Filmes de Cronenberg e De Palma saem em DVD

Calafrios e As Irmãs Diabólicas são os novos lançamentos da Continental. Entrevistas, artigo e vídeo valorizam os discos digitais

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Por Agencia Estado
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A Continental está colocando mais dois DVDs importantes no mercado. Você já pode ver, ou rever, As Irmãs Diabólicas, de Brian De Palma, e Calafrios, de David Cronenberg. Ambos os lançamentos são enriquecidos por extras para ninguém botar defeito: uma entrevista inédita de Cronenberg, um vídeo de cerca de 20 minutos de duração, outra com De Palma, esta apenas escrita, à base de perguntas e respostas, a reprodução do artigo da revista Life que inspirou o segundo a fazer seu filme, um ensaio sobre irmãos siameses. As Irmãs Diabólicas, Sisters no original, é o primeiro filme assumidamente hitchcockiano de De Palma. Quem acompanha a carreira do diretor sabe que, durante muito tempo, coexistiram nele o plagiador e o artista. Com o tempo, De Palma firmou o próprio estilo e chegou a autoplagiar-se. É claramente um diretor-cinéfilo, que aprendeu a ver o mundo por meio dos filmes e não consegue fazer cinema sem referir-se a outros diretores (e a obras já existentes, mesmo as suas). As Irmãs Diabólicas mistura dois cults de Alfred Hitchcock: A Janela Indiscreta e Psicose. Além das citações diretas dessas duas obras-primas hitchcockianas, o filme recorre ao músico preferido de Hitchcock, Bernard Herrmann, que completa a influência por meio de uma partitura 100% baseada nas sonoridades que criou para o mestre do suspense. Margot Kidder faz uma personagem que é um doce de pessoa. Possui um lado sinistro, o que permite a De Palma falar sobre a esquizofrenia. A boazinha Margot é vizinha da jornalista interpretada por Jennifer Salt. Como James Stewart em A Janela Indiscreta, Jennifer vê um crime ser cometido na casa ao lado. Chama a polícia, que não encontra corpo nenhum. Jennifer contrata um detetive e juntos investigam o caso. Descobrem que Margot tinha uma irmã siamesa e as duas foram separadas pelo médico que desposou a sobrevivente. Adivinhe se Margot não é um caso clássico de dupla personalidade, tendo incorporado a da irmã. Clímax - Considerado singularmente violento, na época do lançamento (1973), As Irmãs Diabólicas tem como principal problema a seqüência inicial. O crítico Danny Peary, que decupou a referida seqüência, observa que ela não apenas é um prodígio de técnica e intensidade dramática, como também é um clímax que o diretor não tem como manter durante o desenvolvimento da trama. A referida cena também é longa e o desfecho, comparativamente, fica mais fraco ou muito abreviado. Não deixa de ser a prova de que De Palma, por mais tiete que seja de Hitchcock, não absorveu uma lição do mestre, registrada por François Truffaut em seu livro, Hitchcock Truffaut. Hitch conta que desistiu de mais de um filme porque tinha um começo espetacular e depois não havia como segurar a tensão durante as duas horas seguintes. Por mais insatisfatório que venha a ser, o começo de As Irmãs Diabólicas é tão extraordinário que deixa o espectador siderado - e ligado na solução da história, até o último plano. De Palma já havia feito seis ou sete filmes antes de As Irmãs Diabólicas, David Cronenberg havia feito dois antes de Calafrios, Shivers no original. O filme de 1975 provocou grande controvérsia. Chegou a ser chamado de Vampiros de Almas escatológico, pela associação que permite com o filme famoso de Don Siegel sobre vagens gigantescas que geram clones humanos numa cidadezinha norte-americana, nos anos 1950. Em Calafrios, as vagens alienígenas de Siegel são substituídas por parasitas destinados a liberar a sexualidade, de acordo com o projeto idealizado por um cientista (maluco, naturalmente). Os tais parasitas invadem um prédio e provocam orgias que ainda hoje são assustadoras. Há 27 anos, pareciam provocações à censura de diversos países. O sucesso foi de escândalo, claro. Hoje, à luz do desenvolvimento posterior da carreira de Cronenberg, é possível ver em Calafrios o embrião de uma obra às vezes rica e sempre, com certeza, desconcertante. Há pouco, Cronenberg chegou ao Festival de Cannes como favorito para a Palma de Ouro deste ano. Em Spider, tentou revelar o que se passa na mente de um assassino. Não deu muito certo. Nos anos 1970, Roman Polanski, que ganhou a Palma com O Pianista, foi muito mais contundente com O Locatário. O júri presidido por David Lynch compreendeu isto e ignorou Cronenberg na premiação final. Há outra interpretação para o fato. Alguns críticos e jornalistas, o grupinho que amou Spider, acha que foi um ato mesquinho de vingança. Lynch deu o troco a Cronenberg, que há três anos, na presidência do júri de Cannes, também deixou História Real de fora na hora da premiação. É ignorar que um júri pode ter um presidente, mas é formado por artistas e técnicos que também fazem valer sua vontade. É de duvidar, por exemplo, que integrando o corpo de jurados deste ano, tenha cedido a esse possível desejo de vingança de Lynch. Em filmes como Calafrios e, depois, Gêmeos - Mórbida Semelhança e Crash - Estranhos Prazeres, os monstros do diretor tentam escapar da sua natureza humana. Cronenberg cria heróis (trágicos, patéticos) que se matam por causa de experiências radicais que os transformam em aberrações aos olhos de seus semelhantes. Tudo isso já está em Calafrios, que ostenta, como curiosidade especial, a participação de Barbara Steele. Atriz inglesa, ela fez carreira no cinema italiano, nos anos 1960, participando de filmes de Mario Bava (A Maldição do Demônio), Federico Fellini (Oito e Meio) e Mario Monicelli (O Incrível Exército de Brancaleone). Com sua beleza morena, os olhos imensos e alucinados, Barbara foi perfeita como heroína de fantasias de terror. As Irmãs Diabólicas (Sisters). EUA, 1973. Delírios (Shivers/The Parasite Murders). Canadá, 1975. Ambos DVDs distribuídos pela Continental. Nas lojas, R$ 35 cada um.

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