'O Escafandro e a Borboleta' é drama real de jornalista

Longa traz drama de editor que, mesmo com dificuldades físicas graves, escreve livro de memórias

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Por Alysson Oliveira e da Reuters
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O ano era 1995, e Jean-Dominique Bauby, um jornalista de renome. Editor da revista Elle, era influente e vivia cercado de belas mulheres. Até o dia em que sofreu um AVC e ficou preso a uma condição extremamente rara conhecida como "locked-in syndrome", também chamada de síndrome do encarceramento. Veja também: Trailer de 'O Escafandro e a Borboleta'  Trailer de 'O Balão Vermelho' e 'O Cavalo Branco'  Seu corpo perdeu quase todos os movimentos, embora sua mente funcionasse perfeitamente. A única coisa que podia fazer era piscar o olho esquerdo. Ainda assim, com a ajuda de uma secretária e de um método especial de comunicação, Bauby escreveu um livro de memórias que serviu de base para O Escafandro e a Borboleta, que estréia em circuito nacional nesta sexta-feira, 4. No início, vemos o mundo pelos olhos do jornalista que acaba de acordar sem saber de sua condição. Ou seja, são médicos, enfermeiras, imagens borradas, nada muito definido. Aos poucos, conforme ele recobra a consciência e os médicos diagnosticam seu problema, uma terapeuta começa a trabalhar uma forma de comunicação. Ela desenvolve uma placa com as letras do alfabeto, vai falando uma a uma e ele pisca para confirmar as palavras que deseja, letra por letra. Dirigido por Julian Schnabel, o filme ganhou prêmio de direção em Cannes e Globo de Ouro no ano passado, além de uma indicação ao Oscar nessa categoria. Bon vivant, Bauby (Mathieu Amalric, de Munique) não ligava muito para a ex-mulher, Céline (Emmanuelle Seigner), e os três filhos pequenos. Sempre cínico, seu estado de espírito não muda depois da paralisia. Ele nunca demonstra pena de si mesmo. Quando um amigo comenta que a mais nova fofoca dos cafés parisienses é que "Jean-Dominique virou um vegetal", ele próprio se pergunta "de que tipo? Uma cenoura? Um picles?". Aos poucos, O Escafandro e a Borboleta deixa claro que o personagem conserva intacta sua inteligência, apesar da extrema limitação de sua condição física. O título, na verdade, reflete a contradição de seu estado. Seu corpo pesado e inerte, tal qual um escafandro, sempre depende da ajuda dos outros. Enquanto isso, sua mente pode voar como uma borboleta, para o passado ou até lugares que ele não conhece. Schnabel, que já foi artista plástico, usa seu senso visual para criar imagens que muitas vezes rompem a fronteira entre o real e o onírico. Contando com a fotografia do experiente Janusz Kaminski (de Munique), o diretor é capaz de transformar imagens em experiências sensoriais. Por isso, cores e texturas são de extrema importância, assim como a trilha sonora, que conta com U2, Tom Waits e Lou Reed. Esse é o terceiro filme do diretor, que sempre contou histórias de pessoas reais. Basquiat, do filme homônimo, foi um pintor marginalizado; Reinaldo Arenas, um poeta homossexual na Cuba comunista em Antes do Anoitecer. Bauby poderia fugir desse paradigma não fosse pela opção que fez pela vida, apesar de todas as suas angústias - ele mesmo, pensa, no princípio, que morrer seria a melhor solução. Com roteiro assinado por Ronald Harwood, O Escafandro e a Borboleta tenta fugir da previsibilidade ou do sentimentalismo muitas vezes associados a este tipo de tema. O resultado é um filme sensorial, que, como o livro de Bauby, é uma homenagem ao poder da imaginação e à escolha pela vida.

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