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Festival de Cinema Judaico aposta na tolerância

Evento, que começa hoje com Lost Zweig e termina com Olga, tem 20 filmes na mostra competitiva e exibe obras de diretores palestinos

Por Agencia Estado
Atualização:

Dois importantes filmes da nova safra da produção brasileira integram a programação do 8.º Festival do Cinema Judaico, que começa nesta segunda-feira. O filme de abertura é Lost Zweig, de Sylvio Back, que traça a última semana de vida do escritor alemão de origem austríaca (e judaica), Stefan Zweig. Fugitivo do nazismo, ele se estabeleceu com a mulher em Petrópolis, no Estado do Rio, onde ambos se suicidaram, em 1942. O de encerramento é Olga, que Jayme Monjardim realizou a partir do roteiro de Rita Buzzar, adaptado do livro de Fernando Morais, sobre a mulher do dirigente comunista Luiz Carlos Prestes. Olga Benário era judia e comunista. Entregue pela polícia secreta de Getúlio Vargas aos nazistas, morreu num campo de concentração na Alemanha. Dois filmes brasileiros e ambos ligados à temática do nazi-fascismo, o que não chega a surpreender muito num festival de cinema judaico. A grande surpresa é constatar a ousadia da diretora artística do evento, Daniela Wasserpein, que organizou, com apoio incondicional da Associação Brasileira A Hebraica e do Centro de Cultura Judaica uma mostra intitulada "Dois Olhares, Um Desafio", com cinco filmes produzidos em conjunto por árabes e palestinos sobre os conflitos no Oriente Médio. "Deve ser a primeira vez em todo o mundo que um Festival de Cinema Judaico se abre para mostrar a produção artística de palestinos. Não fazemos isso por provocação nem como algo isolado. Essa programação se inscreve no quadro geral dos temas que regem a seleção da oitava edição - identidade e tolerância", ela explica. Será muito interessante avaliar a discussão que filmes como Fronteira entre Sonho e Medo, sobre uma garota criada num campo israelense, e Se Você Faz Acontecer, que começa com o próprio diretor contando como foi criado pelo pai palestino para temer os judeus - que ele comparava a ETs -, poderão provocar no público. O 8.º Festival de Cinema Judaico vai até domingo em quatro espaços - A Hebraica, CineSesc, Museu da Imagem e do Som (MIS) e Casa da Cultura Judaica. Daniela fez sozinha a curadoria do 1.º Festival, que apresentou menos de dez filmes. No oitavo, só para dimensionar o crescimento do evento, vale destacar que a mostra competitiva é formada por 12 ficções e oito documentários - que serão avaliados por um júri presidido pelo diretor do Festival de Cinema Judaico de Buenos Aires, Luis Gutman, mais o diretor Sylvio Back e o ator Caco Ciocler (que faz Luiz Carlos Prestes em Olga). A essa mostra principal, somam-se três outras - Dois Olhares, Um Desafio (já citada), a retrospectiva do diretor alemão Artur Brauner, formada por dez filmes, e a mostra de animação da Bezalel (Academy of Arts and Design de Jerusalém), com 18 curtas. No total, serão exibidos 53 títulos, entre curtas e longas. Daniela observa que o festival se realiza graças a muitas parcerias. Seu orçamento ultrapassa um pouco R$ 300 mil (sem chegar a R$ 400 mil). Isso implica medidas de economia como a decisão de não trazer convidados internacionais (exceto o jurado Gutman). "Nossa equipe é pequena. Durante a realização do festival conto com a colaboração de dois estagiários. Trabalho o ano todo, vendo e selecionando filmes que muitas vezes são garimpados a partir de informações nos festivais de Sundance, Berlim e Cannes. Com esse orçamento limitado, não posso me dar ao luxo de freqüentar os grandes festivais. Informo-me, peço as cópias e é a partir delas que faço a seleção." Sylvio Back está duplamente feliz - porque Lost Zweig será exibido, fora de concurso, na abertura do Festival de Cinema Judaico, e porque ele próprio integra o júri. "Acho muito importante essa abertura para o outro justamente nestes tempos em que o anti-semitismo volta com força na Europa, especialmente na França, que Stefan Zweig tanto amava", ele diz. Lost Zweig vem colecionando prêmios (já são oito) em festivais nacionais - Brasília, Cine-Ceará, Cuiabá. Os prêmios podem abrir uma perspectiva comercial, mas Back vê outro significado nesse diálogo inaugural com o público. Ele sabe que as reações das platéias festivaleiras e dos júris nem sempre coincidem com a do espectador que vai pagar ingresso. "Mas o filme passa a ser, finalmente, colocado à prova, depois de meses de um dedicado trabalho coletivo que, do nascedouro da idéia à primeira cópia, envolveu no mínimo 300 pessoas. É estimulante ver como a linguagem e as inquietações das imagens são absorvidas pelo público." Mas a grande verdade, em última instância, só vai rolar quando Lost Zweig entrar em cartaz, em outubro. O diretor destaca a importância de um festival desses. "No Brasil, um anti-semitismo velado subsiste ao longo dos tempos tanto quanto o nosso ´racismo cordial´ contra o negro, o índio, o nordestino." O Festival de Cinema Judaico vai permitir que se discuta tudo isso. O judeu ortodoxo de Mendy, de A. Vardy, freqüenta uma boate de Nova York que se chama Ipanema, toma caipirinha e se relaciona com uma negra brasileira que canta Meu Coração Vagabundo. M. Batignole, no filme de mesmo nome, de Gérard Jugnot, é um francês que, a princípio, se omite, pressionado pela família, mas termina arriscando a própria vida para salvar três crianças judias do nazismo. Em Amor sem Fronteiras, com Omar Sharif, o tema é a relação entre um árabe e um judeu. E em The Hebrew Hammer, J. Kesselman cria o super-homem judeu para satirizar as tradições judaicas. Não é só a religião que está em pauta. É a diferença - toda diferença. A tolerância é a grande proposta por trás dos jogos de identidades no 8.º Festival de Cinema Judaico de São Paulo. Serviço - Festival de Cinema Judaico. De segunda a domingo no Teatro Arthur Rubinstein - A Hebraica. Rua Hungria, 1.000, 3818-8888. R$ 5. De terça a domingo no Teatro Anne Frank - A Hebraica. Rua Hungria, 1.000, 3818-8888. Grátis. De terça a domingo na Casa de Cultura de Israel. Rua Oscar Freire, 2.500, 3065-4333. Ingresso: um quilo de alimento ou um agasalho. De quarta a domingo, 14 horas, no CineSesc. Rua Augusta, 2.075, 3064-1668. Grátis. De quinta a domingo no MIS. Avenida Europa, 158, 3062-9197. Grátis. Até 15/8. Abertura nesta segunda-feira, às 21 horas, somente para convidados.

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