Festival abre concessões mercadológicas

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Por Agencia Estado
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Veneza, durante alguns anos, procurou se manter firmemente aferrado ao terreno autoral, o daqueles filmes de grande investimento artístico, porém nada comerciais. No entanto, como também precisa atender ao côté mundano, faz as devidas concessões. Por exemplo, há dois anos o festival começou com uma sessão solene de O Resgate do Soldado Ryan, e abrigou Steven Spielberg e sua entourage de 30 pessoas com toda a pompa e circunstância de que a Sereníssima República é capaz. Por isso não se deve estranhar que o festival abra este ano com Space Cowboys e uma homenagem a seu autor. Clint Eastwood é a própria imagem dessa vocação anfíbia de Veneza, sem nenhum jogo de palavras alusivo à localização geográfica da cidade. Ator de grande apelo popular em filmes de ação, Clint tornou-se diretor respeitado e autor de um trabalho tão notável quanto Os Imperdoáveis. Aos 70 anos, Clint está acima do bem e do mal. Satisfaz gregos, troianos e baianos e, portanto, merece seu Leão de Ouro especial pela carreira. Ninguém irá contestar essa decisão, tomada pelo diretor da mostra, Alberto Barbera, em seu primeiro ano de gestão. Além disso, Space Cowboys tem tudo para ser aquele protótipo de filme simpático, bom para abrir festivais. Trata-se de um faroeste espacial e crepuscular, com elenco de veteranos. Além de Clint, que dirige e atua, estão nos créditos James Garner, Tommy Lee Jones e Donald Sutherland. Perfil hipotético - Ninguém traça a priori o perfil de um festival. Ele se define ao longo de sua realização. No entanto, algumas linhas já podem ser antecipadas. Por exemplo, é proporcionalmente grande a presença oriental em Veneza, com concorrentes da China (Platform, de Jiang Zhang-ke), Hong Kong (Durian Durian, de Fruit Chan) e Coréia do Sul (A Ilha, de Ki-duk Kim). Caso algum deles vença, será reforçada uma tradição recente de hegemonia oriental no Lido. Nos últimos anos, levaram o Leão de Ouro filmes como Vive L´Amour, de Tsai Ming Liang (Taiwan), O Ciclista, de Tran Ahn Hung (Vietnã), Hana-Bi de Takeshi Kitano (Japão), e Nenhum a Menos, de Zhang Yimou (China). Outra possibilidade de especulação é sobre o desenho temático do festival. Alguns críticos têm notado que a seleção proposta por Barbera privilegia desvios de todas as espécies. Segundo esses observadores, há nos filmes deste ano toda a sorte de aberrações possíveis da conduta humana, como comportamento sexual fora da norma, adição a drogas, perversões variadas e violência associada à sexualidade. Nesse cardápio inclui-se uma cinebiografia do Marquês de Sade, filmada pelo francês Benoît Jacquot, prostituição infantil em Durian Durian, do chinês Fruit Chan, e Denti, de Gabriele Salvatores (o mesmo do premiado Mediterrâneo), cujo protagonista enfrenta nada menos que uma sucessão de dentistas sádicos.

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