"Leste-Oeste" conta drama na Guerra Fria

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Por Agencia Estado
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Leste-Oeste, o Amor no Exílio, é um daqueles velhos dramas da guerra fria, só que feito atualmente, quando tudo isso já acabou, não numa explosão, mas num suspiro, como acontece com as estrelas. O diretor é francês, Régis Wargnier, o mesmo de Eu Sou o Senhor do Castelo e do (quase) bom Indochina. A mesma coisa se pode dizer de Leste-Oeste. Não se trata de filme indigno, mexe com certa sensibilidade em uma temática propícia ao maniqueísmo, e proporciona alguma emoção. Por algum motivo não convence totalmente. A história é a seguinte: Com o fim da 2.ª Guerra Mundial, Stalin convida todos os soviéticos emigrados para retornarem ao país. Promete uma vida de sonho, mas tudo não passa de armadilha como logo descobre um cientista, casado com uma francesa e com filho nascido na França, que acaba acreditando no ditador. O que se segue é aquilo previsto em todo roteiro do gênero: a mulher francesa (Sandrine Bonnaire), mesmo escolada pelas agruras da guerra, não agüenta morar numa casa de cômodos, tendo como vizinhos russos bêbados, nostálgicos e barulhentos. O marido (Oleg Menschikov) procura se acomodar à situação, mas ela não se conforma. Tenta voltar para a França e descobre que não pode sair do país. O resto será essa tentativa de fuga, levada de forma heróica por uma mulher de temperamento indomável. Catherine Deneuve entra num pequeno papel, como a artista francesa que visita a União Soviética, se apieda da conterrânea e tenta ajudá-la. Há seqüências interessantes, como aquela em que o garoto (Serguei Bodrov Jr., filho do diretor de O Prisioneiro das Montanhas) procura escapar a nado, atravessando um mar gelado em busca de terras mais civilizadas. Ou cenas de suspense, como a da chegada de Sandrine à embaixada da França, de onde poderia finalmente escapar ao inferno comunista. Colocando-se entre parênteses suas motivações mais profundas, Leste-Oeste pode até ser gostoso de assistir. Wargnier é acadêmico, ou quase. Não ousa, não subverte ou infringe códigos. Segue o manual, o que em regra dá certo, ou é suficiente para evitar o erro. Faz mais: cerca-se de bons atores, e provavelmente os dirige de forma convincente, ou pelo menos é isso o que aparece na tela. Tudo enfim, dos figurinos de época à fotografia, parece de primeira linha. O conjunto, no entanto, deixa a desejar. Não é aquele tipo de filme que cause algum tipo de frisson. Ou marque, de forma indelével, a memória do espectador. E isso porque, apesar de suas qualidades técnicas, de interpretação, etc, não diz muito bem a que veio. Ok, as novidades são difíceis e, nesta altura do campeonato, tudo parece já ter sido escrito, filmado ou cantado. Por exemplo, esse caso de gente querendo passar a cortina de ferro para conhecer ou reencontrar as delícias do mundo livre foi explorado à exaustão, pelo cinema, pela literatura de alto e baixo coturno pelos telefilmes, etc. Isso, quando havia uma justificativa política para investimento no tema. Hoje, um filme sobre os horrores da guerra fria tem tanta atualidade imediata quanto outro sobre as iniqüidades do Império Romano ou a perseguição religiosa na França medieval. A História com agá maiúsculo, é interessantíssima quando recriada com aquele vigor que relaciona fatos passados com os do presente. Leste-Oeste, infelizmente, é apenas um drama pessoal ambientado em outra época, que parece não nos dizer mais respeito. Isso porque Wargnier volta-se para a tal História com agá maiúsculo com olhos cansados de guardião de museu.

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