lúcia Nagib, que discutiram o assunto com colegas da academia britânica. No fim do mês, Moisés vai a Porto Alegre participar do 3.º Congresso do Cinema Brasileiro. A Secretaria do Audiovisual apóia o evento promovido pela Fundação do Cinema Gaúcho (Fundacine), entidade ligada ao governo do Rio Grande do Sul. O congresso será presidido por Gustavo Dahl e reunirá representantes de todos os segmentos ligados à produção cinematográfica no País. Moisés espera que dele saiam propostas para serem encaixadas no seu projeto de mudanças da Lei do Audiovisual. Diz que o projeto será encaminhado ao Congresso Nacional, para votação, em agosto. Espera que, uma vez aprovadas, as mudanças possam ser colocadas em prática logo. O secretário tem pressa em reformular as leis de incentivo à produção audiovisual brasileira. Moisés anda preocupado com o que considera uma deturpação das propostas da secretaria e, portanto, do Ministério da Cultura, para o cinema. Acha que tem muita gente interessada em embolar o meio de campo. Não cita nomes, mas acha que é preciso sistematizar, conceituar e contextualizar a política do governo para o cinema e não apenas ficar divulgando ou debatendo iniciativas como o projeto Mais Cinema, o programa para incentivar a produção de baixo orçamento ou seja lá o que for. "Precisamos discutir a política como um todo", diz. Valor estratégico - Moisés fala muito no plural. "Nossa política", "nossas propostas". Não fala só por ele. Fala em nome do governo Fernando Henrique Cardoso. Começa falando da "nossa preocupação": a produção audiovisual como um todo e o cinema, especificamente, interessam ao governo por seu caráter estratégico. Uma das conseqüências do processo de globalização é a demanda crescente por imagens. O Brasil precisa produzir suas imagens, até como forma de fortalecimento da identidade nacional. Num mundo globalizado, a produção de imagens é um instrumento poderoso de afirmação nacional. Dentro desse raciocínio, ele considera que a meta do governo é estimular a produção cinematográfica no País. Mas não adianta só criar leis de incentivo à produção. Ele diz que elas devem ser corrigidas e mantidas, mas são insuficientes, pois uma conseqüência do aumento da produção - e a produção brasileira vem aumentando - é a demanda por mercado. O cinema brasileiro precisa de salas, no próprio Brasil e no exterior. Qualquer discussão sobre a diversificação dos sistemas de produção tem de incluir também a exibição. O secretário não concorda com uma crítica que, com freqüência, é feita à Lei do Audiovisual. A lei, que permite às empresas investirem na produção cinematográfica dinheiro do imposto de renda devido, é criticada porque atribui aos diretores de marketing das empresas o direito de escolher aquilo em que vão investir. Em geral, eles favorecem as produções de mercado, com temas fáceis e nomes globais no elenco. Moisés acha que não se pode criar um mecanismo como a Lei do Audiovisual e, ao mesmo tempo, desconfiar do sistema sobre o qual ela se embasa, desconfiando, por exemplo, dos tais diretores de marketing. Ele também diz que o governo tanto está interessado em estimular projetos culturais, que multiplicou por quatro os investimentos em projetos a fundo perdido, que favorecem curtas, documentários, roteiros e desenvolvimento de projetos, no período entre 1995 e 2000. Os projetos de incentivo são muitos: o programa Mais Cinema, com dotação de R$ 80 milhões, que funciona na base do crédito (os diretores e produtores tomam dinheiro emprestado do BNDES), premia com até 20% do total do empréstimo os títulos beneficiados; o programa de incentivo à produção de baixo orçamento, cujo objetivo é aumentar a produção para 2001 - diante da realidade que confirma um decréscimo do investimento, pelas empresas, na produção de filmes, no último ano. Além disso há convênios, como o da secretaria com a Riofilme, que pretendem estimular a distribuição. Mas só isso não basta. Quatro pontos - As grandes propostas de mudança que o secretário quer levar ao conjunto da sociedade ("Numa democracia, o governo não pode ficar editando medidas provisórias para tudo: as propostas têm de ser debatidas e aprovadas no Congresso") estão contidas num programa de quatro pontos que já foi submetido à Comissão de Cinema do MinC. São eles: a quebra do mecanismo que permite combinar o desconto de investimentos audiovisuais como despesa operacional e incentivo fiscal; a transformação do artigo 3.º da lei que prevê a participação de distribuidoras estrangeiras em co-produções no País (e que elas quase não usam porque comprometem seus benefícios no país de origem) em Contribuição para o Desenvolvimento do Audiovisual; a criação de fundos de investimentos no audiovisual por cotas para permitir a participação de pequenos investidores e pessoas-físicas no financiamento do setor; e a mudança da lei da cota de tela, para torná-la efetiva. Em busca de parceiros para diversificar o sistema de produção, Moisés despertou polêmica ao propor a associação da televisão com o cinema. Seu raciocínio é simples: se o Brasil quer mesmo ter uma indústria para competir com o produto audiovisual americano, tem de aceitar a associação com um segmento empresarialmente bem-sucedido como a TV. Ele considera insulto dizer que o objetivo do governo é entregar o cinema de mão beijada à TV. A fórmula dessa associação, que precisa ser discutida pelo governo, pelo Congresso e pelos meios de comunicação, busca atrair uma massa de novos investimentos cujo resultado será, afinal de contas, a ampliação da produção e do mercado de trabalho. Para isso, diz, será preciso repensar o artigo 2.º da Lei do Audiovisual, que reserva o direito de captação de recursos públicos somente aos produtores independentes, afastando as grandes empresas do setor. Moisés diz que a idéia do governo é fazer com que as redes de televisão se associem aos independentes. Tudo isso terá de ser discutido e o congresso de Porto Alegre poderá ser o fórum para tal discussão.

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