Projeto propõe reflexão sobre uso do cinema em sala de aula

Ciranda de Filmes vai reunir diretores e educadores e mostrar mais de 30 filmes

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Se o Espaço, hoje Itaú, de Cinema nasceu de um sonho de cinéfilo de Adhemar Oliveira, pode-se dizer que, paralelamente à história do conjunto de salas que já se alastrou pelo País, surgiu uma outra história. Companheira de Adhemar, Patricia Durães dedicou-se a conciliar as vocações de educadora e cinéfila. E desenvolveu projetos como Escola no Cinema e Clube do Professor.

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O cinema vai à escola e forma plateias. O professor aperfeiçoa-se e usa a ferramenta do cinema para estimular o debate na sala de aula. Com o objetivo declarado de inspirar a reflexão de educadores, pais e interessados na infância e na educação, Patricia Durães lança agora a 1.ª Ciranda de Filmes. Ela vai ocorrer de segunda, dia 31, a quinta, 3 de abril, exclusivamente nas duas salas do Cine Livraria Cultura, com patrocínio dos institutos Alana e Península.

Interessados em participar podem se preparar. Será uma verdadeira maratona, com a exibição de 30 filmes, entre curtas e longas, e a realização de numerosos debates entre diretores e educadores. Dada a exiguidade das datas – quatro dias, apenas –, cada programa será exibido apenas uma vez. O evento tem curadoria de Patrícia e da cineasta Fernanda Heinz Figueiredo. Divide-se em três eixos principais – Nascimento e Infância, Espaços de Aprendizagem e Movimentos de Transformação. 

O nome ‘ciranda’ privilegia o aspecto lúdico da programação. Designa cantiga e dança infantil, de roda. Os filmes, nacionais e estrangeiros, representam o Brasil (claro) e também EUA, Argentina, França, Suíça e Venezuela. De cara, há uma atração imperdível. Em 1953, um trio de norte-americanos – Ray Ashley, Morris Engel e Ruth Orkin – fez um filme que rapidamente adquiriu a reputação de cult. Chama-se The Little Fugitive, O Pequeno Fugitivo.

André Bazin, cuja coletânea de ensaios O Que É o Cinema? só seria publicada após sua morte, em 1957, escreveu um belo texto vinculando o experimento dos diretores independentes de Nova York ao neorrealismo. François Truffaut, quando ainda era crítico, tomou-se de amores pelo filme. Pode-se dizer, sem exagero, que sem a saga do pequeno Joey, talvez não tivesse havido Os Incompreendidos/Les Quatre-Cents Coups, que ele fez em 1959. Será mera coincidência que O Pequeno Fugitivo tenha sido realizado no mesmo ano do mítico Shane, Os Brutos Também Amam, de George Stevens?

Em ambos, o protagonista chama-se Joey – no western clássico de Stevens, é interpretado por Brandon De Wilde; no filme de Ashley, Engel e Orkin, por Richie Andrusco. Nos dois filmes, a cultura do western é muito forte. Andrusco vive brincando de atirar. Como é muito pequeno, isso termina por irritar o irmão, um pouco mais velho, e os amigos dele, que simulam um acidente. Andrusco, casualmente, teria matado o irmão com um tiro. O menino foge, para desespero do irmão, a quem a mãe, precisando se ausentar, confiou sua guarda.

Joey passa um dia e uma noite perambulando na praia, em Coney Island, justamente onde o irmão queria ir. O filme é só isso – uma montagem paralela dos dois irmãos, um na praia, outro confinado no apartamento. Só isso? Jean-Luc Godard disse certa vez que toda ficção carrega um documentário. Independentemente da trama, todo filme espelha sempre a época em que foi feito. Isso é particularmente verdadeiro para O Pequeno Fugitivo. Você vai assistir, talvez, ao mais completo e impressionante da vida de classe média norte-americana na primeira metade dos anos 1950, antes da eclosão do rock’n’roll.

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O Pequeno Fugitivo foi (re)lançado na França pela Carlota. Adquirido para o Brasil, vai entrar em cartaz só em julho, após a Copa. Se você for cinéfilo de carteirinha, não vai querer esperar mais de três meses, mas, como se trata de apenas uma sessão, é bom não vacilar. Em cada bloco em que foi dividido o evento, existem filmes merecedores de atenção. Em Nascimento e Infância, sobre as etapas do desenvolvimento da criança, é bom ficar atento a Bebês, que acompanha quatro recém-nascidos em diferentes países. Espaços de Aprendizagem e Educação coloca a criança em contato com a família, a escola. Destacam-se os nacionais Vocacional, de Toni Venturi, e O Menino e o Mundo, de Alê Abreu.

Movimentos de Transformação busca novos significados nas relações familiares e institucionais. Confira o argentino La Educación Prohibida. E convém não perder também Sementes do Nosso Quintal, da cocuradora Fernanda Heinz. O longa em que a diretora viaja nas lembranças do quintal da avó desencadeou debate em festival de educação da França.

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