PUBLICIDADE

O furor barroco na tela de Ana Carolina

Gregório de Mattos, conhecido como Boca do Inferno é tema do documentário de Ana Carolina que estréia nesta sexta, com Waly Salomão no papel do poeta

Por Agencia Estado
Atualização:

É um dilema dos documentários ou dos filmes que contam vida de gente famosa. Podem optar pelo "realismo", que reconstuiria de maneira factual a vida dos biografados. Ou pode usar de outros recursos em busca não tanto dos fatos mas do sentido dessas vidas. Em Gregório de Mattos Ana Carolina optou pela segunda alternativa. Assim, é provável que o espectador que nada saiba sobre os acontecimentos da vida do poeta seiscentista baiano saia do cinema na mesma ignorância. Mas é provável que esse mesmo espectador leve consigo algo do sabor da poesia de Mattos. E talvez procure um livro para tentar descobrir o que é que o baiano tinha. Waly Salomão faz o papel principal. Aliás, declama o papel principal, já que não há praticamente diálogos - estes são substituídos pelos versos do poeta. Waly está bem no papel. Perde algo do ritmo, aqui e ali, mas como também é poeta - e barroco, à sua maneira - se recupera com uma atuação já qualificada de "glauberiana". Glauber não foi ator - só teve papéis em O Rei dos Milagres, de Joel Barcellos, e em Vent d´Est, de Jean-Luc Godard. Mas supõe-se que, caso tivesse sido seria ator como Waly. Ou como Waly travestido de Gregório de Mattos: incisivo, loucão, desbocado. Barroco, enfim. Mattos não ganhou o apelido de Boca do Inferno por acaso. Com seus versos e sátiras atormentava poderosos e testava os limites da pornografia. Dizia que a Bahia podia ser definida por dois verbos iniciados pela letra efe, sendo um deles "furtar". A língua, e a pena, ferinas, não lhes saíram de graça. Teve problemas com a autoridade e precisou exilar-se. É um símbolo da liberdade, que a ninguém é dada de graça, como se costuma dizer. E também se presta como poucos a representante da alegria de viver, do sabor e da luxúria de existir. Seria demais esperar que tudo isso estivesse contido no filme de Ana Carolina. Mas parte dessa energia vital está lá, sem dúvida. Serviço - Gregório de Mattos. Drama. Dir. Ana Carolina. Br/2001. Dur. 72 min. 16 anos.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.