George Romero volta com seus zumbis politizados

Terra dos Mortos completa a série de filmes de zumbis iniciada por Romero em 1968, com o cultuado A Noite dos Mortos-Vivos

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Por Agencia Estado
Atualização:

Até certo ponto, você pode dizer que George Romero está fazendo sempre o mesmo filme de zumbis desde o seu cultuado A Noite dos Mortos-Vivos, de 1968. Ele é o primeiro a admitir que sim, mas faz uma ressalva importante. A história, em linhas gerais, pode ser a mesma, mas o contexto histórico e social é sempre diferente e nisso vai a sua, digamos, autoria. Os filmes de terror de Romero ocupam um capítulo destacado do gênero. Assustam, mas não largam da política, que é o que interessa ao diretor. Em A Noite dos Mortos-Vivos, Romero criou uma alegoria sobre a Guerra do Vietnã; em Zombie, Despertar dos Mortos-Vivos, de 1978, seu tema era o consumismo e no Dia dos Mortos, de 1986, ele alertou para os germens do totalitarismo. Passaram-se quase 20 anos antes que Romero sentisse necessidade de transformar sua trilogia numa tetralogia, acrescentando Terra dos Mortos, que estréia hoje, à série. O novo filme passa-se numa terra devastada, na qual subsistem, no interior das cidades, enclaves superprotegidos nos quais os ricos pagam por sua segurança, numa alienação total sobre os horrores que ocorrem lá fora. Esses horrores incluem a ação dos mercenários que levam uma guerra armada com os mortos-vivos, até que eles também aprendam a manusear bazucas e pistolas. Dennis Hopper faz o capitalista que comanda esse assustador mundo futuro, preocupado apenas com seus lucros. O mundo está podre, mas a única coisa que conta para ele é a acumulação capitalista. Romero cita, especificamente, o desprezo de Bush pelas leis de controle ambiental. Cria-se uma situação de terrorismo - de mão dupla. Há o grupo armado dos heróis, formado por Simon Baker e a cult Asia Argento. A meio caminho entre o bem e o mal, situa-se o oportunista John Leguizamo. O desfecho é inusitado, até porque Romero termina seu filme com a guerra em aberto, sem solução definitiva para o conflito que encena. Luiz Carlos Merten Romero criou o gênero de mortos-vivos Como os três mosqueteiros, a trilogia de George Romero sobre mortos-vivos, ganha um quarto membro. Dartagnan é Terra dos Mortos, que estréia hoje em São Paulo. Pode não parecer, mas de certa forma é um filme histórico. Romero criou o gênero de mortos-vivos. Ou zumbis, como preferem os americanos. Lá em 1968, fez Noite dos Mortos-Vivos. Dez anos depois, Amanhecer dos Mortos. Já era 1985, quando lançou O Dia dos Mortos. Estes três filmes são clássicos do terror. Não apenas pelos sustos, sangue e mortes. Mas por unir o estilo com política, sociologia e psicologia. Quando anunciaram que ele voltaria para as criaturas sedentas por carne humana, os fãs ficaram apreensivos. Teria Romero se vendido? Será que faria um quarto filme apenas para ganhar uns trocados? Não, digo logo, sem suspense. Ele conta uma história original. Mantendo-se fiel às suas outras incursões. Novamente o problema maior são os vivos. Ganância, inveja, ciúmes, preconceito. Tudo isso desabrocha quando as criaturas batem na porta. E eles nunca falham. O mundo seria um lugar melhor se apenas os mortos-vivos habitassem, é a impressão que fica ao final de cada projeção. Também como nos anteriores, tem um ritmo constante. Não é acelerado. Nem quase parando. Romero leva a história com segurança. Deixa o espectador perceber os detalhes e refletir. E sabe apresentar os personagens muito bem. Quando for assistir, preste atenção. No momento em que o ator aparece em cena, já sabemos a sua índole. Sua simplicidade na maneira de filmar tem muito a ensinar aos mais jovens. É bom dizer que George Romero não é nenhum gênio. Mas quando faz um filme de morto-vivo ele sobe alguns degraus. Tira leite de pedra com maestria. Se sente à vontade com suas criaturas. Mostra que terror não é apenas gritos e pulos. Que pode haver reflexão. É histórico porque ele começou esta linha de filmes. Houveram imitadores. Homenagens. Refilmagens. Então, o criador volta a encontrar as criaturas. Contando algo novo. Expandindo os horizontes. O velho sabe que ainda tem balas na agulha. Não aprendeu truques novos, mas se vira muito bem com os antigos.

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