Joaquin Phoenix fala sobre o detetive drogado que interpreta em ‘Vício Inerente’

Filme baseado no romance homônimo do escritor Thomas Pynchon tem estreia prevista para março no Brasil

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Por Cindy Pearlman
Atualização:

Converse com atores de cinema sobre os maiores astros da atual geração e o nome de Joaquin Phoenix sempre vem à baila. Salvo, naturalmente, se você estiver falando com o próprio.

O ator de 40 anos tem uma carreira que abrange filmes de enorme sucesso e alguns alternativos bizarros, que vão desde papéis coadjuvantes até personagens principais, do descarte como “o irmãozinho de River” a três indicações ao Oscar. Joaquin tem trabalhado com alguns grandes atores, atrizes e cineastas da sua geração... e não quis falar a respeito de nenhum.

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Informal, usando jeans e T-shirt branca, com uma camisa azul flanelada, ele concedeu uma entrevista num hotel em Los Angeles, durante a qual passou a maior parte do tempo com os olhos fixados na mesa de carvalho como se um contato olho a olho pudesse revelar demais.

Quando pedimos para nos explicar sua longevidade no cinema, ele não hesitou e disse: “Sorte”. Seus fãs podem discordar. Phoenix forjou uma identidade profissional única em grande parte evitando papéis muito óbvios. E isso é tão característico dele que, num ano repleto de filmes de super-heróis e de ficção científica exagerados, seu novo filme, Vício Inerente (com previsão de estreia dia 26 de março no Brasil ), dirigido por seu amigo Paul Thomas Anderson e baseado num romance - considerado impossível de ser encenado - do enigmático escritor moderno Thomas Pynchon. 

O filme é ambientado num mundo repleto de drogas da Los Angeles dos anos 70. Phoenix interpreta Larry “Doc” Portello, um detetive drogado que investiga o desaparecimento de uma antiga namorada e trabalha com um polêmico agente da polícia de Los Angeles (Josh Brodlin) cujo apelido é “Bigfoot”.

Phoenix foi indicado para o Oscar de melhor ator pelo seu último filme com Anderson, o aclamado O Mestre, de 2012. Ele disse que aceitou o papel em Vício Inerente principalmente para trabalhar de novo com o diretor.

“Não podemos separar o trabalho de ator do diretor. Tenho tido sorte em trabalhar com grandes diretores. Às vezes, acontece de um ator transcender o diretor, mas, no geral, você é refém dele. Sei que o que acabei de dizer tem uma conotação negativa. Não é bem o que queria falar. Mas acho que, se faço um bom trabalho é por causa do diretor”, afirmou.

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E continuou: “A analogia perfeita neste caso é com o momento em que aprendi a dirigir. Meu pai me levou para um passeio de carro. Sentei-me no seu colo e ele disse: ‘dirija’. Na verdade, achei que estava conduzindo e controlando do carro, mas os dedos do meu pai estavam seguros na direção e seu pé no pedal. É a mesma coisa com Paul. Ele transmite a sensação de que você está no controle, mas é ele que está por trás de tudo. Saber disto e confiar fazem com que eu me sinta seguro em suas mãos. O que me permite tentar algumas coisas”. Outros atores também tentaram fazer algumas coisas mas nem sempre o resultado foi bom.

“Há uma cena em que eu o empurro contra uma parede que não existia”, disse Josh Brolin, em uma entrevista separada. “Ele rolou pela escada e fiquei apavorado, preocupado de que tivesse se ferido.” Phoenix não se lembra.

“Não achei que caí por uma parede. Na verdade, era um tapume de alumínio. Era uma espécie de cancela e ele me empurrou. Caí no porão e quando cheguei ao chão não fiquei abalado. Só pensei, ‘uau, uma semana de filmagem e poderei sair com alguns ossos quebrados’.”

O filme Vício Inerente reúne Phoenix e Reese Witherspoon. Os dois já tiveram indicações ao Oscar de melhor ator e melhor atriz pelas interpretações como Johnny Cash e June Carter em Johnny & June (2005). Reese conquistou o Oscar.

