Japão traz simplicidade e emoção em dois longas exibidos no Festival de Cannes

‘An’, de Naomi Kawase, e ‘Our Little Sister’, de Hirokazu Kore-eda, falam dos acertos e erros da sociedade japonesa

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

CANNES - Edouard Waintrop, que faz a curadoria da Quinzena dos Realizadores, já disse que o melhor filme de todo o festival está na sua se(le)ção, e é Trois Souvenirs de Mon Enfance (Três Lembranças da Minha Infância), de Arnaud Desplechin. Pode até ser que isso venha a se confirmar, mas, por enquanto, nesse começo de Cannes 2015, o campeão está sendo An, de Naomi Kawase. No ano passado, ela era uma das favoritas à Palma de Ouro, mas terminou esquecida pelo júri presidido pela diretora neozelandesa Jane Campion.

Naomi agora não concorre ao prêmio maior do festival, mas, na abertura da mostra Um Certo Olhar, ganhou dez minutos de standing ovation. Ser aplaudido de pé em Cannes, e por tanto tempo, não é para todo mundo. E o curioso é que Naomi, no ano passado, na entrevista que deu por O Segredo das Águas, nada havia dito ao repórter sobre o novo filme. Nesta sexta-feira, 15, revelou – “Havia começado a filmar em abril, um mês antes de Cannes, porque precisava das cerejeiras em flor, mas ainda não era o tempo para revelar o projeto.” 

Sutilezas. Naomi Kawase (e) está em busca da simplicidade Foto: REUTERS/Yves Herman

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Pela primeira vez Naomi filma uma história que não é dela, adaptada do livro do escritor Durian Sukegawa. Um homem trabalha numa doceria. Tem essa velha funcionária que, no desenrolar da trama, descobrimos que viveu quase toda a vida, desde garota, confinada numa instituição para hansenianos. Por que o tema tão duro? “An me atraiu pelos mesmos motivos de meus filmes anteriores. Pela ligação de homens e mulheres com a natureza, por causa da dificuldade da doença. A despeito de tudo, maturidade e vida são os temas que mais me interessam”, afirmou.

O crítico do Guardian despachou An como melodramático – azar dele. Naomi reconhece, no entanto, que, sem desistir de seus grandes temas nem do estilo contemplativo, buscou uma comunicação mais direta com o público. “Antes, fazia filmes mais difíceis. Estou adquirindo a virtude da simplicidade”, brinca. 

Outro japonês, Hirokazu Kore-eda, participa da competição com Our Little Sister, um drama familiar sobre três irmãs que, após a morte do pai, convidam para viver com elas a garota que ele teve com outra mulher – uma meia-irmã. Muitos críticos, a propósito de Nobody Knows e Tal Pai Tal Filho – no ano passado –, já criaram pontes entre os filmes de Kore-eda e os do lendário Yasujiro Ozu, que também filmava as transformações da família japonesa. O próprio diretor desautoriza a comparação. Seu mestre é outro intimista, famoso pelos melodramas com retratos de mulheres – Mikio Naruse. O Japão tem estado presente nesse começo de festival – sexta, 15, no Cinema da Praia, passou Ran, o Rei Lear de Akira Kurosawa, em versão remasterizada. Só para ver ao ar livre, sob um céu de estrelas, a tomada do castelo, já teria valido a pena estar na Croisette.

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