Gramado encerra festival discutindo próxima edição

Últimas exibições foram realizadas nesta sexta-feira à noite. Kikitos serão entregues neste sábado

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Por Agencia Estado
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Termina hoje à noite, na serra gaúcha, a 33.ª edição do Festival de Gramado, que vai entregar os Kikitos aos vencedores das competições brasileira e latina. Nos bastidores, comenta-se que o festival vai mudar no ano que vem. Está sendo formada uma comissão para discutir, entre outras coisas, o aumento do número de exibições (que passaria de cinco para dez) e até a abertura do evento para as cinematografias de língua inglesa. Seria a internacionalização definitiva do Festival de Gramado, com um risco muito grande para a sua sobrevivência. Gramado conseguiria firmar-se como um ponto de atração no panorama dos festivais mundiais? Não correria o risco de virar simplesmente a vitrine de lançamento das Majors, as grandes companhias de Hollywood? Ontem, foram exibidos os últimos filmes da competição. Com exceção do chileno Mala Leche, de León Errázuriz, que abriu a mostra latina à tarde, não foi um dia muito feliz para nenhuma das competições. Mala Leche, nos dicionários de língua espanhola, refere-se ao homem de más intenções, violento e inescrupuloso. Dois jovens marginais ingressam numa escalada de drogas, sexo e violência. O diretor Errázuris foi comparado a Quentin Tarantino, mas é uma simplificação descabida. Numa atitude reducionista, os críticos chamam hoje de tarantinesco qualquer filme com personagens de arma na mão e envolvidos na violência urbana. O diretor chileno de 37 anos contextualiza sua história, dá-lhe densidade social e humana. É um filme poderoso. O argentino Un Mundo Menos Peor, de Alandro Agresti, forneceu aos críticos a metáfora perfeita do que se pretende hoje em dia - um mundo menos pior, sim, mas também um cinema menos pior. Agresti conta a história de uma mãe que viveu os anos de chumbo da ditadura militar e agora tenta reconstruir a família. É mais um filme sobre a figura do pai ausente, que foi recorrente na seleção de Gramado, em 2005. Como cinema, é um pouco decepcionante. Um filme de sentimentos, bem-feito, mas um tanto esquemático. Agresti, argentino que vive exilado na Europa, já fez coisas melhores. À noite, desenrolou-se a mostra brasileira de curtas, documentários e longas. Os curtas em Gramado andam sofríveis. Ímpar Par, de Esmir Filho, uma fábula sobre amores e sapatos, até que foi bonitinho. O documentário Em Trânsito, de Henri Arrases Gervaiseau, chegou precedido de expectativa. Muita gente da comissão de seleção o definia como ´excepcional´. Em Trânsito, sobre a neurose que é o tráfego de uma grande cidade como São Paulo, onde as pessoas passam horas dentro de carros, trens e ônibus, não chega a ser propriamente ruim (tem personagens e momentos ótimos), mas foi o mais fraco dos quatro documentários que concorrem ao Kikito. Diário de Um Novo Mundo, de Paulo Nascimento, foi o último filme brasileiro da competição. Baseia-se no romance de Luiz Antônio Assis Brasil, um grande escritor do qual os diretores só extraem maus filmes. O pior de todos é A Paixão de Jacobina, de Fábio Barreto, que virou uma espécie de clássico do cinema trash brasileiro (apesar do luxo da produção). O Diário é bem produzido, mas o problema é que não tem vida (e tem excesso de música e ruído, como se o cineasta quisesse deixar o espectador atordoado). A história é a de um médico açoriano que chega ao Brasil no século 18 e descobre um novo mundo no qual o amor é impossível e a guerra, inevitável. Um crítico, tentando fazer graça, matou a charada no fim da sessão. Édson Celulari usa a peruca errada (ridícula) e você sabe como isso pode derrubar um filme de época. Há uma imensa curiosidade pela festa desta noite. Há três júris - de curtas nacionais, de longas e documentários nacionais e de longas latinos. A dificuldade do júri de documentários é que tem de fazer sua escolha entre bons filmes e não será fácil optar entre Doutores da Alegria, de Mara Mourão, e Sou Cuba - O Mamute Siberiano, de Vicente Ferraz. Há outro documentário que causou forte impressão, Do Luto à Luta, de Evaldo Mocarzel, mas ele já foi o grande premiado no Festival do Recife. O júri de Gramado vai querer ser o que simplesmente referendou o Recife? Entre os longas latinos, há dois ou três que são ótimos, o chileno, o argentino Buenos Aires 100 Km, de Pablo José Meza, e o venezuelano Punto y Raya, de Elia Schneider, que é o preferido dos críticos. O nó górdio é a competição brasileira de ficção. Aqui, infelizmente, o júri não vai escolher o melhor e sim, o menos pior.

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