Rodrigo Santoro encarna travesti

Terceiro de uma sucessão de papéis de impacto no cinema, o personagem que o ator interpreta em "Carandiru", de Hector Babenco, é cercado de mistério

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Pouco menos de uma década separa a primeira aparição do ator Rodrigo Santoro numa novela da Globo de sua recente consagração no cinema. Um episódio clássico no Festival de Brasília, em 2000, simboliza uma espécie de rito de passagem na carreira de Santoro, pontuando justamente essa ´evolução´ de galã global para ator premiado. Antes da exibição do filme Bicho de Sete Cabeças no evento, Santoro foi alvo de vaias. No fim da sessão, no entanto, sua interpretação arrancou lágrimas dos espectadores. Aos olhos do brasileiro, nascia ali um ator de credibilidade. Depois do Bicho, de Laís Bodanzky, e Abril Despedaçado, de Walter Salles (inédito nas telas brasileiras), Rodrigo Santoro agora tem a difícil incumbência de encarnar um travesti no filme Carandiru, adaptação do livro Estação Carandiru, de Drauzio Varella, sob a direção do respeitado Hector Babenco. É um desafio para quem costuma arrancar suspiros do público feminino quando seu belo rosto inunda a telona, seja como Neto, no Bicho, seja como Tonho, em Abril Despedaçado. Carandiru ainda está em fase de produção, por isso Santoro - assim como os demais colegas de elenco - se recusa a dar detalhes sobre o recente trabalho. Recomendação de Babenco. "Vou fazer um travesti e ponto", restringe-se a falar. Comenta-se que seu personagem responde pelo nome Lady Di, mas o jovem ator não confirma. "Eu não vou dizer nada sobre isso." "Meu papel é inspirado no livro, mas não tem o mesmo nome de nenhum personagem da obra", completa. Quem folhear com atenção o best seller do médico Drauzio Varella encontrará uma brevíssima menção de um tal travesti Leidi Dai. Ele surge no meio de um capítulo dedicado a outro travesti, Margô Suely, com quem Leidi Dai protagoniza uma cena de briga por ciúmes. No roteiro do filme, Lady Di ganharia maior projeção e outra roupagem. Um travesti de estilo, com cabelos curtos, sobrancelhas bem-feitas e peitos siliconados. Entra no meio da trama para fazer um teste de HIV no consultório de Varella, dentro da penitenciária. Conhece o detento Sem-Chance (também presente no livro) e os dois se apaixonam. A certa altura, o casal decide oficializar o relacionamento no próprio Carandiru. A cerimônia de casamento é celebrada por um travesti sacerdote. São algumas especulações. Assim que recebeu o convite para integrar o cast do longa-metragem, Santoro começou a ler o livro. "Acho a obra maravilhosa; é impossível ler o Estação e não pensar num roteiro, porque está cheio de histórias, é uma colcha de retalhos", avalia ele, que iniciou as filmagens durante o carnaval. Ator aplicado, ele garante que o total envolvimento com o novo projeto amenizou a notícia de que Abril Despedaçado não estaria entre os cinco concorrentes ao Oscar de melhor filme estrangeiro deste ano. "Eu não tinha criado nenhuma expectativa em relação ao Abril, mesmo porque, quando saiu o resultado, eu estava trabalhando no Carandiru", relata. "Fiquei triste, mas no dia seguinte nem lembrava mais." Para ele, a escalação do filme daria novo impulso ao cinema nacional. "Mas estou feliz com o que Abril vem conseguindo, a reação do público no Festival de Veneza, que o aplaudiu durante oito minutos." Um mês antes de Walter Salles começar a rodar Abril Despedaçado, Rodrigo Santoro já estava no sertão baiano para, com o restante do elenco que compõe o núcleo familiar, participar do denominado ´laboratório´. A rotina foi árdua, bem semelhante à que os sertanejos enfrentam no dia-a-dia. "Acordávamos às 6 horas, cortávamos cana, pegávamos sol, trabalhávamos braçalmente. Perdi oito quilos", detalha. "Eu tive de apagar o Rodrigo urbano e mergulhar em outro universo; foram experiências que me permitiram sentir o personagem." Inspirado na obra do escritor albanês Ismail Kadaré, Abril é um épico que envolve, entre outros temas, luta de terras entre duas famílias e código de honra. "Mas, acima de tudo, é o amor incondicional entre dois irmãos." Tonho tem de vingar a morte do irmão e, a partir do momento que fizer isso, estará marcado para morrer. "Ele tem uma trégua de 28 dias. E o filme mostra esses 28 dias." O papel na produção de Walter Salles veio com a repercussão de seu desempenho em Bicho de Sete Cabeças. Sem essa primeira oportunidade de demonstrar o talento, dificilmente passaria pela cabeça de Waltinho chamar um ator como Rodrigo Santoro, marcado pelo estereótipo de galã, para interpretar um personagem denso, nos moldes de Tonho. Vários atores passaram pelo crivo do diretor. Ficou Santoro. Quando o assunto é Bicho de Sete Cabeças, ele faz questão de creditar os méritos pelo convite de Laís Bodanzky ao veterano Paulo Autran. "Na época, nós dois estávamos na minissérie Hilda Furacão. A Laís deu o roteiro para ele ler e Paulo Autran me indicou", recorda. "Eu não conhecia o trabalho da Laís, mas logo confiei nela. Eu poderia ter colocado tudo a perder." Nascido em Petrópolis, no Rio, Rodrito Santoro, que tem 26 anos, largou a faculdade de Jornalismo da PUC/RJ para seguir a carreira artística. É contratado pela Rede Globo pelos próximos dois anos. Por enquanto, não tem nenhuma novela em vista. A última de que participou foi Estrela Guia, exibida no ano passado, na pele do vilão. Antes disso, esteve em Pátria Minha (1994) - sua estréia na telinha -, Explode Coração (1995), O Amor Está no Ar (1997) e Suave Veneno (1999), além do papel de Frei Malthus, em Hilda Furacão. Já dublou a voz do ratinho Pequeno Stuart Little no cinema e foi D´Artagnan no teatro. Hoje, acumula seis prêmios pela atuação no Bicho e está analisando projetos cinematográficos e teatrais.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.