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"O Último Beijo" ri do medo de amadurecer

Filme de Gabriele Muccino, em cartaz nos cinemas, fala do receio de envelhecer, tanto para uma avó de 50 anos como para um pai de primeira viagem que se apaixona por uma colegial

Por Agencia Estado
Atualização:

À maneira das comédias de Dino Risi, também O Último Beijo, de Gabriele Muccino, reserva ao espectador um riso amargo. Claro, é possível rir das confusões amorosas dos personagens. Mas também não é fácil esquecer que o que se passa na tela poderia muito bem estar acontecendo com qualquer um de nós. E então a coisa não seria tão engraçada assim. Longe de ser uma desvantagem, essa é a característica que humaniza o filme, o torna mais inteligente e próximo do espectador. Segundo o próprio diretor (figura em geral menos indicada para comentar o próprio filme), O Último Beijo, fala do medo do amadurecimento. De fato, é em torno desse receio moderno que se orientam as diversas histórias vistas na tela. Anna (Stefania Sandrelli) vê com pavor a chegada dos 50 anos. Para completar, será avó em breve. A filha de Anna está grávida, mas o marido dela resolve iniciar caso com uma ninfeta inacreditável. Seus amigos, todos na faixa dos 30, também sentem-se mal. Contestadores na juventude, encontram dificuldades em trabalhar dentro do "sistema" (lembra-se do termo?) Enfim, há muito de verdade em tudo isso. Dificilmente alguém vive em paz com a idade que tem e a ocorrência de crises sucessivas ao longo da vida é testemunho disso. Passa-se da insegurança da adolescência para o mal-estar competitivo da vida adulta. A chegada dos 30 acende o sinal de alerta e começam os balanços. Balanço de vida, bom lembrar, costuma dar no vermelho. Depois vêm os 40. E os 50, como os de Anna, avisam que já é difícil recuperar o passado e o tempo perdido. Nada disso é novidade e o homem é mesmo um ser jogado no tempo como dizia o velho Heidegger, que dessas coisas entendia. Novo, talvez, seja esse prolongamento artificial da adolescência, batizado com o nome de Síndrome de Peter Pan. Na sociedade do espetáculo valoriza-se demais a imagem e portanto a juventude. Logo, ninguém quer envelhecer. Como isso é impossível, já que a fonte da eterna juventude não foi inventada, faz-se de tudo para parecer jovem. Da plástica ao Botox, passando pelos cremes em geral e, no plano comportamental, sendo-se irresponsável até os 30 ou um pouquinho mais. Por isso parece patético, em O Último Beijo, aqueles três marmanjos comprando um velho trailer para a aventura na África que deveriam ter feito aos 18 anos. É apenas risível que o homem casado com a mulher que espera o primeiro filho se apaixone pela garotinha do colegial e ponha tudo a perder. Risível, mas tão humano, em especial quando sê a atriz que faz a teenager, Martina Stella, no papel de Francesca. Também é triste ver a Anna de Stefania Sandrelli, tão insatisfeita com seu casamento quanto apavorada com a idade e a perspectiva de ser avó, buscar um antigo amor, interpretado por Sergio Castellito. No desespero, ela percebe que não se recupera o tempo de maneira artificial. O que passou, passou, mas não é fácil admitir. A vantagem de O Último Beijo é atravessar todas essas contingências humanas com leveza. Dá para rir delas porque afinal tudo o que lá acontece é da vida e não existe alternativa senão enfrentar os fatos. E se rir não for mesmo o melhor remédio, como se afirmava naquela antiga seção do Reader´s Digest, pelo menos é o único conhecido. E não tem contra-indicações.

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