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Premiado em Veneza, barrado no Brasil

Diretor iraniano Jafar Panahi, de O Balão Branco e O Círculo, viria participar como convidado de honra da 24ª Mostra de SP, mas teve seu pedido de visto negado

Por Agencia Estado
Atualização:

Nem nos anos de chumbo do regime militar Leon Cakoff viveu situação parecida. O organizador da Mostra Internacional de Cinema São Paulo estava hoje indignado com o governo brasileiro. O Itamaraty negou o visto de entrada no País ao cineasta iraniano Jafar Panahi. O diretor de O Círculo deveria embarcar amanhã em Teerã para o Brasil. É convidado de honra da 24.ª Mostra, que começou ontem (18) para convidados, com a exibição do filme de Manoel de Oliveira, Palavra e Utopia. Ele viria para a exibição especial do seu filme premiado com o Leão de Ouro no recente Festival de Veneza e também para participar de uma mesa-redonda sobre o cinema iraniano, no dia 27. Os problemas com o visto de Panahi começaram ainda em setembro. Ele tentou consegui-lo no consulado do Brasil em Teerã. Foi-lhe negado. A mostra encaminhou solicitação à Divisão de Difusão Cultural do Itamaraty. O conselheiro Cícero Martins Garcia disse que encaminhou o pedido à Divisão de Imigração, que é quem se encarrega de vistos. Nessa divisão, o encarregado Ralph Peter Henderson ficou quase a tarde inteira incomunicável. No fim do dia, retornou a ligação e perguntou se o repórter sabia o que era ba´hai. Referia-se à religião fundada no Irã, no século passado, e que enfatiza a união espiritual da humanidade. Henderson disse que seu filho estuda numa escola ba´hai e que os ba´hais são perseguidos e assassinados pelo governo iraniano. Perguntou ao repórter se achava mesmo que deveria ser concedido visto para entrar no Brasil a um cineasta que pertence a um país que trata dessa maneira suas minorias. De qualquer maneira, acrescentou que a autorização havia sido enviada ao consulado. Para certificar-se, ligou para Teerã e tirou o cônsul da cama (já era de madrugada no Irã), exortando-o a facilitar não só o visto, mas também as condições para o embarque de Panahi. Para o Ministério das Relações Exteriores, isso elimina o problema, mas não para o organizador da Mostra. "Amanhã (sexta no Brasil) já é sábado no Irã; é o dia santo deles e se Panahi não recebeu o visto a tempo não poderá embarcar; aí o caso estará criado e será uma vergonha para o governo FHC, proibir a entrada no País de um cineasta que acaba de receber a consagração de um dos maiores festivais do mundo." Panahi, considerado um humanista, é um dos grandes diretores do Irã. Já esteve no Brasil, mais exatamente em São Paulo, participando como jurado da Mostra de 1998. Seus filmes O Balão Branco e O Espelho fizeram grande sucesso de crítica no País e adquiriram um público cativo pela maneira como utilizam a inocência do olhar de crianças para criticar a sociedade iraniana. Em O Círculo, ele discute a condição da mulher na sociedade muçulmana, denunciando a prisão sem barras em que vivem segregadas as mulheres de seu país. Isso lhe valeu não poucos problemas com as autoridades iranianas, que o acusaram de querer manchar a imagem do país.

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