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Filme é baseado em peça de Fassbinder

Gotas d´Água em Pedras Escaldantes, de François Ozon, baseia-se numa peça, nunca encenada, que o autor alemão escreveu aos 19 anos. É um filme duro e cruel, sobre a destruição dos puros de coração

Por Agencia Estado
Atualização:

É o mais fassbinderiano dos filmes que Rainer Werner Fassbinder não realizou. Gotas d´Água em Pedras Escaldantes traz a assinatura de François Ozon. Baseia-se numa peça, nunca encenada, que o autor alemão escreveu quando tinha 19 anos. Até hoje, decorridos quase 20 anos de sua morte (em 1982, aos 36 anos), Fassbinder ainda ameaça o mundo burguês. Acreditava que "o amor é mais frio que a morte" (título de um de seus filmes). Para ele, não existem relações amorosas decentes. Existem relações de dominação e poder que se operam por meio do sexo. Gotas d´Água, que estréia hoje, parece sob medida para provar a tese. Um garoto acompanha um homem maduro à sua casa. Viram-se na rua, trocaram olhares. Desenhou-se uma relação homo. O garoto tem namorada, mas isso não o impede de se deixar seduzir pelo outro. Esse outro é manipulador e destrutivo. Domina o rapaz e o submete às piores humilhações. Entram em cena duas mulheres: a namorada do rapaz e a ex-namorada do manipulador. Na verdade, esta última é um homem que mudou de sexo. Desenha-se um jogo de poder que termina em morte. Talvez não seja um filme para todos os gostos, mas é forte, muito bem dirigido e interpretado, numa linha que privilegia mais o frio cerebralismo que as modulações do grande espetáculo. Duas cenas são emblemáticas. Logo no começo, o garoto e o amante param diante da janela da casa do segundo. São filmados de fora. Mais tarde, no desfecho, o sobrevivente é filmado da mesma maneira e aí o sentido fica claro. A figura que tenta abrir o vidro e não consegue é metáfora de quem ficou preso na armadilha dos sentimentos. Sempre houve românticos que desconfiaram do romantismo (François Truffaut, por exemplo). Ozon, seguindo a lição de Fassbinder, simplesmente não acredita no amor. É um filme duro e cruel, sobre a destruição dos puros de coração.

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