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“O papel ainda não fora preenchido e eu teria reconhecimento por ele”, disse o ator rindo. “Fui eu que disse, ‘que tal Reese? Ela é uma ótima atriz’. Ela chegou no set. É uma pessoa muito calma. Quando chegou, eu já estava gravando havia três semanas e ainda estava nervoso. Era o primeiro dia dela e eles estavam limpando o suor do meu rosto entre as gravações, e ela foi muito legal. Foi maravilhoso, mas frustrante.”

Quanto ao seu personagem em Vício Inerente, o ator não quis falar muito a respeito. “Não sei como eu o vejo. Nunca analiso um personagem da maneira correta. Não tenho certeza se o entendo bem. Para mim, o personagem simplesmente se torna parte da sua vida e daquilo que você está vivendo.” O que nem sempre é o caso, acrescentou.

“Quando era mais jovem, eu dizia, ‘bem, meu personagem nunca faria isto’. Procuro não pensar assim agora porque isto gera rigidez. Se você vive o tempo suficiente sabe que as pessoas fazem muitas coisas que, na sua opinião, não deveriam.” E é essa percepção do inesperado que Phoenix aspira.

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Comodismo. “Eu quero é sentir vida, dinamismo, e não a rotina. Francamente acho que é isto que vem sendo esquecido em muitos filmes. Trabalhamos em filmes e as pessoas nos dizem, ‘é assim o seu personagem’. E então ficamos aferrados àquilo. É mais divertido encontrar coisas que não estávamos esperando.”

Phoenix nasceu em San Juan, Porto Rico e cresceu em Los Angeles com os quatro irmãos e irmãs. Seus pais eram missionários e viviam um estilo de vida hippie. Chegou um momento em que Joaquin mudou seu nome para Leaf, para combinar com os nomes baseados na natureza dos seus irmãos, River, Rain, Liberty e Summer.

Toda a família Phoenix era muito criativa e atuar sempre pareceu algo natural. Todos os cinco filhos, pelo menos brevemente, atuaram. Mas River - que morreu em consequência de overdose em 1993 - e Joaquin foram os que tiveram grande sucesso.

Phoenix começou sua carreira em séries de TV - em Seven Brides for Seven Brothers (Sete noivas para sete irmãos), de 1982. Interpretou um adolescente no filme O Tiro que Não Saiu Pela Culatra (1989). Teve papéis em filmes como Um Sonho sem Limites, de 1995, Círculo de Paixões, de 1997, Gladiador, de 2000, Sinais, de 2002, Brigada 49, de 2004, Hotel Ruanda, de 2004, Johnny & June, Os Donos da Noite, de 2007, Traídos pelo Destino, de 2007, O Mestre e Ela, de 2013.

Suas três indicações ao Oscar incluem a de melhor ator por Johnny & June e depois O Mestre, e de melhor ator coadjuvante por Gladiador. Ele fez alguns filmes para o mercado de massa, mas admite que prefere filmes de menor orçamento e mais peculiares.

Limitações. “Pensei em alguns papéis do tipo super-herói. Mas ainda preciso encontrar um que tenha sentido. Obviamente filmes de grande orçamento e que exigem mais investimento têm de atrair um público mais amplo. Acho que isto limita a história que você quer contar. Não quero trabalhar desta maneira. Quero atuar em filmes em que os personagens e a história são reais, sem ficar pensando em orçamento”, comenta o ator.

“Quero que os filmes tenham sucesso o bastante que me levem a outros trabalhos. Procuro não deixar que o potencial da bilheteria afete minhas escolhas. As pessoas dizem que você tem de participar de filmes de sucesso. É tentador pensar desta maneira, mas penso mais num filme em termos de história e de diretores”, completa. 

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Joaquin Phoenix participará do próximo filme, ainda sem título, de Woody Allen, em que vai coestrelar com Emma Stone. Depois disto ainda não sabe. Mas alguma coisa deve aparecer.

“Quando surge o papel certo é impossível recusar. Mas na maior parte é um jogo de espera. Sempre invejei atores com três filmes programados. Nunca consegui isto. É difícil para mim saber o que quero fazer daqui a nove meses”, justifica.

“Gostaria de trabalhar com David Lynch. Por outro lado, penso que ainda não fiz tudo o que pretendo como ator. Não tenho certeza do que faria. Tenho apenas uma sensação do que quero realizar, não sei como me expressar, ou se contrato um roteirista para isto. “É uma ideia. E depois de todos estes filmes, ainda sinto isto.” / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO 

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