Filme documenta o imaginário hip hop

vinte/dez, de Tata Amaral e Francisco Cesar Filho, atualmente em fase de montagem, narra a história de jovens hip hoppers da periferia de Santo André

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Por Agencia Estado
Atualização:

Dois dos mais importantes cineastas paulistas da nova geração renovaram uma parceria antiga. Tata Amaral e Francisco Cesar Filho, o Chiquinho, assinam juntos o documentário vinte/dez. Produzido com o apoio da prefeitura de Santo André, o filme investiga as perspectivas dos jovens andreenses ligados ao movimento hip hop. Atualmente, o filme está em fase de montagem, tendo como titular na função a montadora Idê Lacreta, responsável pela edição, entre outros filmes, de Através da Janela. Faz 14 anos que os dois cineastas trabalharam juntos pela última vez. Dirigiram em parceria os curtas-metragens Poema: Cidade (1986), baseado em poesia de Augusto de Campos, e Queremos as Ondas do Ar! (1986), sobre as chamadas rádios piratas. Nesses primeiros trabalhos, lançavam as bases de suas futuras realizações ao mostrar uma preocupação com os elementos da cidade e do urbano. Tanto Tata quanto Chiquinho têm intimidade com os assuntos tratados em vinte/dez. Os dois títulos mais importantes da carreira do cineasta são Hip Hop-SP (1990) e Rota ABC (1991). O primeiro fala sobre a chegada da cultura dos guetos negros americanos a São Paulo na década de 80. O outro mostra as perspectivas da primeira geração de filhos dos metalúrgicos e sindicalistas da região do ABC. Tata não tem filmes específicos sobre o assunto. Mas está trabalhando no roteiro de Lila Rapper, que chama de "o primeiro musical rap" do cinema brasileiro. "A realização desse documentário é uma preparação para mim", diz ela. "No sentido de que vou conhecer melhor os lugares e as pessoas sobre as quais pretendo falar." Foram três semanas de filmagem em julho para concluir vinte/dez. A equipe percorreu a periferia de Santo André conversando com jovens ligados ao movimento hip hop e conhecendo o seu dia-a-dia. "Se tem algum lugar em que está acontecendo algo no Brasil, é na periferia de Santo André", diz Chiquinho. "Foi isso que me fez aceitar esse trabalho e voltar a investigar esses lugares e falar com essas pessoas." Por intermédio de pesquisa feita pela jornalista Janaina Rocha, repórter de O Estado, foram escolhidos oito personagens. São grafiteiros, dançarinos e dançarinas de break, MCs e DJs que representam os fundamentos dessa cultura. E são anônimos. "A idéia do filme também é a de mostrar que o hip hop é consciência", diz Tata. "Esses jovens e os que trabalham no tráfico não têm diferença social, estão no mesmo nível; os que lidam com a arte têm uma possibilidade de expressão e isso é uma coisa extremamente criativa e animadora." A reportagem acompanhou um dia de filmagem no Sítio dos Vianas, loteamento na periferia de Santo André ocupado desde a década de 70, de geografia acidentada e que fica na divisa com São Bernardo do Campo. A equipe entrevistou Shirlei e Deivison Mendes Faustino. Com 17 e 19 anos, respectivamente, os irmãos são os responsáveis pelo núcleo Rotação - Resistência Organizada de Trabalho e Ação. A "posse" - nome dado aos grupos de atuação social desses jovens - se reúne todos os domingos à tarde em um espaço, geralmente a garagem de um deles ou a praça do bairro, para discutir questões de interesse coletivo. Shirlei e Deivison ainda são estudantes. A mãe deles morreu e moram com os avós. Ela ainda está no segundo grau. Ele está fazendo o primeiro ano de Ciências Sociais em uma faculdade de Santo André. Com a economia do seu salário mínimo, Shirlei pagou a matrícula do irmão, que não tem emprego fixo. São jovens de baixo poder aquisitivo, mas com muitas idéias e, principalmente, atitude - característica dos hip hoppers. "Procuro não pensar no futuro", reflete ele, em um de seus depoimentos. "O que vamos fazer agora é o que vai nos influenciar no futuro." Vinte/dez tem orçamento previsto de R$ 150 mil, financiados pela prefeitura de Santo André. Tata e Chiquinho estão selecionando imagens do filme, todo rodado no formato digital (com uma câmera Mini DV) e com alguns trechos em Super-8. Os diretores vão trabalhar na montagem até o início de setembro, quando devem apresentar um primeiro corte do filme para a prefeitura andreense. Posteriormente, a versão em vídeo será exibida para a comunidade, em escolas e universidades. Mas haverá também uma versão em película para lançamento em cinema. Segundo a dupla de cineastas, o lançamento deverá ocorrer até o fim do ano ou, no máximo, até o início de 2002.

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