Festival de documentários 'É Tudo Verdade' dá a largada

Evento chega à 15.ª edição e começa com 'Uma Noite em 67', sobre os festivais da canção da Record

PUBLICIDADE

Por LUIZ CARLOS MERTEN - O Estado de S. Paulo
Atualização:

Em 'O Contestado', Sylvio Back refaz sua ficção de 1970, 'A Guerra dos Pelados'. Foto: Divulgação

 

PUBLICIDADE

Maior vitrine do documentário no País, o festival É Tudo Verdade inicia nesta quinta, 8, sua 15ª edição em São Paulo. Na sexta, 9,, o evento decola no Rio e até domingo, dia 18, apresenta números superlativos. Serão 71 documentários de 27 países, 18 brasileiros inéditos e retrospectivas de importantes autores como Alain Cavalier e Benedito J. Duarte. Pelo 10.º ano, a Conferência Internacional do Documentário será realizada em São Paulo, tendo como tema o uso de materiais de arquivo na não ficção. É o que propõe Sylvio Back em O Contestado, ao refazer sua ficção de 1970, A Guerra dos Pelados.

Veja também:

 

"Atingir 15 edições é uma marca e tanto", diz o criador do evento, Amir Labaki. Mas ele está preocupado, não propriamente com o sucesso da mostra. A situação calamitosa do Rio lança uma sombra sobre o que poderá ser o festival deste ano na cidade. O próprio Labaki não conseguiu viajar na terça-feira e passou o dia em São Paulo, dando entrevistas por telefone e acertando detalhes da programação carioca.

 

Nestes 15 anos, É Tudo Verdade contribuiu, e muito, para a consolidação da cultura do documentário no Brasil. Abriu-se um leque - e o documentário engajado, de fundo social, que era uma herança do Cinema Novo e de alguns poucos pioneiros, passou a ser apenas uma das diversas manifestações do cinema de não ficção. O número de documentários brasileiros cresceu e a seleção de longas da competição brasileira - são sete - expõe a diversidade que faz hoje sua força.

 

O festival começa em São Paulo, para convidados, com Uma Noite em 67, de Renato Terra e Ricardo Calil, sobre o disputadíssimo encerramento, naquele ano, do 3.º Festival de Música da TV Record. Se o tempo colaborar, como se espera, os cariocas verão amanhã o novo José Padilha. Depois de Garapa, sobre o problema (tremendo) da fome, o diretor, que conclui atualmente a filmagem de Tropa de Elite 2, propõe agora Segredos da Tribo, que discute a atuação de cientistas sociais europeus e norte-americanos nos primeiros contatos com os ianomâmis da Venezuela, nas décadas de 1960 e 70. Retratos da vida? Sim, e é tudo verdade no maior evento de documentários do Brasil.

 

Publicidade

Amir Labaki - Pergunte a Amir Labaki quais foram os momentos marcantes do Festival Internacional de Documentários e ele dificilmente deixará de citar as visitas de Marcel Ophüls, Federick Wiseman e Jorgen Leth, que acompanharam as retrospectivas de suas obras no País. Ele também vai citar o impacto que tiveram as primeiras exibições de Buena Vista Social Club, de Wim Wenders; de Comandante, de Oliver Stone; e Santiago, de João Moreira Salles, talvez o maior documentário feito no Brasil, apesar da grandeza de certos momentos da obra de Eduardo Coutinho, por exemplo.

 

Frederick Wiseman participa da competição internacional deste ano com seu novo longa, La Danse, sobre o balé da Ópera de Paris. Nele se identifica o grande tema do autor - Wiseman discute as instituições por meio das pessoas. La Danse registra o esforço físico dos bailarinos para dominar seu instrumento, o corpo. O filme ilustra bem a diversidade que dá o tom da recente produção documentária, e não apenas a brasileira. Você tem a dupla indagação de Wiseman, sobre a Ópera de Paris e a linguagem de seus artistas.

 

Tem a dura crítica de Michael Moore ao capitalismo e a dupla Renato Terra/Ricardo Calil, que mescla música e política em Uma Noite em 67. Terra conversa pelo telefone, do Rio. Uma Noite em 67 surgiu como desdobramento da sua monografia de conclusão do curso de Comunicação, em 2003. Terra debruçou-se sobre a era dos grandes festivais de música, nos anos 1960/70. Decidido a fazer um longa documentário, chamou seu amigo jornalista, Ricardo Calil. Trabalharam durante cinco anos no projeto e ganharam apoio da Videofilmes e da TV Record, que abriu seu arquivo.

 

O foco ficou concentrado no Festival da Record de 1967, o mais emblemático de todos. Algo de muito importante ocorreu na final. O País vivia sob uma ditadura. O palco virou cenário de uma disputa envolvendo a guitarra elétrica. Gilberto Gil a usava em Domingo no Parque e era considerado de direita. Os artistas de raiz, contrários à guitarra, eram de esquerda. O documentário é musical, mas a política está subentendida. Quatro músicas dominavam a competição - Ponteio, Domingo no Parque, Roda Viva e Alegria, Alegria. Grandes carreiras se afirmaram ali. Chico Buarque, Edu Lobo, Caetano Veloso, Gilberto Gil. Roberto Carlos, que concorria com Maria, Carnaval e Cinzas, dá seu depoimento.

 

Uma noite para a história, a do nascimento do tropicalismo. Terra e Calil conseguiram imagens raras de uma passeata de protesto contra a guitarra elétrica. Entre os que protestavam, Gilberto Gil. Especialistas analisaram as músicas e o clima da época. Vão para o DVD. "O filme privilegia os depoimentos mais íntimos. Preferimos transformar a experiência dos participantes daquela noite numa experiência de vida para o espectador, hoje", dizem os diretores.

 

 

 

 

 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.