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Nathalie Baye prepara volta aos palcos

Atual destaque do cinema francês, a estrela de Instituto de Beleza Vênus deve retornar ao teatro no ano que vem

Por Agencia Estado
Atualização:

Vencedora da Taça Volpi de melhor interpretação feminina do Festival de Veneza do ano passado pelo filme La Leçon de Pornographie, do belga Frédéric Fonteyne, a francesa Nathalie Baye estará de volta ao Lido no fim do mês, para participar da 57.ª Mostra d´Arte Cinematografica. O novo filme de Natalie, Selon Matthieu, de Xavier Beauvois, participa da seleção oficial deste ano e a atriz francesa - ótima - poderá repetir seu feito de 1999. Nathalie conversou na semana passada, pelo telefone, de Paris, com a reportagem. O assunto dominante foi o filme de Tonie Marshall, Instituto de Beleza Vênus, que estreou na sexta-feira e fez 5 mil espectadores no primeiro fim de semana em cartaz em São Paulo (está em quatro salas). Mas Nathalie falou também de Jean-Luc Godard, François Truffaut, os grandes diretores com quem trabalhou, e sobre o trabalho com Xavier Beauvois. Ainda não sabia que o filme iria a Veneza, mas deixou claro que adorou fazer Selon Matthieu. O filme foi rodado em outubro-novembro do ano passado, na Normandie. Nathalie tem o que chama de ligação afetiva com aquela região da França. Nasceu lá, embora seus pais sejam de Toulouse - e isso, segundo ela, explica como se pronuncia seu nome; ela esclarece que é Báie, com acento no a -, mas viveu quase toda a vida em Paris. Selon Matthieu também é interpretado por atores franceses conhecidos no país, mas praticamente ignorados no resto do mundo, como Benoît Magimel e Antoine Chappey. Magimel faz o rapaz que tenta vingar a morte do pai. A partir daí, Selon Matthieu poderia ser um thriller - eletrizante ou convencional, não importa, mas sempre um thriller policial. Não é a proposta do diretor Beauvois. Há cinco anos ele esteve em São Paulo, participando da Mostra Internacional de Cinema. Veio exibir seu filme Não se Esqueça Que Você Vai Morrer, vencedor do prêmio do júri no Festival de Cannes daquele ano. Beauvois tinha então 28 anos. Seu filme contrapunha aids e amor, era uma sombria reflexão sobre a morte como forma de entender a vida. O diretor chegou a citar seu compatriota Victor Hugo quando ele dizia que o clássico é são e o romântico, doente. Beauvois confessava-se possuído pela doença do romantismo. Isso talvez ajude a entender porque, falando sobre Selon Matthieu, Nathalie disse que é um filme forte, sobre relacionamentos. Além desse, ela tem outro filme pronto, à espera de lançamento na França. É Ça Ira mieux démain, de Jeanne Labrune, uma comédia que tem um ponto de partida meio, para não dizer totalmente, estranho - o que pode acontecer quando uma família embrulha seus móveis em plástico e os despacha para um depósito? Nathalie confessa que ainda não tem distanciamento para falar sobre esses filmes, mas adorou fazê-los. Um intenso, o outro divertido - o segundo assinalando seu reencontro com uma diretora que ela aprecia muito, Jeanne Labrune, com quem fez o inédito (no Brasil) Si Je t´Aime, Prends Moi à Toi. Para ela não faz muita diferença ser dirigida por mulheres ou homens. Adorou também Godard, Truffaut e Frédéric Fonteyne. Diz que o que faz diferença é o papel. No caso de Instituto de Beleza Vênus, diz que se trata de um papel maravilhosamente bem escrito. Foi seu segundo filme com Tonie, que, no primeiro, lhe ofereceu um papel de certa forma cômico - Les Enfants Salauds. O público gostou, os críticos gostaram razoavelmente, mas a diretora sentia que devia criar um papel melhor, para explorar o potencial de Nathalie. E escreveu, além de dirigir, claro, Instituto de Beleza Vênus. A atriz adorou criar sua personagem de mulher de 40 anos que cuida dos outros para não ter de cuidar de si mesma, como Tonie definiu a personagem. "Não me identifiquei com aquela mulher porque eu seja ela, mas porque o filme é tão bem escrito que me deu todas as informações que eu precisava para construir a personagem." Cicatriz na alma - Ela consegue entender perfeitamente esse tipo de mulher moderna, pós-feminista, decidida na hora do sexo, mas ainda confusa no plano dos sentimentos. Usa a mesma explicação da diretora Tonie Marshall - "Minha personagem carrega no coração a cicatriz que estampou no rosto do ex-marido." Acrescenta que é natural, porque ambas conversaram muito sobre a personagem, discutiram suas motivações (e vacilações) mais íntimas. O que é mais difícil para uma atriz - as cenas de sexo ou as que desnudam os sentimentos, devassam a intimidade? "Nada é difícil quando embarcamos na viagem da personagem", diz. Nathalie adora alternar trabalhos no palco e na tela. Depois dos dois filmes consecutivos, o de Jeanne Labrune e o de Xavier Beauvois, resolveu dar um tempo para reorganizar sua vida, enquanto prepara o retorno ao teatro, para o ano que vem. Não diz o que pretende fazer - "Estou com algumas idéias, um papel que explore mais minha maturidade como mulher e atriz." Diz que representar é mais do que arte ou profissão. É vício. "Vivo por esse desejo de representar; para mim, o importante, no teatro ou no cinema, é manter acesa a chama do desejo." Foi uma lição que absorveu de Truffaut, o homem que amava as mulheres, de Godard, o grande revolucionário da linguagem e da política no cinema. Reencontra esse fogo, essa paixão, no feminismo light de Tonie Marshall. "Ela fala com delicadeza e inteligência sobre a mulher de hoje", resume. Por mais talentosa que seja Tonie (e ela é talentosa, seu filme é a prova), ainda não é uma autora do porte de Godard e Truffaut e talvez nunca venha a sê-lo. Nathalie observa que só vamos saber isso com o tempo. "Quando fiz meus filmes com Godard e Truffaut, não tinha essa consciência de estar trabalhando com gênios, ou de que estivesse participando de obras que, obrigatoriamente, fariam parte da história do cinema." Insiste que essa perspectiva só vem com o recuo do tempo. "Hoje podemos dizer que eram gênios, mas naquela época?" Com Godard fez Salve-se Quem Puder (a Vida). É franca - "Gosto de alguns filmes dele, mas há alguns que simplesmente não entendo e outros que me aborrecem." No fundo, prefere Truffaut, com quem fez dois filmes - O Homem Que Amava as Mulheres e La Chambre Verte. "François era maravilhoso", conta. "Realmente amava as mulheres e sempre tentou nos oferecer papéis que expressassem não apenas esse amor, mas também a complexidade dos sentimentos e da problemática do casal." Lamenta sua morte - "Nunca saberemos o que ele ainda poderia criar; imagino quantos belos filmes deixamos de assistir com seu desaparecimento." Não lamenta só a morte de Truffaut. Vê qualquer coisa de simbólico no fato de a presença do cinema francês estar encolhendo nos mercados de todo o mundo, dominados maciça (e massivamente) pela produção de Hollywood. "O público quer diversão, mas, como atriz e espectadora, eu prefiro um tipo de cinema que faça pensar e estimule o nosso conhecimento sobre nós mesmos."

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