"O Céu de Suely" mostra o Nordeste sem clichês

O filme brasileiro em Veneza, de Karim Aïnouz ("Madame Satã"), teve casa cheia na projeção, agradou e proporcionou um debate interessante

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Por Agencia Estado
Atualização:

Apesar da ausência de repercussão na mídia (não saiu nenhuma resenha sobre o filme), Karim Aïnouz não pode se queixar da trajetória de "O Céu de Suely" no Festival de Veneza. Quanto à ausência de críticas não há nada que estranhar - é desse jeito mesmo. "Suely" está numa mostra secundária (Horizontes) e em Veneza repercutem os concorrentes ao Leão de Ouro e filme americano, qualquer um, cujos produtores espertamente, mandam todas as suas estrelas ao Lido. Feita essa ressalva, deve-se dizer que "O Céu de Suely" teve casa cheia na projeção, agradou e proporcionou um debate interessante com os jornalistas locais. Havia pelo menos 60 pessoas na sala reservada às coletivas e Karim e a atriz Hermila Guedes não tiveram tempo de responder a todas as perguntas. Karim explicou uma das melhores características do seu filme, a ausência de clichês sobre o Nordeste. "Acho que esse é um traço do meu filme e de outros que estão sendo feitos no Brasil, e isso se deve ao fato de que são filmes feitos no Nordeste e não sobre o Nordeste." Quer dizer, são, cada vez mais nordestinos fazendo filme sobre a sua região, como o próprio Karim, Marcelo Gomes, Lírio Ferreira, Paulo Caldas, Cláudio Assis e outros. Uma cinematografia nordestina para valer e não o Nordeste como ambientação para cineastas do Sudeste, que pouco o conhecem. Essa autenticidade passa não apenas pela mão do diretor, mas pelo elenco formado por nordestinos como Hermila Guedes e João Miguel, e também pelo elenco de apoio, que inclui moradores da região. "Passamos dois meses lá e usamos muitos tipos locais, além de darmos aos personagens os seus nomes reais, o que criou mais intimidade entre o elenco e o diretor", disse. Como o filme é uma co-produção entre Brasil e Alemanha, Karim teve de explicar como conciliar países tão diferentes. "Há um clima de trocas entre os cinemas mundiais, uma curiosidade recíproca que beneficia esse tipo de intercâmbio", afirma. A estética do filme também foi debatida. Alguém lembrou de "Madame Satã", o primeiro longa de Karim, e lhe pediu uma comparação. "Satã é filmado muito junto ao corpo do personagem, tendência que mantenho agora, mas de outra forma." Segundo o diretor, essa opção mais sensorial se deve ao fato de que não o interessa tanto narrativa com começo, meio e fim, mas retratos de personagens que se constroem em elipses, em pontos vazios da narrativa. "Suely/Hermila começa pequena diante da paisagem, depois seu corpo vai crescendo à medida em que se assume como personagem de si mesma, até tomar conta da tela inteira."

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