
02 de julho de 2014 | 16h05
O cineasta mineiro-carioca Neville D'Almeida tem trajetória paradoxal. Autor de filmes experimentais no início da carreira, assina também alguns dos grandes sucessos de bilheteria da época da Embrafilme. Esse autor ganha retrospectiva no Centro Cultural Banco do Brasil, a partir desta quarta-feira, 2, a 20 de julho. Na mostra Neville D'Almeida - Cronista da Beleza e do Caos serão exibidos 12 longas e 12 curtas do diretor, selecionados pelo crítico carioca Mário Abbade.
O público poderá conferir o vanguardista Jardim de Guerra (1970), sem os cortes impostos pela censura na época da ditadura. Na mesma linha, o raro Mangue-Bangue, lançado em 1973 em Nova York, em cópia recuperada apenas em 2010. São amostras do diálogo de Neville com o cinema de vanguarda, com interseções com o trabalho de Hélio Oiticica, com quem conviveu nos Estados Unidos na época mais brava da ditadura brasileira.
Era uma época convulsiva e a contestação ao regime militar se fazia, também, pela via da contracultura, caminho alternativo ao da esquerda tradicional. Esses filmes têm não apenas interesse em si mesmos, enquanto obras cinematográficas, mas são preciosos documentos de época e de determinada sensibilidade, tanto artística quanto política e existencial.
Há um salto para outra etapa quando Neville aborda o universo de Nelson Rodrigues em adaptações como A Dama do Lotação (1978) e Os Sete Gatinhos (1980). Produzidos na época de ouro da Embrafilme, fizeram imenso sucesso. Dama do Lotação, que se aproveita da beleza de Sonia Braga para estourar nas bilheterias, é, até hoje, o terceiro maior público do cinema nacional, perdendo apenas para Tropa de Elite 2 e Dona Flor e seus Dois Maridos.
Não apenas de Nelson Rodrigues viveu Neville nessa descida ao basfond da sociedade brasileira. Adaptou também outro maldito, o dramaturgo santista Plínio Marcos, com a versão da peça Navalha na Carne. Produção de 1997, com Vera Fisher como a prostituta Neusa Suely e o cubano Jorge Perrugoría no papel do seu cafetão, teve participação polêmica no Festival de Brasília.
Há controvérsias críticas a respeito da leitura do universo de Nelson Rodrigues proposta por Neville. Ao paroxismo do dramaturgo, ele acrescenta outro tanto, tornando-se indigesto para certo tipo de espectador, mas bastante palatável para outros. O fato é que se encontram nessas versões laivos da vocação inicial de Neville, que flerta com a estética do exagero da contracultura e do assim chamado "cinema marginal" brasileiro.
Tanto assim que ele resolveu refilmar um dos clássicos dessa filmografia - Matou a Família e Foi ao Cinema, de Julio Bressane, de 1968, refeito por Neville em 1991, em plena era Fernando Collor. O remake, com Claudia Raia como protagonista, foi exibido no politizado Festival de Brasília e levou uma vaia histórica no ambiente oposicionista do Cine Brasília.
Assim é o cinema de Neville, sempre mais disposto a provocar que a buscar algum tipo de equilíbrio ou serenidade estética. Propõe caminhos, embora nem sempre sejam os melhores, embora tudo isso seja juízo de valor. Mas preocupa-se em estar na crista das discussões, o que é um mérito em si. Foi assim com outro dos seus títulos polêmicos, Rio Babilônia (1982), com algumas cenas de sexo explícito (nada gratuitas), e tido como visão precursora da violência urbana brasileira. O filme, na época, provocou intenso debate.
Controverso, amante da polêmica e do debate acalorado, Neville é um artista a ser discutido. O debate com ele será dia 17, às 20h, com participação do jornalista José Carlos Vieira e do curador Mário Abbade.
Veja a programação:
2/7 - quarta
18h30 - Cosmo Cápsula (curta) / Jardim de Guerra (16 anos) 90 min
20h30 - Mangue-Bangue (18 anos) 55 min
3/7 - quinta
18h30 - Boa Noite Cinderela (curta) / A Dama do Lotação (18 anos) 96 min
20h50 - Os Sete Gatinhos (18 anos) 109 min
4/7 - sexta
18h30 - Areias Escaldantes (14 anos) 100 min
20h30 - A Água, A Mulher e O Regador (curta) / Rio Babilônia (18 anos) 109 min
5/7 - sábado
18h30 - Acquawater (curta) / Matou a Família e foi ao Cinema (18 anos) 110 min
20h50 - Navalha na Carne (18 anos) 125 min
6/7 - domingo
16h30 - Neto Vida Ernesto (curta) / Música para Sempre (14 anos) 90 min
18h30 - Hoje é dia de Rock (14 anos) 54 min
7/7 - segunda
18h30 - Verde Moreno (curta) / Planeta Gigóia (curta) / Encontro Amazônico (14 anos) 60 min
20h - Maksuara %u2013 Crepúsculo dos deuses (14 anos) 75 min
9/7 - quarta
18h30 - Cosmo Cápsula (curta) / Mangue-Bangue (18 anos) 55 min
20h - Jardim de Guerra (16 anos) 90 min
10/7 - quinta
18h30 - Boa Noite Cinderela (curta) / Os Sete Gatinhos (18 anos) 109 min
21h - A Dama do Lotação (18 anos) 96 min
11/7 - sexta
18h30 - Areias Escaldantes (14 anos) 100 min
20h30 - A Água, A Mulher e O Regador (curta) / Rio Babilônia (18 anos) 109 min
12/7 - sábado
18h30 - Acquawater (curta) / Navalha na Carne (18 anos) 125 min
21h - Matou a Família e foi ao Cinema (18 anos) 110 min
13/7 - domingo
16h30 - A Voz do Provocador %u2013 Parte 1 %u2013 Os Artísticos (curta) / Hoje é dia de Rock (14 anos) 54 min
17h50 - Música para Sempre (14 anos) 90 min
14/7 - segunda
18h30 - A Voz do Provocador %u2013 Parte 2 %u2013 O Ouro Roubado (curta) / O Provocador %u2013 Internacionalização da Amozônia (curta) / Maksuara %u2013 Crepúsculo dos deuses (14 anos) 75 min
20h20 - Encontro Amazônico (14 anos) 60 miM
16/7 - quarta
18h30 - Cosmo Cápsula (curta) / Jardim de Guerra (16 anos) 90 min
20h30 - Mangue-Bangue (18 anos) 55 min
17/7 - quinta
18h - A Água, A Mulher e O Regador (curta) / Rio Babilônia (18 anos) 109 min
20h - Debate com o cineasta Neville D%u2019Almeida, o jornalista José Carlos Vieira e com o curador Mario Abbade.
18/7 - sexta
18h30 - Boa Noite Cinderela (curta) / A Dama do Lotação (18 anos) 96 min
20h30 - Os Sete Gatinhos (18 anos) 109 mim
19/7 - sábado
18h30 - Acquawater (curta) / Matou a Família e foi ao Cinema (18 anos) 110 min
20h50 - Navalha na carne (18 anos) 125 min
20/7 - domingo
16h30 - Neville De Bracher (curta) / Guará Ladrão de Estrelas (curta) / Jardim de Guerra (16 anos) 90 min
19h - Mangue-Bangue (18 anos) 55 mim
Serviço
Neville D'Almeida - Cronista da beleza e do caos
Quando: de 2 a 20 de julho
Onde: CCBB Brasília (SCES Trecho 2, Lote 22)
Quanto: R$ 4 (inteira) e R$ 2 (meia)
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.