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Filme conta história de Reinaldo Arenas

Estréia o filme que traz Javier Bardem no papel que o colocou na corrida do Oscar. Dirigido pelo artista plástico Julian Schnabel, Antes do Anoitecer baseia-se na autobiografia do escritor homossexual que conheceu o inferno nas cadeias de Cuba, até ir para Miami, onde morreu de aids, aos 47 anos

Por Agencia Estado
Atualização:

Ator de um pequeno papel no filme de seu amigo Julian Schnabel, Hector Babenco não deixa por menos e considera Antes do Anoitecer, que estréia nessa sexta-feira em São Paulo, o melhor filme latino-americano já feito sobre o tema da liberdade. Babenco é um homem sério e um artista criterioso. Pode ser que exagere um pouco, mas faz sentido. Schnabel, americano, artista plástico, fez um filme incômodo, mas que não pode ser ignorado. Agora menos que nunca, já que Javier Bardem concorre ao Oscar de ator e isso garante ao filme uma exposição extraordinária em todo o mundo. É uma bela interpretação, embora o ator tenha de brigar com o inglês, idioma dominante no filme. Bardem, mito sexual masculino na Espanha, machão nos filmes de Pedro Almodóvar (Carne Trêmula) e Bigas Luna (Ovos de Ouro), faz um gay. Não um gay anônimo, mas Reinaldo Arenas, o escritor cubano que aderiu com entusiasmo à Revolução Cubana e depois virou dissidente do regime instalado na ilha de Fidel Castro. Como e por que isso ocorreu o próprio Arenas contou em seu romance autobiográfico, Antes Que Anoiteça, editado no Brasil pela Record. Apesar do título, o livro não foi a única fonte do diretor, que se baseou em outros escritos de Arenas. Homossexual assumido, o escritor tornou-se um personagem incômodo para as autoridades do regime. Seu comportamento passou a ser identificado como "decadente" e "burguês". O resultado foi que ele conheceu o inferno nas cadeias de Cuba, até conseguir deixar o país, rumo a Miami, onde morreu, de aids, aos 47 anos. Só sendo cubanófilo de carteirinha ou apaniguado do mitológico Fidel para defender o tratamento dispensado a Arenas. A propósito dele, o dr. Sobral Pinto, consciência institucional do País, poderia invocar a lei de proteção aos animais, como fez em defesa de Luiz Carlos Prestes, no Brasil do Estado Novo. Nem bicho merece esse tratamento, aliás, bicho não merece esse tratamento, por que o mereceriam homens? Em São Paulo, no ano passado - veio para a Mostra Internacional de Cinema -, Schnabel fez questão de dizer que não é de direita nem de esquerda, que não queria denegrir a imagem de Cuba, "só queria contar a história do Reinaldo". Fez um filme forte e até ousado (como quando procura ilustrar o imaginário gay). A ousadia do diretor comunica-se ao elenco, não só na coragem de Bardem em investir contra a própria imagem para dar vida a esse personagem, como também a de Johnny Depp, cooptado pelo diretor para interpretar dois papéis. Num deles, beirando o realismo fantástico, ele faz o travesti que contrabandeia, do cárcere, os originais de Arenas, escondendo-os no ânus. No outro, faz o sedutor oficial cuja virilidade provoca devaneios no escritor, mesmo que esse homem que o atraia seja o seu torturador. O defeito de Antes do Anoitecer é o mesmo de Basquiat, o filme de estréia de Schnabel na direção. Ele continua um artista plástico, mesmo quando dirige. Isso explica, mas não justifica os excessos visuais de Antes do Anoitecer. Não é o melhor filme latino-americano sobre o tema da liberdade, mas Babenco tem razão. É um filme corajoso. E tem classe. Antes do Anoitecer - (Before Night Falls). Drama. Direção de Julian Schnabel. EUA/2000. Duração: 125 minutos. 14 anos

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