Filme equatoriano decepciona no Cine Ceará

Apesar da boa atuação da atriz Vanessa Alvario, 'Não Roubarás (A Não Ser que Seja Necessário)' tem problemas de composição

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

FORTALEZA - Com o equatoriano Não Roubarás (A Não Ser que Seja Necessário), de Viviana Cordero, o Cine Ceará 2014 deu seguimento à sua mostra competitiva. É o segundo filme estrangeiro a ser apresentado - o primeiro foi o chileno Eu Não Sou Lorena, na abertura do evento.

O filme apresenta uma situação social muito comum nos países latino-americanos. Famílias desfeitas que precisam se virar sozinhas depois que o pai, por um motivo ou por outro, deixa de ser o provedor da casa. A mãe (Ana María Balarezo) vive às turras com o novo marido (Carlos Clonares) e tem quatro filhos para cuidar: a adolescente Luzia (Vanessa Alvario) e mais três crianças. O pai é um alcoólatra que fica violento quando bebe. Tem ciúmes da mulher e a agride. Vive indo e voltando. O pai biológico está sumido em algum lugar do litoral.

Cena de "Não Roubarás..." Foto: Divulgação

PUBLICIDADE

Um dia a mãe se defende de uma agressão, o padrasto cai na escada, fica ferido e a mulher é encarcerada. Luzia, que canta numa banda de rock punk, é obrigada a se virar para sustentar os irmãos menores. E também precisa de dinheiro para tentar tirar a mãe da cadeia. Só encontra um jeito - daí o título do filme.

Não Roubarás... tem algumas qualidades, a principal delas o talento da garota Vanessa, que tinha 16 anos na época da filmagem e agora está com 19 e estuda Economia. Ela ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Havana do ano passado e, de fato, tem qualidades de interpretação. Em Fortaleza, Vanessa contou que o filme tem muito a ver com sua própria vida, tendo de se virar com a mãe depois de a família ter sido abandonada pelo pai. "Pus muito de mim na interpretação, talvez por isso tenha sido tão convincente", disse.

Num filme em que apenas a mãe e o padrasto são interpretados por atores profissionais, o melhor é a espontaneidade desses "atores naturais"em cena. Esse impulso, digamos assim, amadorístico, não chega a salvar uma obra com sérios problemas de composição. Chega a ser tosca em alguns momentos, apela para o melodrama em outros e dá testemunho de um cinema ainda embrionário, se comparado a outras cinematografias latino-americanas.

De acordo com a atriz, o Equador chega a produzir hoje cerca de dez longas por ano, o que considera bom. A média anterior era de dois ou três, apenas. O maior sucesso é Que Tan Lejos, de Tania Hermida, com 300 mil espectadores, num país de 14 milhões de habitantes.

Pensando bem, é até surpreendente que lá se faça um filme como Não Roubarás. Mas tem muito caminho a andar.

Publicidade

Curtas. O destaque, entre os curtas apresentados, foi O Relâmpago e a Febre, de Gilson Vargas (RS). Sem qualquer diálogo, o filme mostra um personagem só em sua casa, acompanhado apelas por seu cão, numa noite de tempestade. Ele monta uma arma e, pelas fotos da parede, deduz-se que fazia parte dos órgãos de repressão durante a ditadura. O desfecho surpreende e mostra um diretor de mão forte e ideias claras. Em entrevista, Vargas, que também é professor universitário, disse que ficou preocupado ao ver uma manifestação em Porto Alegre no qual alguns jovens pediam a volta do governo militar. "Não viveram aquela época e certamente não têm a menor ideia do que foi a ditadura", diz. Num momento em que a extrema-direita começa a colocar a cabeça de fora em várias cidades do país, filmes como O Relâmpago e a a Febre são mais necessários do que nunca.

O outro curta da noite foi De Castigo, de Helena Grama Ungaretti. Um garoto vai passar uns tempos com sua tia-avó, que é bem avançadinha para a idade. O filme tem momentos engraçados e, apesar da fotografia lavada, consegue envolver o espectador com as peripécias da velhinha transviada e do sobrinho tímido e careta.

Homenagem. Na noite desta segunda-feira, 17, foi homenageado pelo Cine Ceará o escritor e cineasta João Batista de Andrade, que este ano foi eleito "Intelectual do Ano", fazendo jus ao Troféu Juca Pato, da União Brasileira dos Escritores (UBE). João é um cineasta importante, com filmes como Doramundo, O Homem que Virou Suco e O País dos Tenentes no Currículo. É também escritor, autor de vários romances. Lança, este ano, A Terra Será Azul. É também presidente do Memorial da América Latina.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.