Nino Rota entregou a Fellini suas trilhas impregnadas de paixão

Além de Fellini, o italiano compôs para outros grandes cineastas como Visconti, Coppola, De Sica e Zeffirelli

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Por João Marcello Bôscoli
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Nino Rota (1911-1979) é uma caso raro. Para começar, foi um menino prodígio que deu certo. Muito certo. Não há dúvida sobre sua presença na lista dos maiores compositores de trilhas na história do cinema. Enquanto escrevo, sua música toca ao fundo e, claro, pareço estar em um filme. Além da sua capacidade sobrenatural de criar melodias assobiáveis, existe muita paixão, humor, ironia e convicção na sua obra. Só alguém muito seguro faz 11 trilhas (11 trilhas!) em um único ano – porque não dava para ouvir nada antes.

Hoje, é possível mostrar uma determinada peça ao diretor com sua sonoridade muito próxima do resultado final graças aos computadores, sintetizadores e samplers. Rota trabalhava com um piano, papel, lápis e borracha. Apresentava o tema, aprovava e marcava estúdio com a orquestra. Tudo muito caro, com pouco tempo.

Nino Rota. Magia se dá no encontro de sua música com imagens Foto: Acervo Estadão

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A técnica e a capacidade de ouvir a música escrita na partitura dentro da sua própria cabeça é uma premissa de todo grande arranjador, é fato. Ainda assim, o talento dele é comovente. A música continua tocando. Paro de escrever e busco um determinado aroma. (Não tenho certeza se incluo isso no texto. Respiro fundo. Paciência; vamos lá.) O aroma foi uma ilusão perceptiva criada por ele, por sua música.

Fellini, Visconti, Coppola, Zeffirelli e De Sica, entre muitos outros, sabiam onde encontrar essa mágica: “Liga pro Nino!”. Uma das definições de música é a tradução das emoções humanas em sons. E ele dominava esse lance. Ouvi dezenas de obras e nada é médio ou correto. Vem tudo impregnado de sentimentos e significados. 

Contudo, o mais impressionante é a química alcançada quando somada às imagens. Há momentos nos quais ele é hiperdescritivo, aprofundando as sensações de determinada cena. Em outros, leva a música para um lugar inesperado, criando uma terceira sensação.

Continuo ouvindo e escrevendo. Quem dera ligar para o Nino. Mas a gente se fala. Ele deixou dezenas de horas com mensagens musicais. E eu respondo com sorrisos, admiração, surpresa, lágrimas. Meu corpo vibra, a casa vibra. Um dia, espero, nos encontraremos.

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