Nicolas Cage estreia animação e fala sobre desejo de mudar

'Os Croods' é a primeira animação com uma família humana produzida pela DreamWorks

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Por Luiz Carlos Merten
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Em novembro, homenageado pelo Festival 4 + 1 (da Fundação Mapfre), Werner Herzog conversou com o repórter do Estado, no Rio, e fez um apaixonado elogio ao ator Nicolas Cage. Todo cinéfilo reverencia a parceria do cineasta com Klaus Kinski. Herzog ousou dizer que Cage talvez tenha sido o melhor ator com quem trabalhou.

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Em fevereiro, em Berlim, foi a vez de o próprio sobrinho de Francis Ford Coppola dar o troco. “Obrigado por compartilhar comigo a declaração de Werner. Estou buscando um projeto para trabalhar de novo com ele. Herzog e Paul Schrader são os diretores com quem mais quero trabalhar atualmente. Não quero me repetir, preciso de gente que me motive e eles possuem esse dom.” Nicolas Cage fez a confissão para o repórter no quadro das entrevistas para promover Os Croods. A primeira animação com uma família humana da DreamWorks estreou no Festival de Berlim e Cage encontrou-se com o repórter no mesmo hotel - o Adlom - em que ele entrevistou as estrelas francesas Isabelle Huppert e Catherine Deneuve.

Cada ida ao Adlom era motivo de excitação e encantamento. A entrevista com Cage foi uma surpresa. Estava bem-humorado e disposto a confidências. O filme estreia em 22 de março - num grande circuito, promete a distribuidora Fox.

Como é participar de uma animação em 3D?

Já fiz outras animações antes e Croods é a minha preferida. Não digo isso porque estamos aqui, agora, falando do filme, mas porque poucas vezes tive a impressão de estar construindo um personagem tão real. Os diretores Chris Sanders e Kirk DeMicco incorporaram tanta coisa minha ao personagem, não só a voz, que eu consigo me identificar na tela. O 3D torna a aventura maior, mas eu confesso que gosto em Croods não da dimensão épica, mas da íntima. Quando o projeto começou, era a história de dois homens na Idade da Pedra. O mais velho, eu, e um garoto que introduzia as transformações. O projeto foi mudando e virou uma história de família, cujo eixo é a relação complicada entre meu personagem, Grug, e a filha, Eep. Sou pai, também quero proteger minha família, como o personagem, mas na ficção a vida nos obriga a sair da caverna e iniciar a jornada que incorpora Guy. ‘O cara’ paquera minha filha e eu fico desconfortável, mas ele também traz as mudanças. Todo mundo conhece Os Flintstones. Nosso filme é mais complexo. É uma jornada de descoberta, durante a qual Grug se considera impotente para competir com os miolos e as novas ideias de Guy, mas termina por incorporá-las, acrescentando um toque próprio. Foi um processo longo. Fiz quatro filmes durante este, mas era sempre um prazer voltar à Idade da Pedra para reencontrar Eep, Guy e minha mulher, Ugga (Catherine Keener).

Você é muito popular no Brasil por seus filmes de ação, mas está sempre surpreendendo com suas escolhas. Por que a animação, agora?

O que você diz é a pura verdade. Fiz papéis importantes em filmes de meu tio (Francis Ford) e ganhei o Oscar com Despedida em Las Vegas (de Mike Figgis, 1995). E foi aí que comecei a desconcertar os críticos. Eles imaginavam que eu ia prosseguir nessa vertente dramática e eu me tornei herói de ação. Imagino que os críticos tenham se perguntado - o que ocorreu com esse cara, onde vamos colocá-lo? Porque a tendência é sempre colar uma etiqueta nas pessoas e colocá-las num nicho. Agora, aos 49 anos, estou mudando de novo. Não quero mais ser um herói de ação. Posso até fazer alguns papéis interessantes em thrillers. Por exemplo - O Sacrifício (de Neil LaBute, 2006) é muito melhor que o original (The Wicker Man, de 1973), mas os críticos já estavam cansados de mim e nem prestaram atenção no filme. A animação veio na hora em que estava querendo falar de família. E agora quero trabalhar de novo com autores que me motivem. Por exemplo, Werner Herzog e Paul Schrader. Não quero entrar nos 50 anos na zona de conforto. Quero interagir com gente que tenha algo a dizer e me leve a testar meus limites.

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Herzog foi homenageado no Brasil e fez grandes elogios a você. Disse que você foi o melhor ator com quem trabalhou, e olhe que ele teve aquela parceria com Klaus Kinski. Na sua masterclass, ele mostrou cenas decisivas de Bad Lieutenant, Vício Frenético, as alucinações do policial. Que lembrança você tem daquilo?

Em primeiro lugar, obrigado por compartilhar comigo o que Werner lhe disse. Fico muito lisonjeado. Já conversei com ele que precisamos encontrar um projeto para trabalhar de novo. Mas, sobre Vício Frenético, tenho de ser sincero. Me atirei no papel de uma forma muito intensa, mas também assumi, conscientemente, um risco. Achei que, para criar aquele personagem, seria interessante um toque de desmesura, ou de loucura, como Klaus (Kinski) certamente traria para o papel, se o interpretasse. Ali, na verdade, não sou eu. Estou emulando Klaus, um ator a quem sempre admirei, justamente por seus excessos.

O risco faz parte da profissão?

Da profissão, não sei. Se nós formos pensar no cinema como uma indústria, um negócio, a vontade de correr riscos é mínimas. Hollywood prefere apostar no certo, na sequência da sequência de uma franquia de sucesso. Para que correr riscos? Mas, como pessoa, como ator, chega o momento em que você se olha no espelho, como eu, agora. O que vai ser de mim, se não tiver coragem de mudar? Até que ponto o público vai querer continuar me vendo fazer sempre as mesmas coisas? Não estou renegando meus filmes, até porque acho que alguns mereciam críticas melhores do que tiveram. Todo mundo termina por projetar seus preconceitos nas coisas, e os críticos não são exceção. Depois que formam uma ideia, é difícil voltar atrás. Eu quero me dar esse direito - mudar, quantas vezes for necessário.

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E o que impulsiona esse desejo de mudança?

Tenho um filho com mais de 20 anos (Weston Coppola Cage) e outro que vai fazer 8 anos (Kal-El Coppola Cage). Amo os dois, mas é diferente ter um filho aos 20 e poucos anos e outro aos 40, quando você já está mais maduro. Essa coisa de maturidade é muito relativa, esquisita mesmo. Tem gente que pode chegar aos 80 imatura, mas tive e continuo tendo encontros importantes em minha vida, gente que tem estimulado minha reflexão. Sinto que hoje sou um pai melhor, mais consciente, e isso termina por se expandir para toda a minha vida, não só a familiar.

Você fala de O Sacrifício como um filme que não teve críticas à altura, mas vou lhe fazer uma confissão - revejo sempre na TV paga Aprendiz de Feiticeiro, que é um filme que me dá muito prazer de assistir. É um dos meus prazeres culpados. O que você pensa disso?

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Que sou mais culpado ainda, porque o fiz (risos). Mas fico contente que você diga isso. Tive imenso prazer em fazer Aprendiz de Feiticeiro e gosto do que vejo na tela, mas o filme não foi bem, de público nem de crítica. Tem fantasia e, ao mesmo tempo, fala do aprendizado, do rito de passagem e da nova maturidade que a gente adquire, ou não, na vida. Sempre me admirei muito que as pessoas não levem essas coisas a sério, se o filme tiver efeitos ou for de aventuras. O preconceito é uma coisa que empobrece.

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