Prêmios, política e improviso: é o final da Mostra

Ônibus 174 venceu o troféu Bandeira Paulista na categoria documentário. Entre as ficções, Bhaman Ghobadi conseguiu seu segundo prêmio no evento, por Exílio no Iraque. Manifestações políticas e surpresas da organização marcaram a cerimônia

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Por Agencia Estado
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Robert Manthoulis é um diretor greco-francês que foi jurado da 26.ª Mostra BR de Cinema - Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Foi quem entregou o prêmio de melhor documentário, na cerimônia de encerramento, realizada na quinta à noite, no Unibanco Arteplex. Não deixou por menos: tendo trabalhado durante grande parte de sua carreira como documentarista, Manthoulis disse que estava feliz de poder entregar o troféu Bandeira Paulista a um filme excepcional, "o mais documentário dos documentários", Ônibus 174. Subiu ao palco o diretor José Padilha, único brasileiro indicado pelo público, na categoria. Padilha declarou-se lisonjeado, mas espera que nunca mais possa ser feito um filme como o dele, "porque a tragédia do ônibus 174 não pode nem deve se repetir". O divertido é que outro jurado, Ugo Giorgetti, ao traduzir a fala de Manthoulis chamou o ônibus de 147. Karim Ainouz também subiu ao palco para receber a Bandeira Paulista especial que o júri deu a Lázaro Ramos, por seu papel como Madame Satã, no filme de mesmo nome. Ainouz lembrou que, como cinéfilo, sempre foi um freqüentador da mostra e, assim, era com muita emoção que aceitava o prêmio de melhor ator para o intérprete do primeiro longa por ele realizado. Explicou que Ramos estava no Rio, porque participa atualmente de uma montagem teatral, mas passou o recado do ator: é o primeiro prêmio que ele ganha e por um papel difícil como o de João Francisco dos Santos, na fase em que ele ainda criava uma persona para virar o lendário malandro da Lapa. Ainouz acrescentou que Ramos faz aniversário hoje, o que fez com que o prêmio do júri fosse um presente antecipado - e merecido, acrescente-se - para o ator talentoso. Faltava ainda o prêmio de melhor ficção e o júri - formado pelos diretores Manthoulis, Silvio Soldini, Ugo Giorgetti e Radu Mihaileanou, pela atriz, jornalista e, em breve, diretora Nelofar Pazira, pelo autor, cantor e compositor Georges Moustaki e pelo ex-diretor do Festival de São Francisco, Peter Scarlet - atribuiu-o, por unanimidade, a Exílio no Iraque, do iraniano Bhaman Ghobadi. O troféu Bandeira Paulista premia diretores estreantes até o segundo filme. Ghobadi já entrou para a história da mostra porque havia recebido, há dois anos, seu primeiro Bandeira Paulista por Tempo de Embebedar Cavalos. O novo filme é "quase" tão bom quanto o anterior. Foi, como sempre, uma comédia de erros. Leon Cakoff e Renata de Almeida, ele fundador, ela, sua parceira na mostra e na vida, recusam-se a profissionalizar a cerimônia de premiação. O que se perde em eficiência e timing ganha-se em espontaneidade. Assim, Hector Babenco foi chamado - "de surpresa" - para entregar o prêmio da crítica de melhor documentário para Edifício Master, de Eduardo Coutinho. A surpresa pegou Babenco totalmente desprevenido. Ele estava sentado nas últimas fileiras da sala 1, que possui aquela subida íngreme. Babenco demorou para descer e provocou risadas do público porque, à medida em que descia, ia dizendo: "Se soubesse, Leon, teria sentado mais em baixo..." O casal também se referiu mais de uma vez à própria mostra como sendo de número 20. Outro prêmio da crítica - melhor ficção para Kedma, de Amos Gitai - originou um desses momentos cujo significado é imenso. Como Gitai não estava presente, subiu ao palco a executiva da empresa produtora francesa MK2, Rengameh Panahi. Cakoff apresentou-a como a mulher que ajudou a produzir grandes filmes de Abbas Kiarostami, Jafar Panahi e, naturalmente, Gitai. Rengameh é iraniana. Recebeu o prêmio em nome de um diretor israelense que critica duramente a situação no Oriente Médio. "A mostra é isso mesmo: representa o território sem fronteiras do cinema", disse Cakoff, muito aplaudido pelo público. Houve, ainda, um prêmio de revelação da crítica para Japón, do mexicano Carlos Reygada, um filme verdadeiramente ótimo e que confirma a vitalidade do novo cinema mexicano. O público também deu seus prêmios: melhor documentário para o vigoroso Jogando Boliche por Columbine, de Michael Moore, melhor ficção para o sentimental, mas cativante, O Filho da Noiva, do argentino Juan José Campanella, que concorreu ao Oscar de melhor filme estrangeiro da mostra, e melhor ficção brasileira para Cama de Gato, de Alexandre Stockler. Justamente o público. Representando a massa de espectadores que larga tudo para seguir a maratona da mostra - que este ano exibiu 319 filmes em duas semanas -, Dona Néti pediu para subir ao palco. Há 26 anos ela freqüenta a mostra e leva o número de assinante número 1 por sua constância e fidelidade ao invento de Cakoff. Dona Néti fez um agradecimernto em nome do público. Disse que, ao longo destes anos, formou-se um grupo de amigos, em torno de 50 pessoas, que se reúne para discutir a mostra e seus filmes. O agradecimento era em nome deles e de todo o público: "Mesmo se a gente fosse aos maiores festivais do mundo não teria tanta chance de ver bons filmes como os que vocês nos oferecem aqui." A mostra prossegue até dia 7 em três salas, reprisando os vencedores do júri, da crítica e do público.

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