Roma: filme longo sobre história de amor

O drama do diretor Adolfo Aristarain estréia hoje no HSBC Belas Artes

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Por Agencia Estado
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O título em português do novo filme de Adolfo Aristarain resolveu ser explicativo e então ficou: Roma, um Nome de Mulher. No original é assim só: Roma. Lembrando que o nome da capital da Itália é um anagrama perfeito de outra palavra, amor. Pieguice? Não, só uma característica de palavras que podem ser lidas da esquerda para a direita e da direita para a esquerda. Em todo caso, Roma é obviamente um filme sobre o amor. E sobre a memória. O título recebe o nome da mãe do protagonista, Joaquín Goñez, que, no limiar da velhice, resolve escrever algo que se assemelhe a uma autobiografia. É argentino, mudou-se para a Espanha há muitos anos e tornou-se romancista de sucesso. Já teve a sua fase. Passou, e sabe disso. O que resta agora? Uma retirada honrosa, de preferência com algum dinheiro no bolso, e só. Por isso, mais do que por qualquer outro motivo, vai escrever suas memórias. Para digitar o texto no computador (escreve à mão), Goñez contrata um jovem que terá também de enfrentar o mau humor do chefe. Enfim, Roma é um filme em dois planos - o do presente, quando o escritor (então vivido por José Sacristán) está escrevendo as memórias, e o do passado, por ele evocado. Esse segundo, o do passado, é infinitamente melhor que o outro. Trata-se, então, de um filme de época, colocando em cena o garoto, pai e mãe, na Buenos Aires dos anos 50 e 60. O nome do filme não é dado gratuitamente. Roma (Susú Pecoraro) é a mulher forte, generosa, em torno da qual todos giram. Roma era também o nome da mãe real de Aristarain. Quer dizer, o filme é ostensivamente autobiográfico, ele também. Mas uma daquelas autobiografias ficcionais, que misturam fatos reais com outros criados pela imaginação. De qualquer forma, um acerto de contas do diretor com seu passado, e isso tem peso na feitura da obra. Não por acaso, se trata de um filme longo, duas horas e meia, como se Aristarain necessitasse desse tempo todo para fazer um balanço de vida decente. O espectador, que não tem nada a ver com isso, às vezes se ressente de uma certa falta de síntese. E este pode ser um dos problemas do filme - ele é percebido como longo demais, cheio de seqüências que poderiam talvez ser resumidas sem qualquer prejuízo para o que se tem a dizer. Mas ainda aqui nos sentimos predispostos a perdoar Aristarain pela perda do nosso precioso tempo. É que ele compensa a prolixidade com uma visão sincera das coisas. Há um coração puro que está contando aquela história (na verdade, a sua história) com sinceridade, com emoção, e isso nos predispõe a ouvi-lo. Há um outro tipo de prolixidade, e este é menos desculpável. Não se trata aqui de gastar tempo demais, mas de preencher esse tempo com uma enxurrada de palavras que dispensaríamos de bom grado. Não que isso seja um novidade em se tratando do cinema de Aristarain. Quem conhece seus outros filmes, como Martin Hache e Um Lugar no Mundo, por exemplo, sabe que não se trata de um cineasta do silêncio ou da economia de recursos. Ele fala, e às vezes fala demais. Acredita na força das palavras, mas não à maneira, digamos, de um Graciliano Ramos que as tornava mais fortes quanto mais as fazia raras. Graciliano acreditava na subtração; Aristarain, na adição. Nada fica subentendido. Tudo é dito, comentado e reafirmado, para que não caibam dúvidas. E, sim, esse excesso, de uma certa maneira, tira um pouco da força dessa bela história. Bela? Sim, porque, tudo somado, o que Aristarain nos tem a contar é de fato uma bonita história. De alguém que se torna um grande artista mas não consegue produzir um balanço positivo de vida. Na curva do tempo, olha para o passado e tenta recuperar (em vão) o que houve de fundamental em sua existência. É melancólico, mas é assim. Roma, Um Nome de Mulher (Roma, Ar/2004, 155 min.). Drama. Dir. Adolfo Aristarain. 14 anos. HSBC Belas Artes 3 - 15h20,18h10, 21h. Cotação: Bom

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