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Geraldo Sarno lança série sobre diretores nacionais

Por Agencia Estado
Atualização:

Há tempos que o cineasta Geraldo Sarno se preocupa com a questão do audiovisual aplicada à educação. Ele é capaz de ficar horas falando sobre o assunto. Falou bastante, há coisa de três semanas, em 31 de julho, no Rio quando o Canal Brasil e a Riofilme promoveram o lançamento da série A Linguagem no Cinema. O primeiro programa vai ao ar amanhã no Canal Brasil, da Net/Sky, às 23h30. Chama-se Espaço e Tempo no Cinema de Ruy Guerra. O moçambicano Ruy, que fez sua formação na França, no auge da nouvelle vague, virou um nome importante do cinema brasileiro ao realizar, em 1962, um dos marcos definidores do Cinema Novo: Os Cafajestes. Vieram depois Os Fuzis, Os Deuses e os Mortos, A Queda, Estorvo. Ruy Guerra explica seu projeto de cinema: diz que não é possível planejar uma obra. A dele oscila entre o instinto e a lógica, pois Ruy acredita que o pensamento poético e o científico são complementares. Essa conversa com Ruy Guerra é a primeira da série idealizada por Geraldo Sarno. A Linguagem do Cinema é uma coletânea de oito vídeos dedicados ao processo criativo de dez cineastas brasileiros. Cada episódio tem a duração média de 50 minutos e todos foram realizados em vídeo digital. Na seqüência e até 2 de outubro, o Canal Brasil mostra, sempre às sextas-feiras: A Construção do Filme em Torno de Uma Imagem (sobre Walter Salles e Daniela Thomas), Por um Cinema Artesanal e do Sentimento (Carlos Reichenbach), Ana Carolina no País do Cinema, O Baile Pernambucano (Paulo Caldas e Marcelo Luna), Aruanda Visto por Linduarte Noronha (sobre o filme que antecipou o Cinema Novo), 50 Minutos e 23 Segundos com Júlio Bressane e O Realizador Vai à Luta (Murilo Salles). Sarno é autor do clássico Viramundo. O documentário de 1965, sobre a migração nordestina em São Paulo, virou episódio de Brasil Verdade, de 1968. Continua atual, como na época em que foi feito. O País, que se vangloria de ter ingressado na modernidade e de ser a oitava economia do mundo, não resolveu seus problemas estruturais e sociais. Não é culpa de Sarno se seu documento permanece tão vivo. Preocupado com a questão da educação, desde que foi chamado por Darcy Ribeiro para a Universidade de Campos (RJ), ele sempre quis integrar a linguagem audiovisual ao ensino. Acha que é uma questão grave. "O ensino a distância, para o qual o cinema e a TV podem contribuir bastante, é uma necessidade num País continental e tão cheio de desigualdades quanto o Brasil", diz. Pensando assim, Sarno formatou o projeto que levou até a Riofilme. A distribuidora da prefeitura do Rio de Janeiro deu seu aval, mas não liberou a verba integralmente. Sarno foi fazendo os programas aos poucos. No total, levou dois anos para concluir os oito vídeos, exibidos (alguns deles) no Festival de Brasília do ano passado, numa rodada de debates sobre a arte do documentário no cinema brasileiro. Sarno explica que a série é uma introdução à linguagem cinematográfica para o público em geral e também para estudantes e professores universitários, principalmente os dos cursos de Comunicação e Cinema espalhados pelo Brasil. E, já que o objetivo é estimular o ensino a distância, dispõe-se a realizar debates em escolas e universidades. Ensaios - Ele gostaria que houvesse uma cópia da coleção em cada casa de ensino do País. Os oito vídeos serão lançados pela Funarte. Poderão ser adquiridos isoladamente ou em conjunto. Cada fita custará R$ 30. Dia 23, ocorre o primeiro lançamento, o do vídeo sobre Ana Carolina, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Sarno é um grande artista. Não se limita a enumerar dados do tipo fulano nasceu em tal lugar, no dia tal, fez os seguintes filmes, em tais épocas. Todos os programas têm caráter ensaístico, dedicam-se à expressão cinematográfica e propõem o exame e a reflexão sobre o processo criativo dos diretores escolhidos. Por meio desses programas, é o próprio Sarno que se expõe. Como ele gosta de dizer, nenhum documentário pode ser considerado uma referência absoluta sobre qualquer pessoa ou assunto. O documentário, segundo Sarno, "expõe a maneira de documentar do documentarista". Daí sua definição de documentário: "Para mim, está ligado a uma descoberta pessoal, de mim mesmo." Não há um formato único, o próprio Sarno avisa. O programa sobre Paulo Caldas e Marcelo Luna extrapola a discussão sobre a obra, ainda reduzida, dos dois para propor a revisão ampla do cinema pernambucano. E, até para ser fiel às ousadias de Bressane, o sétimo episódio da série, dedicado ao autor de Os Sermões e O Mandarim, é gravado num plano contínuo. Bressane ocupa a cena o tempo inteiro e, em certos momentos, divide a tela para ilustrar sua fala com cenas de algum filme. Como o diretor pensa e articula seu repertório audiovisual para realizar o objeto filme? É a pergunta que percorre a série toda. No Rio, no lançamento do bloco de programas, Sarno deixou claro que há uma relação de admiração com cada uma das figuras retratadas. É um grande contador de histórias. Conta várias que poderiam redimensionar os bastidores da história do cinema brasileiro, mas não é isso que lhe interessa, no momento. Sarno vai iniciar outra série. Na verdade ele pretende que sejam cinco séries de 11 programas cada. Quer discutir as técnicas do cinema e sua aplicação na expressão cinematográfica. A fotografia, a montagem, o som, o roteiro. Não quer ensinar como se filma, copia ou revela, mas como o diretor trabalha com cada um desses elementos para incorporá-lo à sua visão do cinema e do mundo. E pretende ampliar o leque. Depois da série sobre as técnicas, outra série sobre a história do cinema. E outra sobre as teorias. O sonho de Sarno é construir todas as séries a partir de um olhar peculiar, o do cineasta brasileiro e latino-americano que ele tem orgulho de ser. O que encarece esses projetos é o alto custo gasto em direitos autorais. Na maioria dos casos, os diretores, quando detêm os direitos de produção e da imagem, liberaram os filmes, mas quando é preciso pagar o preço é salgado: R$ 1 mil por minuto. O preço médio de cada programa da série A Linguagem do Cinema foi de R$ 40 mil. Faça as contas e veja quanto Sarno terá de gastar para realizar as próximas séries. Que, independentemente dos custos, são necessárias. A educação, a memória, o próprio povo brasileiro merecem esse esforço. A Linguagem do Cinema. Sextas, às 23h30. Até 2/10. Canal Brasil.

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