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"Garotas do ABC" choca pela atualidade

Longa de Carlos Reichenbach, que estréia hoje, mostra ataques semelhantes aos crimes cometidos no centro de São Paulo

Por Agencia Estado
Atualização:

O sabor das novas experiências motiva a carreira de Selton Mello - depois de estrear na direção teatral em 2003 com Zastrozi, o ator aventura-se agora como produtor associado no filme Garotas do ABC, de Carlos Reichenbach, que estréia hoje. Mais: no longa, ele ainda interpreta o primeiro papel de vilão de sua bem sucedida carreira de galãs. "É uma experiência que me fascinou", conta o ator, que vive um jovem advogado, Salesiano de Carvalho, herdeiro de uma grande pedreira, que lidera um grupo neofascista e lê Nietzsche. O filme mostra o cotidiano de um grupo de operárias de uma fábrica têxtil, com destaque para Aurélia (Michelle Valle), fã do ator e atual governador Arnold Schwarzenegger - daí o apelido Schwarzenega e a preferência por homens musculosos. Ela namora Fábio (Fernando Pavão), jovem enturmado no grupo neonazista comandado por Salesiano que, por ódio a negros e nordestinos, planeja uma série de atentados contra eles. E justamente a cena de espancamento de dois nordestinos, além de lembrar a crueldade do clássico Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick, ganha uma inesperada e triste atualização com o assassinato dos sem-teto que ainda intriga a polícia paulistana. "Sempre quis trabalhar com o Carlão. Ele é o representante máximo do cinema marginal dos anos 70, de que gosto muito", conta Selton. "E, quando ele me ofereceu o roteiro do Garotas do ABC, percebi que o personagem tinha ótimas possibilidades de criação." A maior parte dos textos declamados pelo personagem Salesiano saiu dos livros de Plínio Salgado, pregador do integralismo (doutrina inspirada na extrema direita), e do livro A Decadência do Oriente, de Oswald Spengler, filósofo alemão que, no período entre as guerras mundiais, combateu duramente a democracia. "O personagem do Selton é, para mim, a própria representação do Sigma, o símbolo do integralismo, a suástica brasileira", comenta Carlos Reichenbach. "E sua inteligência é o que o torna mais abominável." O diretor desenvolveu uma especial relação entre Salesiano e Fábio que, apesar de seu racismo confesso, é atraído pela mulata Aurélia. "Fábio vive atormentado por essa contradição, o que vai ser seu fim", comenta. Em seu 13.º longa-metragem, Reichenbach quis apresentar a ambigüidade do ABC paulista, região operária, território de fábricas têxteis e metalúrgicas, local onde foi criado o Partido dos Trabalhadores, mas, ao mesmo tempo, espaço ocupado por jovens (carecas, neonazistas, racistas) reunidos em gangues que odeiam negros, nordestinos e homossexuais.

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