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Ethan Hawke vive Hamlet urbanizado

Por Agencia Estado
Atualização:

Se Mel Gibson pôde, por que não Ethan Hawke? Bonitinho, mas (perdão, leitores) um tanto ordinário, o marido de Uma Thurman interpreta Hamlet na versão contemporânea da tragédia de William Shakespeare realizada por Michael Almereyda. Hamlet estréia nesta sexta. Você nunca viu (ou ouviu) um ser ou não ser como esse, antes. "Bill" Shakespeare é um dos grandes roteiristas de Hollywood. Comédias, tragédias, suas peças ótimas - e algumas, definitivas obras-primas - já renderam mais filmes que o tamanho desse texto poderia enumerar. Só Hamlet já teve mais de dez versões, uma delas no Brasil, dirigida por Ozualdo Candeias e na qual o herói também ocupava a cena atual, só que num ambiente rural. Almereyda fez um Hamlet urbano, com ação desenrolada no meio das grandes corporações de Wall Street. Ethan Hawke faz o herói assombrado pelo espírito do pai, morto pela mãe e pelo amante, seu tio, que assumiu a direção das empresas da família. Numa entrevista por telefone, no ano passado, Hawke disse que nunca havia imaginado interpretar o infeliz príncipe da Dinamarca, mas foi cooptado com relativa facilidade pelo diretor Almereyda, que o fascinou com sua proposta de uma abordagem atualizada (e inovadora) do texto. Hawke admitiu que não é Laurence Olivier nem Kenneth Branagh, que também interpretaram (e até dirigiram) versões da tragédia shakespeariana do idealismo intelectual. Ele não citou Mel Gibson, que também fez uma leitura desastrosa do ser ou não ser, na versão asssinada por Franco Zeffirelli, mas revelou bom senso ao concordar, com Branagh, que o melhor Hamlet do cinema não é Olivier, no papel que lhe deu o Oscar, mas o russo Innokenti Smuktunovski, que viveu o dilema hamletiano na versão de Grigori Kozintsev. O ator disse que viu todas essas versões, mas Almereyda sempre deixava claro que não queria que ele fosse influenciado por nenhum outro Hamlet. Todo autor é sempre produto de sua época, mas Shakespeare pertence à categoria dos que conseguiram formular questões que atravessam o tempo, sem perder a atualidade, jamais. Assim, o ser ou não ser continua correspondendo a expectativas e exigências das platéias atuais, do mesmo modo como atendia ao público elizabethano. A chave para se entender o Hamlet de Almereyda é justamente a interpretação visual que ele dá ao monólogo do príncipe. Nem é preciso citar Hawke, mas o ator disse que o objetivo do diretor era, desde o começo, denunciar o consumismo e o materialismo da sociedade na virada do milênio. Isso se percebe claramente quando ele faz com que Ethan Hawke, como Hamlet, recite o ser ou não ser numa locadora, entre centenas de capas de vídeos com fitas de ação e imagens projetadas nos telões - imagens que colocam uma dupla crítica de Almereyda, não só ao estilo MTV e ao gosto pela violência do espectador atual, mas também à massificação imposta por Hollywood aos mercados de todo o mundo. A propósito, o filme que se vê na locadora é O Corvo, de Christopher Gans, com Vincent Perez. Esse monólogo, enquanto conceito, talvez seja o que existe de mais interessante no Hamlet de Almereyda. Mas também expressa as limitações do projeto. Hawke é fraco como ator, não segura, na voz nem no gesto, a complexidade do texto shakespeariano. O resultado é que o filme, sem alma, termina caindo no vazio do consumismo que o diretor quer criticar. Hamlet (Hamlet) - Drama. Direção de Michael Almereyda. EUA/99. Duração: 112 minutos. Cine Arte Liliam Lemmertz, às 15 horas e 21h30 (segunda não há sessão). 14 anos.

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