Filme iraniano leva o Leão de Ouro de Veneza

Festival termina sua 57ª edição premiando uma obra madura, bem estruturada - do ponto de vista estético - e empenhada socialmente

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Deu a lógica e o Irã levou o Leão de Ouro: como se prognosticava, Dayereh (O Círculo), de Jafar Panahi,foi o grande vencedor da 57ª edição do Festival de Cinema de Veneza. Uma premiação merecida, que destaca uma obra madura, bem estruturada do ponto de vista estético e empenhada socialmente. O filme, cruzando as trajetórias de nove personagens, traça um painel contundente da posição subalterna da mulher na sociedade iraniana. Ao receber o prêmio, Panahi (já conhecido no Brasil por trabalhos como O Balão Branco e O Espelho), o dedicou às "pessoas boas" do seu país. Com isso, talvez, querendo dizer que nem toda a população iraniana é composta de gente de índole amigável. Especialmente quem habita o poder e permite que se mantenha os fatos que ele denuncia em seu filme. Se o prêmio principal foi merecido, outros parecem bem duvidosos. Por exemplo, dar o troféu de direção ao indiano Buddhadeb Dasgupta, de Uttara, parece nada menos que uma excentricidade. O filme até que tem seu interesse, ao apresentar uma realidade bem desconhecida do interior do país. No entanto, na costura das suas linhas de ação o que falta, justamente, é direção e senso de coesão interna. A mesma coisa se pode dizer de Before Night Falls, de Julian Schnabel, duplamente premiado e talvez em excesso. Levou o troféu de ator, com Javier Bardem, e um exagerado Prêmio Especial do Júri. Nada a discutir quanto a Bardem, realmente um ator empenhado e em papel difícil - acostumado a viver machões nos filmes de Bigas Luna, agora interpreta um homossexual, o escritor cubano Reinaldo Arenas. Mas talvez o Prêmio Especial do Júri ficasse melhor nas mãos de um veterano, como Manoel de Oliveira, de Palavra e Utopia. Poderia talvez premiar a ousadia de A Ilha, do coreano Kim Ki-Duk. Ou o painel político de Zhantai, do chinês Jia Zhandke, que cobre, com muita agudeza, dez anos da história recente do seu país. Ou ainda, poderia ir para o principal representante italiano, I Cento Passi, de Marco Tulio Giordana, que regressa ao cinema político com muita energia, contando a história de resistência de um jovem siciliano contra a máfia. Giordana teve de se contentar com um prêmio de roteiro para seu I Cento Passi. Prêmio importante, sem dúvida, mas que talvez esteja ainda um degrau abaixo do que merecia, levando-se em conta sua relevância para um fato da história recente da Itália, o assassinato do jovem Peppino Impastato pela máfia, em 1978. Foi o filme mais aplaudido de todo o festival. Um prêmio que não deve provocar polêmica é o de melhor atriz para Rose Byrne, do australiano The Godess of 1967. Ela é nunca menos que brilhante ao fazer uma garota cega que embarca numa viagem das mais estranhas pelo interior da Austrália em companhia de um japonês. O filme poderá ser conferido em breve pelo público brasileiro, pois foi comprado pela distribuidora Imovision. Enfim, num festival de nível apenas médio, acabou vencendo o melhor, o que não desculpa os equívocos cometidos nas outras categorias da premiação. Veneza, este ano, privilegiou a quantidade sobre a qualidade. Foram muitos filmes na programação (foram 20 apenas na competição de longas) e poucos que terão lugar duradouro na história do cinema. Já se fala, para o ano que vem, em uma curadoria mais seletiva. Lista dos premiados Leão de Ouro para o melhor filme: Dayereh (O Círculo), de Jafar Panahi (Irã) Prêmio Especial do Júri: Before Night Falls, de Julian Schnabel (EUA) Direção: Buddhadeb Dasgupta (Índia) Melhor roteiro: I Cento Passi (Itália), de Marco Tulio Giordana, escrito por Claudio Fava, Monica Zappelli e Marco Tullio Giordana Coppa Volpi pela melhor interpretação masculina: Javier Bardem, pelo filme Before Night Falls, de Julian Schnabel (EUA) Coppa Volpi pela melhor interpretação feminina: Rose Byrne pelo filme The Goddess of 1967, de Clara Law (Austrália) Prêmio Marcello Mastroianni para ator revelação: Megan Burns pelo filme Liam, de Stephen Frears (Inglaterra) Medalha de ouro da presidência do senado: La Virgen de los Sicarios, de Barbet Schroeder (França/Colômbia) Prêmio Venezia Opera prima, para diretor estreante: La Faute à Voltaire, de Abdel Kechiche (França) Curta-metragem Leão de prata para o melhor curta-metragem: A Telephone Call for Genevieve Snow Menções a Trajets, de Faouzi Bensaid e Sem Movimento, de Sandro Aguillar

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.