Irmãos Coen abrem o 66º Festival de Berlim com o inteligente 'Ave, César!'

No filme, diretores exercitam gêneros e estilos diferentes

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

BERLIM - Havia sol e céu azul na quarta-feira, mas na quinta, 11, Berlim vestiu-se de cinza para a abertura da 66.ª Berlinale. O festival, que tem a fama de ser o mais politizado do planeta, começou com uma comédia dos irmãos Coen. Em Hail, Caesar!/Ave, César!, Josh Brolin faz Eddie Mannix, executivo que administra a produção de um estúdio de Hollywood, chamado Capitol Records, nos anos 1950. É o terceiro longa que o ator faz com os Coens, após Onde os Fracos Não Têm Vez (2007) e Bravura Indômita (2010).

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Na verdade, ele vai um pouco além disso e também vigia, como um pai dominador, as vidas de astros e estrelas. A trama principal refere-se a George Clooney (Baird Whitlock) como astro que roda épico romano e é sequestrado por um grupo de comunistas de uma organização chamada Futuro. Os ‘reds’ exigem resgate de US$ 100 mil para soltar a estrela de cinema.

Libertado, Clooney volta ao estúdio intoxicado de ideias subversivas – falando de luta de classes, desigualdades salariais e direito de greve. Filme é a quarta parceria entre os diretores e o ator depois de E Aí, Meu Irmão, Cadê Você? (2000), O Amor Custa Caro (2003) e Queime Depois de Ler (2008).

Ethan e Joel Coen Foto: Fabrizio Bensch|Reuters

Com um elenco cheio de estrelas, como Ralph Fiennes, Jonah Hill e Channing Tatum, que aparece dançando com uma roupa de marinheiro, o longa, que tem previsão de estreia no Brasil no dia 7 de abril, é divertido e inteligente, mas muitos críticos não esconderam a decepção diante de um filme dos Coen que consideraram menor. Os irmãos – na coletiva, Clooney contestou os laços sanguíneos; disse que são, no máximo, primos – receberam o repórter na suíte de um hotel de luxo em Berehnstrasse. E admitiram que, entre o frio de Berlim e o calor de Cannes – apesar da calefação, Joel estava de manta e esfregava as mãos –, preferem... a Croisette.

Quero dizer que, embora ‘menor’, achei o filme muito bom. E vocês?

Ethan Coen: Não sei nada dessa divisão de filmes maiores e menores, mas acho muito estranha. Para nós, a produção foi das maiores. Não é sempre que se faz um filme sobre a produção de outros filmes. Tem musical aquático, sapateado, épico romano, western. A logística de Ave, César! foi muito apurada para um filme pequeno.

Joel Coen: Deixamos essa discussão sobre filmes grandes e pequenos para vocês, críticos e jornalistas. De nossa parte, tivemos imenso prazer em exercitar gêneros e estilos tão diferentes. Nosso diretor de arte e fotografia nunca trabalhou tanto. A toda hora estávamos num set diferente e isso foi muito estimulante.

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O filme mistura Barton Fink, no começo da carreira de vocês, os bastidores do cinemão, com a Guerra Fria do roteiro que vocês escreveram para (Steven) Spielberg, Ponte dos Espiões. A propósito, TrumboLista Negra está em cartaz no Brasil. Por que há tantos filmes sobre Guerra Fria atualmente em Hollywood?

Joel: É uma boa pergunta que não sabemos responder. Você sabe, Ethan? Não, né? Tínhamos essa história já há bastante tempo, mas não um roteiro escrito. O roteiro foi escrito mais recentemente. Provavelmente, sentimos que havia mais clima para contar essa história depois do Ponte dos Espiões. Todos nós fomos crias da Guerra Fria, num período em que ela começava a desaparecer, mas os anos 1950 foram de muita polarização. Houve a paranoia do anticomunismo. O macarthismo. É salutar tratar tudo isso com humor.

George Clooney. Astro que faz épico romano é sequestrado por grupo comunista Foto: Fabrizio Bensch|Reuters

Houve um Eddie Mannix de verdade. Até que ponto o personagem de Josh Brolin é o real?

Ethan: Há muito tempo que nos interessávamos pelo Eddie verdadeiro, que mereceu até uma biografia (‘The Fixers’, de E.J. Fleming, sobre os anos de Mannix e Howard Strickling na Metro). Nosso Eddie é simpático, o original era mais brutal. Muita gente também especula se Channing (Tatum) é Gene Kelly. Fizemos muita pesquisa para criar esses personagens, mas Ave, César! não é, para nós, um filme ‘à clef’. Não podemos impedir, no entanto, que as pessoas especulem.

Quem são as irmãs colunistas interpretadas por Tilda Swinton, arqui-inimigas como as rainhas da fofoca de Hollywood Louella (Parsons) e Hedda (Hopper)?

Sempre houve irmãs rivais em Hollywood. Há uma mitologia por baixo da diversão do filme, mas não é o caso de elucidarmos essas questões.

O filme tem cenas muito engraçadas, como a de Frances McDormand como a montadora que quase morre engasgada na sala de montagem...

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Joel: São anedotas que a gente ouve contar e sempre quisemos colocar num filme, não é, Ethan: E com Frances, você sabe, pode-se fazer qualquer coisa, que ela vai fazer bem. Mas essa pode ser a cena engraçada do ponto de vista do público. Do ponto de vista da filmagem, foram muito mais divertidas as bofetadas de Eddie Mannix em Baird Whitlock.

George (Clooney) apanhou como nunca na vida, não é Ethan?

Era um tabefe atrás do outro, e a equipe toda rindo. E o Josh pedia – “Vamos fazer de novo? Acho que não ficou bom...”

O elenco é notável. Quem é o caubói Alden Ehrenreich? E vocês já escreveram para George e Scarlett (Johansson)?

Alden veio para um teste (audition) e foi perfeito. Nós nos olhamos e dissemos – “É o cara!”. Escrevemos o Baird pensando que George (Clooney) aceitaria o papel. Ele aceitou, claro, mas reclamou. “C’mon guys, vocês acham que eu sou tão idiota assim?” Vivendo a personagem DeeAnna Moran, uma atriz que tem que manter sua imagem de inocência para o público, Scarlett Johansson será provavelmente uma surpresa, quando sai da pele da sereia e diz todos aqueles absurdos. Seu público pode estranhar, mas ela adorou fazer uma estrela tão... bitch!

* ETHAN E JOEL COEN CINEASTAS

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